Por Helder Miranda, em outubro de 2017.
O mundo não precisa de mais espaços de ódio, seja na vida, seja na arte. Prova disso é que no Dia Mundial de Combate ao Bullying, em 20 de outubro de 2017, um garoto de Goiânia atirou contra supostos algozes e matou dois deles.
No filme "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola", parece que o mundo ideal de Danilo Gentili é aquele em que exista bullying como maneira de fazer com que as pessoas aprendam a se defender, em que vasos sanitários são destruídos nas escolas, em que o desrespeito aos professores seja motivo de riso. Tudo isso em nome do humor.
Baseado no livro homônimo de Gentili, e estrelado por ele, ao contar a trajetória de um estudante desesperado que encontra um guia de um ex-aluno problemático, o filme é um emaranhado de equívocos que, na tentativa de ser politicamente incorreto, torna-se forçado demais.
No longa-metragem, que tem a classificação indicativa para 14 anos, há uma cena bem polêmica que versa sobre pedofilia, protagonizada pelo apresentador e humorista Fábio Porchat, e os atores Bruno Munhoz, de 13 anos, e Daniel Pimentel, de 17. Em outra cena, com o adolescente mais velho, aparecem testículos - não se sabem se verdadeiros ou falsos - do apresentador do SBT.
Para esses absurdos não terem gerado tanto burburinho, deve haver outra interpretação ao que o artigo 240 do ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente diz: "produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente indica pena de reclusão, de quatro a oito anos, e multa".
Sendo assim, mesmo com professores demonizados nas classes - como se ministrar aulas dentro de escolas fosse a profissão mais indigna do planeta - há pontos positivos, como a participação do ator Carlos Villagrán, o eterno Kiko do seriado mexicano "Chaves", irreconhecível como um diretor que defende o politicamente correto mas mantém algumas hipocrisias, e Joana Fomm, que publicou na internet que estava à procura de emprego e foi chamada para integrar o elenco do filme.
Dirigido por Fabrício Bittar, "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola" é uma aula como desaprender alguns princípios básicos, como o respeito ao próximo, e não há redenção - nem arrependimento, nem o remorso, por parte dos protagonistas. Eles fazem, acontecem, sabotam, prejudicam e, no final das contas, se dão bem. Tudo em nome da risada barata que, não fosse pelo alto teor de baixarias, poderia ser exibido em qualquer sessão vespertina da televisão aberta.
Com isso e pelos exemplos que pregou e deve ter inspirado alguns estudantes do ensino fundamental e médio, Danilo Gentilli deveria pelo menos tentar enfrentar uma sala de aula por um dia para ver o que os professores de hoje - seja em escolas públicas ou não - enfrentam diariamente nas escolas. Mas, voltando ao início do texto, o mundo, definitivamente, não precisa de mais espaço para ódio inconsequente.
Não é normalizar a "cultura da vitimização", outra questão grave. Mas dar um limite em um mundo onde prevalecem os direitos sobre os deveres de todos. Se não pararmos com isso, os assassinatos em Goiânia, ou em Realengo, no Rio de Janeiro, só para citar algumas mortes que aconteceram por conta de bullying em escolas, serão apenas estatísticas e prenúncio de várias outras tragédias.
*Helder Miranda escreve desde os seis anos e publicou um livro de poemas, "Fuga", aos 17. É bacharel em jornalismo e licenciado em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos, pós-graduado em Mídia, Informação e Cultura, pela USP - Universidade de São Paulo, e graduando em Pedagogia, pela Univesp - Universidade Virtual do Estado de São Paulo. Participou de várias antologias nacionais e internacionais, escreve contos, poemas e romances ainda não publicados. É editor do portal de cultura e entretenimento Resenhando.com.