Com direção e dramaturgia de Luiz Marfuz, o espetáculo "Padre Pinto: a Narrativa (Re)inventada" estreia no Teatro do Sesc Pompeia no dia 24 de janeiro, às 20h00. O elenco é encabeçado por Ricardo Bittencourt, como Padre Pinto, e Sérgio Marone, como Emissário, que estão em cena ao lado de 13 atores, além de banda ao vivo. Intolerância religiosa, sexualidade, preconceito social e racial, solidariedade e tensões entre vida e morte, sagrado e profano são temas levados ao palco.
Após se vestir de oxum - orixá feminino do candomblé - celebrar uma missa e dançar dentro da igreja em 2006, Padre Pinto (1947 - 2019) atrai a ira dos conservadores e a atenção da mídia nacional, enquanto os fiéis se dividem entre a aprovação e o repúdio. Um grupo de católicos pleiteia sua expulsão da paróquia da Lapinha, em Salvador, Bahia, acusando-o de violar o decoro sacerdotal. Apoiado por fiéis e admiradores, Padre Pinto justifica sua atitude como um ato de tolerância religiosa e não aceita sair da paróquia que presidia há 32 anos. Pressionada, a arquidiocese convoca um emissário do Vaticano para investigar o ocorrido e definir o destino do padre.
O espetáculo, antigo desejo do ator baiano Ricardo Bittencourt é uma iniciativa que junta atores e músicos do Teatro Oficina, que vêm acompanhando as leituras dramáticas e a construção da peça desde 2023, a artistas e profissionais baianos da música e da dança para recontar a história de um dos personagens mais controversos e transgressores do imaginário religioso contemporâneo brasileiro. “A minha ideia é partir de elementos físicos, vocais, de gestos dele para criar o meu padre Pinto, sem, obviamente, traí-lo e sem alterar a essência da alma dele”, diz Ricardo Bittencourt.
O produtor Fioravante Almeida, à frente da FLO Arts Produções e Entretenimento, que tem em seu currículo peças como "Iron, o Homem da Máscara de Ferro" e "O Jogo do Poder", que reabriu o Teatro Oficina após a morte de Zé Celso, fala que “é muito importante ter conseguido realizar o intercâmbio cultural entre Bahia e São Paulo. Essa mistura de artistas de diversas origens foi um acerto”.
Escrita pelo diretor e dramaturgo baiano Luiz Marfuz, autor de "Traga-me a Cabeça de Lima Barreto", o espetáculo conta com elenco grandioso: Ricardo Bittencourt, Sérgio Marone, Ágatha Matos, Gabriel Frossard, Igor Nascimento, Luciana Domschke, Mariano Mattos Martins, Rita Brandi, Sylvia Prado, Thaise Reis, Tony Reis, Victor Rosa e Wilson Feitosa - que também toca a música ao vivo da peça ao lado de Ito Alves e Moisés Moita Matos.
Em cena, o protagonista é atravessado por um feixe de temas que destacam a intolerância religiosa, a sexualidade, o preconceito social e racial, a solidariedade e as tensões entre vida e morte, o sagrado e o profano. A estrutura dramatúrgica desenvolve-se em três atos: "Ascensão e Glória", "Queda e Explosão" e "O Silêncio de Deus".
Segundo o diretor Luiz Marfuz, “a peça parte da ideia de que o espetáculo humano e cultural, vivenciado por Padre Pinto, se instaurou na sua vida e não no teatro. Isso o aproxima do espírito da etnocenologia – o estudo dos comportamentos humanos espetacularmente organizados no cotidiano -, uma das bases de pesquisa”. E completa: “Em vez de teatralizar a vida no palco, Padre Pinto instaurou a espetacularidade no dia a dia da Paróquia da Lapinha, onde foi pároco por mais 32 anos. Para isso, cantou e dançou ritos inspirados nas manifestações dos povos originários e africanos dentro da igreja e nas tradicionais festas de reis, que ele revitalizou”.
Para o dramaturgo, “a trama explode a história do Padre Pinto, fabulando o real e (ir)realizando o ficcional, abrindo-se às dimensões do onírico, sendo atravessada por três planos: (a) material, onde se situam Padre Pinto e as personagens com quem conviveu; (b) incorpóreo, onde transitam os reis magos, sombras, santos, abstrações e seres não nomeados na carne; (c) vão de passagem, espécie de corredor entre os dois mundos, percorrido pela figura ambígua do canjerê e pelas gárgulas”.
Desse modo, a peça recupera a espetacularidade do Padre Pinto à luz da cena, sem pretender realizar uma biografia de sua vida, ou um documentário cênico, mas reinventá-la à luz das dimensões míticas e ficcionais dados pelo teatro.
Um pouco mais sobre Padre Pinto
José de Souza Pinto - Padre Pinto -, nasceu em Salvador, em 1947. Dedicou 32 anos do seu sacerdócio à Paróquia da Lapinha, bairro da capital, onde desenvolveu atividades de inclusão social e de combate à pobreza, como parte de suas crenças e de seu vínculo com a teologia da libertação e os manifestos históricos da igreja, como o “Pacto das Catacumbas” (assinado por bispos do Concilio Vaticano II) e “Eu ouvi os clamores do meu povo” (manifesto dos bispos do Nordeste a favor dos pobres e oprimidos, em plena ditadura militar).
Ao acolher o convívio entre personagens bíblicos e a cultura afro-cabocla, em suas missas e sermões da igreja, Padre Pinto revitalizou um festejo secular do bairro: a Festa de Reis da Lapinha, manifestação que data do período colonial brasileiro, e que recria o momento místico da visita dos reis magos ao menino Jesus. Ele foi o fundador do Terno da Anunciação, o mais famoso do cortejo.
Padre Pinto tinha habilidades artísticas notáveis. Dançarino, ele coreografava e dançava nas missas que oficiava, com trajes e cantos multiculturais. Em 1997, instalou na igreja um presépio com os Reis Magos em cima da réplica de uma fobica, o primeiro trio elétrico do Brasil. Como artista plástico, realizou intervenções urbanas e exposições em museus renomados de Salvador, criando mais de 500 telas e esculturas, uma delas a grande escultura de Cristo com traços negros, católicos e dos povos originários.
Em 2006, na festa de reis, celebrou uma missa, vestido de Oxum, orixá do candomblé, cantando e dançando na igreja e nas ruas do bairro. A maioria aplaudiu, mas os fiéis tradicionais e o clero conservador manifestaram incômodo. O evento explodiu na mídia, causou enorme polêmica e gerou uma investigação que envolveu o Vaticano. Um acordo entre o arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil Dom Geraldo Majella e o padre Ludovico Caputo, emissário da Santa Sé, culminou na remoção do Padre Pinto da Paróquia da Lapinha.
Em resposta, ele se inicia no candomblé, discute e vive publicamente sua homossexualidade e participa de forma ativa em shows e festas do verão de Salvador, atraindo a tenção da mídia nacional. Abandonado, ele é recolhido em um retiro na Paróquia da Divina Providência, no bairro de São Caetano, onde viveu por 13 anos. Em 2019, ele morre, devido a uma severa depressão e a complicações cerebrais. Em 2020, antes da covid-19 grassar o país, o Terno de Reis da Anunciação celebrou o legado do Padre Pinto em um cortejo de 150 integrantes, que assim se manifestaram: “Um artista”, “um iluminado”, “um gênio”, “ele era tudo para gente”.
Ficha técnica
Espetáculo "Padre Pinto: a Narrativa (Re)inventada"
Dramaturgia e direção: Luiz Marfuz
Diretor assistente: Roderick Himeros
Assistência de direção: Rita Brandi e Fernando Filho
Consultoria artística: Onisajé
Assessoria candomblaica: Marcio Telles
Elenco: Ricardo Bittencourt como Padre Pinto, Sérgio Marone, ator convidado para interpretar o Emissário, Ágatha Matos, Gabriel Frossard, Igor Nascimento, Luciana Domschke, Mariano Mattos Martins, Rita Brandi, Sylvia Prado, Thaise Reis, Tony Reis, Victor Rosa e Wilson Feitosa
Banda: Ito Alves, Moisés Moita Matos e Wilson Feitosa
Direção musical e trilha sonora original: João Milet Meirelles
Composições e arranjos foram construídos com a colaboração de Claudia Manzo, Ito Alves, Moita Matos e Wilson Feitosa
Preparação vocal e assistente de direção musical: Claudia Manzo
Desenho de som: Paulo Altafim
Cenografia: Cris Cortilio
Assistente cenografia: Rafael Torah
Criação de vídeo: Ciça Lucchesi
Cinegrafista: André Voulgaris
Direção de palco: Joana Pegorari
Direção de cena: Elisete Jeremias
Assistente de palco: Daniel Prata
Desenho de luz: Cesar Pivetti
Assistente de iluminação e programador de luz: Rodrigo Pivetti
Coreografia: Marilza Oliveira
Figurino e adereços: Kelly Siqueira e Paula Mares Ruy
Visagismo: Polly e Yuri Tedesco
Fotógrafo: Luis Ushirobira
Consultoria biográfica: Pablo Henrique da Silva Pinto
Assessoria de Imprensa: Pombo Correio
Pesquisa histórico-social e biográfica: Eduardo Machado, Ícaro Bittencourt e Georgenes Isaac (pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFBA e do Grupo Pé na Cena)
Produção: Camila Bevilacqua
Assistente de produção: Kauan Ramos
Coordenação geral do projeto: Fioravante Almeida
Produtora responsável: FLO Arts Produções e Entretenimento
Idealizadores: Ricardo Bittencourt, Luiz Marfuz e Mauricio Magalhães
Serviço
Espetáculo "Padre Pinto: a Narrativa (Re)inventada"
Sesc Pompeia: R. Clélia, 93 - Água Branca / São Paulo
De 24 de janeiro a 23 de fevereiro de 2025
Quintas, sextas e sábados, às 20h00
Domingos, às 17h00
* No dia 25 de janeiro, a sessão será às 17h00, por conta do feriado.
Duração: 120 minutos
Valores dos ingressos R$ 70,00 / R$ 35,00 / R$ 21,00
Ingressos a venda pelo site: sescsp.org.br