sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

.: Ney Latorraca: porque ele é um dos maiores atores de todos os tempos


Ney Latorraca caracterizado como o vampiro Vlad, Conde Vladymir Polanski. Foto: 
Nelson Di Rago 

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

“Para sobreviver, eu preciso representar. Trabalhando é que eu sobrevivo”, declarou Ney Latorraca, falecido aos 80 anos, em 26 de dezembro de 2024, em uma das muitas entrevistas que concedeu. Não é exagero dizer que ele foi um dos maiores atores brasileiros de todos os tempos. A extensa trajetória na televisão, no teatro e no cinema deixou um legado que marcou gerações e consolidou o lugar dele no coração do público. O artista estava internado Clínica São Vicente, no Rio de Janeiro, desde o último dia 20 de dezembro. Ele foi diagnosticado com câncer de próstata em 2019 e deixa o marido, o ator Edi Botelho, com quem era casado há 30 anos. 

Desde cedo, demonstrou talento e paixão pelas artes. Filho de pais artistas, iniciou a trajetória artística ainda na infância, com participações na Rádio Record aos seis anos. Antonio Ney Latorraca nasceu em Santos, no dia 25 de julho de 1944. Filho de pais artistas - um crooner e uma corista - teve como padrinho de batismo o ator Grande Otelo e costumava dizer que “o ator já nasce ator”. Os pais dele trabalhavam em cassinos, até que o jogo foi proibido no país. Atuou no teatro estudantil e, aos 19 anos, passou no primeiro teste que fez para “Pluft, o Fantasminha”, de Maria Clara Machado. Teve sua primeira oportunidade profissional ao ser aprovado para o elenco da peça “Reportagem de Um Tempo Mau”, em 1965. Logo após a estreia no Teatro Arena, o governo militar proibiu o espetáculo e prendeu o elenco. 

Obrigado a voltar para Santos, Ney Latorraca se dedicou ao estudo de artes cênicas. Entrou para o Teatro da Faculdade de Filosofia de Santos (TEFF). No ano seguinte, ingressava na Escola de Arte Dramática da USP (EAD). Primeiro aluno da turma, formou-se com nota dez em drama e comédia, apadrinhado por Marília Pêra.  Enquanto estudava, Ney morava em pensão e trabalhava durante o dia. Durante esta época, foi bancário, balconista, gerente de loja de roupas e vendedor de joias. Ainda em 1969, encenou "O Balcão", de Jean Genet, dirigido por Victor Garcia. No ano seguinte, apresentou-se no musical "Hair"

Ney Latorraca estreou na televisão como figurante na TV Tupi e o primeiro papel de destaque foi na novela "Beto Rockfeller" (1968). A estreia na Globo aconteceu em 1975, em outro folhetim, “Escalada”, em que fez par romântico com Nathalia Timberg e deu o que falar a partir da história do romance entre uma mulher 15 anos mais velha que enfrentou muitas barreiras no Brasil daquela época. Polêmico, esse trabalho iniciou a trajetória de 50 anos de trabalho na emissora. 

Depois, brilhou como o rebelde Mederiquis de "Estúpido Cupido" (1976) e marcou época na novela “Vamp” (1991), quando interpretou o Conde Vlad, um dos vilões mais emblemáticos da teledramaturgia brasileira - que era para ser apenas uma participação especial e ficou até o fim devido ao talento do intérprete. 

Ney Latorraca, ao lado de Marco Nanini, marcaram a história do teatro brasileiro com a primeira montagem brasileira de "O Mistério de Irma Vap", com direção de Marília Pêra. O espetáculo estreou em 1986 e ficou em cartaz durante 11 anos consecutivos, o que garantiu a entrada no livro Guiness World Records. A peça ficou marcada por uma espécie de gincana de troca de figurinos feita pelos atores

De volta à televisão, os trabalhos humorísticos, como o "velho" Barbosa em “TV Pirata” (1988) e o Cornélio da novela "O Cravo e a Rosa" (2000), de Walcyr Carrasco. Voltou a interpretar um vampiro na novela "O Beijo do Vampiro" (2002). Na trama de Antônio Calmon, o mesmo autor de "Vamp", ele foi Nosferatu (Ney Latorraca), o grande rival e inimigo de Bóris (Tarcísio Meira), tendo como meta eliminar o seu reinado entre os vampiros. Em seguida, fez uma parceria hilária com Maitê Proença na novela "Da Cor do Pecado" (2004) que arrancou várias risadas dos telespectadores. 

No cinema, participou de filmes marcantes, como “O Beijo no Asfalto” (1980), dirigido por Bruno Barreto, com roteiro de Doc Comparato baseado na peça de Nelson Rodrigues, ao lado de Tarcísio Meira. Um de seus últimos trabalhos na TV Globo foi uma participação como Conde Vlad na série "Cine Holliúdy", em 2019. 

A trajetória do artista também foi de superação. De origem humilde, Ney Latorraca enfrentou desafios financeiros e sociais com resiliência e criatividade, transformando a arte em sua razão de viver. O humor refinado e a capacidade de encantar o público em papéis dramáticos ou cômicos o tornaram um artista completo. “Aprendi desde pequeno que precisava representar para sobreviver, o que nunca me deixou um trauma, pelo contrário. Sempre fui uma criança diferente das outras. Às vezes, eu tinha que dormir cedo porque não havia o que comer em casa. Então, até hoje, para mim, estou no lucro. Minha vida é sempre lucro”, analisava Ney Latorraca, alguém que sempre será lembrado como um artista único e grande ser humano.

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