Ao mesclar a realidade crua com elementos de terror e de contos de fadas, peça evidencia como a sociedade reforça comportamentos machistas e abusivos. Foto: Guilherme Radell
“Stalking - Um Conto de Terror Documental” é um grito coletivo de liberdade e emancipação. O espetáculo tem uma única apresentação neste sábado, dia 19 de outubro, às 20h00, no Teatro do Sesc Santos, com ingressos à venda on-line e na rede de bilheterias do Sesc SP. Com Livia Vilela e Paulo Salvetti, que também assina a dramaturgia, e direção de Rita Grillo, “Stalking” é uma peça true crime baseada em um caso real de perseguição: no ambiente de trabalho, uma mulher começa a sofrer uma relação de assédio que transforma sua vida em um verdadeiro conto de terror.
Em clima de deboche, a linguagem do espetáculo flerta com o universo do terror e dos contos de fadas, mapeando estruturas que precisamos desarmar para combater o machismo patriarcal tão fortemente enraizado em nossa sociedade. Após o espetáculo, haverá bate-papo entre o público, as criadoras da peça, uma advogada e uma psicóloga para falar sobre os temas de violência contra a mulher, assédio, stalking e orientações jurídicas às demandas do público.
“Você é tão simpática. Por acaso foi simpática assim com ele também?”. Desde 2015, a atriz Livia Vilela lida com um stalker e com comentários como esse, que descredibilizam o seu mal-estar. O que começou com um “inocente” bombom logo ganhou contornos dignos de um filme de terror, com direito a ameaças por e-mail e aparecimentos inesperados. Por isso, vários elementos típicos de histórias assustadoras, como iluminação mais baixa, som mais alto, gritos e até sangue falso foram incorporados na peça.
A partir da história de Livia, Paulo Salvetti construiu a dramaturgia. A dupla também forma o elenco. No processo, a equipe percebeu que a narrativa poderia ser ainda mais impactante se explorasse também dispositivos típicos dos contos de fadas. Seria uma forma de evidenciar como a sociedade foi estruturada a partir dos comportamentos machistas e abusivos presentes na maioria, se não em todas as histórias infantis.
"Durante nossa pesquisa, entendemos como a educação está a favor dos valores do patriarcado, que são determinados desde sempre", defende Elisa Volpatto, codiretora que estreia na função ao lado de Rita Grillo. Basta lembrar de contos como o de "O Barba Azul", um notório assassino de esposas ou mesmo o de "A Bela Adormecida", que é beijada por um completo desconhecido enquanto dorme. Para adentrar nesse universo fantasioso, todos os personagens masculinos são representados por meio de figuras grotescas, que remetem aos lobos das histórias infantis. Além disso, dança, máscaras e animação de objetos são incorporadas à encenação ao lado de documentos chocantes, como os áudios, canções e e-mails enviados pelo perseguidor.
“Em cena, a protagonista monta grandes quadros com evidências, e ao final, é como se toda uma cena de crime estivesse preparada no palco. Assim, a peça nunca perde seu caráter documental e de true crime”, conta Rita. A ideia da montagem é tirar o espectador da zona de conforto. “A plateia não é apenas voyeur dessa história. Quem se dispuser a tal, pode experienciar, por meio da arte, um pouco do que a Livia viveu nesse tempo”, explica Salvetti. Para produzir esse efeito, "Stalking" foi construída para desarmar todas as estruturas exaustivas que apareceram nessa trajetória da atriz para pedir ajuda. Isso significa que, em vários momentos, os personagens masculinos atravancam esse processo.
Uma luta e seus desdobramentos
Ao mesmo tempo, o espetáculo-denúncia reflete sobre a impunidade comumente concedida aos homens. Em oito anos de reviravoltas envolvendo polícia, advogados, medidas protetivas e uma escalada crescente de violência por parte de seu perseguidor, Livia nunca se sentiu completamente segura. E, somente em 2022, foi expedido um primeiro mandado de prisão.
Apesar da dificuldade que teve em ser ouvida, sua luta trouxe ganhos para todas as mulheres. Em 2015, o ato de stalkear alguém não era visto como um problema pela sociedade. A situação só mudou em 2021, com a aprovação da Lei 14.132, que determina que perseguir alguém continuamente, seja física ou virtualmente, é crime. E Livia se tornou uma das primeiras pessoas no Brasil protegidas pela Lei Maria da Penha por sofrer esse tipo de assédio.
Essa peça, então, surgiu como um grito coletivo de liberdade e emancipação. “É um trabalho sobre as marcas deixadas no corpo de uma mulher. É sobre o medo de falar por já se saber desacreditada. É sobre as potências interrompidas em razão de um masculino que se sobrepõe em todas as instâncias da vida. É sobre todo o caminho exaustivo a se percorrer por apenas querer dizer a verdade", comenta a atriz.
Após o espetáculo haverá um bate-papo entre o público, as criadoras da peça, uma advogada especializada vinculada ao Projeto Justiceiras e uma psicóloga para falar sobre os temas de violência contra a mulher, assédio, stalking e orientações jurídicas às demandas do público.
Rita de Cássia Kallás Grillo
Diretora do espetáculo
Fernanda Darcie
Advogada. Mestranda em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC. Especialista em Direito das Diversidades, Direito Penal e Criminologia. Presidenta da Comissão de Diversidade Sexual da OAB de São Caetano do Sul. Conselheira na Associação Brasileira de Mulheres LBTIs.
Maya Andrade
Artista das artes cênicas e visuais. Possui trabalhos premiados em mais de 10 países e atuou em Vila Parisi, espetáculo vencedor do Prêmio Shell. Em 2015 foi Cofundadora da U[z]ina Coletiva, com o grupo idealizou e realizou 7 edições do Sarau das Minas em Cubatão/SP. Em sua trajetória tem diversos trabalhos voltados à temática da violência contra a mulher.
Aurélia Rios
Mestra em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo, Psicóloga com atuação Social Comunitária. Conselheira Municipal de Saúde e do Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e de Promoção da Igualdade Racial de Santos. Coordenadora e Supervisora de Projetos - de Promoção a Saúde Comunitária; Saúde Mental e Racismo; Violência contra a Mulher Negra; Habitação e Adoecimento Psíquico. Participou como convidada representante do Brasil no Global Day of Action, evento em comemoração ao Juneteenth, dia da libertação da população negra norte-americana.
Serviço
Espetáculo “Stalking - Um Conto de Terror Documental”
Sábado, dia 19 de outubro, às 20h00
Teatro do Sesc Santos
Ingressos: R$ 15,00 (credencial plena), R$ 25,00 (meia-entrada) e R$ 50,00 (inteira)
Classificação 16 anos
Release Divulgação/Canal Aberto
Sesc Santos - Rua Conselheiro Ribas, 136, Aparecida/Santos
Telefone: (13) 3278-9800
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