"Puro", de Nara Vidal, é o novo – e incômodo – romance da vencedora do Oceanos e finalista dos prêmios Jabuti e São Paulo de Literatura. No livro, que tem capa elaborada por Violaine Cadinot, tudo acontece na década de 1930, Santa Graça, em Minas Gerais. O que poderia ser um vilarejo idílico, uma “referência de virtude e limpeza no território nacional” — e é nisso que alguns de seus habitantes estão tentando transformá-la.
O casarão misterioso onde vivem Lázaro, menino de seus 15 anos, e as três velhas que o adotaram quando bebê é o epicentro desta narrativa, que toma rumos cada vez mais surpreendentes. Ali e na casa ao lado, trabalha Íris, vinda da parte mais pobre da cidade, o Mata Cavalo, de onde também vêm as crianças que andam pela rua pedindo comida e procurando brincadeiras.
São Íris e Ícaro, o garoto doente que “só sabe babar e cair”, os verdadeiros protagonistas deste romance. São eles o retrato de tantos crimes e injustiças que conhecemos até hoje: o racismo, o capacitismo, a desigualdade social tão marcada que se abre em diferentes tipos de abuso, dos mais evidentes aos mais sutis. E são eles também que desvendarão o plano de horror do vilarejo e os segredos que rondam por ali: o que dr. Lírio e Olavo tramam juntos com sua Enciclopédia da Eugenia Brasileira? O que faz o padre Arcanjo na sacristia? Quem é Helga, a enfermeira de família alemã que cuida das crianças com deficiência? Ao chegar inadvertidamente perto das respostas, os dois se veem obrigados a enfrentar as consequências de seus atos.
A estrutura criada por Nara Vidal, enxuta como só uma autora com ampla experiência em contos consegue fazer, nos revela não apenas o que dizem e fazem os personagens, mas o que sentem e pensam. Mais importante, explicita o abismo que existe com frequência entre uma coisa e outra (com exceção de alguns, como dona Rosa, que diz exatamente o que pensa e sente, sem esconder o ódio pelos pretos de Santa Graça).
Nessa estrutura, em que não há diálogos, mas monólogos internos e externos, a autora consegue restituir ao garoto Ícaro a autonomia que lhe é tirada por seus cuidadores e superiores. Ao mesmo tempo, garante que compreendamos a complexidade da vida e dos crimes de que Íris é vítima cotidianamente. Com uma prosa direta, Nara Vidal envolve os personagens no contexto histórico do movimento eugenista brasileiro, neste romance inovador e, acima de tudo, corajoso. Compre o livro "Puro", de Nara Vidal, neste link.
Sobre a autora
Nara Vidal nasceu na cidade mineira de Guarani e é formada em letras pela UFRJ, com mestrado em artes e herança cultural pela London Met University. É autora dos romances "Sorte" (Moinhos, 2018), que obteve o terceiro lugar no Prêmio Oceanos, e "Eva" (Todavia, 2022), finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, além do livro de contos "Mapas para Desaparecer" (Faria e Silva, 2022), finalista do Jabuti, entre outros. Foto: Bruna Casotti. Garanta o seu exemplar de "Puro", escrito por Nara Vidal, neste link.
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