Por Luiz Gomes Otero, jornalista e crítico cultural.
O coração paulista de Guilherme Arantes chegou aos 70 anos. E o melhor é que ele sempre parece estar se renovando, buscando novas inspirações de forma inquieta. Prova disso são seus mais recentes lançamentos autorais que só confirmam a sua genialidade e reforçam a sua importância no cenário da nossa MPB.
No meu caso, toda vez que a obra dele me vem na mente, sempre predominam as canções do seu primeiro álbum, de 1976. Nessa época ele conseguia traduzir em versos situações cotidianas com perfeição. Um exemplo é a faixa "A Cidade e a Neblina". Quem já passou pela região do ABC Paulista certamente se identifica com as imagens descritas nos versos da canção, que ilustravam os efeitos que a cerração provoca na paisagem das cidades daquela área. E o que dizer de "Descer a Serra", que lembra os passeios de trem pela antiga estrada férrea no litoral? E claro que não posso esquecer de citar "Meu Mundo e Nada Mais", que tocou exaustivamente em uma novela da Rede Globo e se tornou um clássico de seu repertório.
Com uma discografia tão extensa, era justo que sua mente inquieta explorasse novos horizontes. No álbum "Coração Paulista", em 1980, ele buscou uma sonoridade mais próxima do rock com letras ácidas e densas, mostrando uma realidade de tom cinza. E foi assim que ele conseguiu involuntariamente chamar a atenção de ninguém menos do que Elis Regina, que lhe pede duas canções para um disco que ela estava gravando no início dos anos 80. E Guilherme faz "Aprendendo a Jogar", que se tornou o último hit dela nas rádios. No ano seguinte, participa do festival MPB Shell com Planeta Água, canção que foi cantada pelo numeroso público presente. Não ganhou o festival, mas caiu nas graças do gosto popular..
A partir daí seguiu uma sequência de hits que marcaram definitivamente aquela década. Canções como "Deixa Chover", "Lance Legal", "Cheia de Charme", "Loucas Horas" e "Coisas do Brasil", entre outras, mostraram a sua competência como um autêntico hitmaker. Suas canções faziam sucesso até na voz de outros intérpretes, como Maria Bethânia ("Brincar de Viver"). Até o Rei Roberto Carlos gravou a bela "Toda a Vã Filosofia", composta sob encomenda para ele.
Os anos seguiram e Guilherme Arantes continuou gravando e lançando novas canções autorais. No disco mais recente, "A Desordem dos Templários", ele flerta até com elementos do rock progressivo, que norteavam o seu início de carreira. A verdade é que mesmo tendo alcançado todo esse sucesso, esse cara continua sendo o mesmo do início de carreira. E você ainda consegue vê-lo e ouvi-lo em shows ao vivo, com toda a sua essência como compositor e intérprete. Viva você, Guilherme Arantes. Viva nós, Viva o dia.
"Viva" (álbum "A Cara e a Coragem", 1978)
"A Cidade e a Neblina" (álbum "Guilherme Arantes", 1976)
"Descer a Serra" (álbum Guilherme Arantes, 1976)
"A Desordem dos Templários" (2023)
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