Inspirada no livro "12 Anos de Escravidão", de Solomon Northup, a peça conta a história de um homem negro que, após aceitar um trabalho, é sequestrado e escravizado por 12 anos. A montagem apresenta uma releitura através da ótica feminina negra, presente na direção de Onisajé e Tatiana Tiburcio. Fotos: Ale Catan
O espetáculo “12 Anos ou A Memória da Queda”, criado pela dramaturga Maria Shu estreia no dia 2 de março, quinta-feira, às 19h, no Centro Cultural Banco do Brasil em São Paulo. As alegorias utilizadas pelas diretoras Tatiana Tiburcio e Onisajé, que também assina a versão final do texto, entram na cena por meio dos personagens de David Júnior, Bruce de Araujo e Cintia Rosa o trio de protagonistas que traduz em imagem, movimento e discurso, dentro de certo realismo fantástico, os arquétipos da história original, "12 Anos de Escravidão", escrita por Solomon Northup.
Idealizada por Felipe Heráclito Lima, a montagem aborda uma temática ainda pulsante atualmente: a escravização dos corpos negros. A peça conta a história real de um homem negro no século XIX que, após aceitar um trabalho que o leva para outra cidade, é sequestrado e escravizado por 12 anos. A temporada segue até 9 de abril com sessões às quintas e sextas, às 19h; e aos sábados e domingos, às 17h.
“Reconstruímos essa história a partir da compreensão atual de quem é esse sujeito negro e o que significa essa liberdade para ele hoje a partir dessa trajetória. Porque não é interessante trazer algo datado, mas enxergar dentro dessa narrativa o que a gente conseguiu de vitórias e avanços e o que ainda precisamos romper enquanto imaginário sobre este sujeito, enquanto discurso deste mesmo sujeito, enquanto existência e perspectiva de futuro. O quanto ainda precisamos avançar a partir desta base constituída e apresentada lá trás”, observa Tatiana Tiburcio.
A soteropolitana Onisajé fala sobre o posicionamento cênico da dupla de direção que forma com Tatiana. “No que tange à temática, está em cena a nossa análise e posicionamento crítico, ético, político, filosófico e poético-estético acerca da escravização. Ele se traduz na compreensão de que a escravização se sofistica, se disfarça e ainda se mantém muito viva entre nós. Os aportes das diversas opressões encontram na escravização um lugar de deságue”, ressalta.
Onisajé acredita que mesmo os espectadores que não leram o livro e nem viram o filme, dirigido por Steve McQueen em 2013, encontrarão uma argumentação cênica que aponta o quanto ainda são criados discursos de inferiorização para justificar a neo-escravização. “A questão racial é a pauta mais urgente a ser enfrentada no Brasil. Um país que concebe e ainda alimenta argumentações e posicionamentos racistas não poderá avançar como nação”, defende.
Guiando a estética e a alma da montagem estão as referências da ancestralidade, da filosofia e mitologia negra. “A partir dessa compreensão revisitamos a história de Solomon entendendo os pontos críticos da narrativa em relação aos avanços no discurso racial na prática no nosso dia a dia. Ainda vivemos processos de escravização de diversas formas. Processos diretos - nos interiores deste nosso país - e de formas sutis, mas muito bem compreendidas por quem os sofre nos grandes centros urbanos. É preciso revisitar essa história e reconstruí-la a partir de um olhar feminino, negro, matriarcal, poético, lírico, onírico”, aposta Tatiana.
A ideia de levar aos palcos a história clássica que, em adaptação para o cinema, foi vencedora de três premiações no Oscar, partiu de Felipe Heráclito Lima. Ao se deparar com uma pesquisa sobre a quantidade inacreditável de trabalhadores em regime análogo à escravidão em fazendas de búfalo da Ilha de Marajó, no Pará, o artista questionador percebeu o quanto o assunto, até então por ele ignorado, precisava ser debatido.
“Senti a necessidade de falar sobre questões urgentíssimas como essa, porque é enorme a quantidade de pessoas iludidas por uma boa oportunidade de trabalho que, por fim, são submetidas a um regime desumano dentro de algumas distorções realizadas dentro do capitalismo - que não pode se impor sobre os valores humanos. Isso mexe muito comigo e pensei nesse projeto como uma plataforma de falar de todos estes assuntos que precisam ser vistos e debatidos a partir do nosso passado colonial nesta sociedade escravocrata”, resume.
O atual momento foi determinante para a montagem contar com David Júnior no elenco. “Estamos tocando numa ferida social, econômica, estrutural do nosso país que precisa ser falada. Me sinto muito realizado como artista pelo tema e pela equipe técnica incrível que conseguimos reunir neste trabalho. Enquanto tivermos pessoas sendo descartadas da sociedade apenas por representar o seu lugar de negro, com todo este discurso de ódio, invisibilidade e descaso com os corpos negros precisaremos colocar estes assuntos em voga. É importante estar em cena no momento em que estamos vivendo, falando dessas mazelas antigas e, ao mesmo tempo, tão atuais na nossa sociedade”, pontua David.
Bruce de Araujo ressalta a maneira como o tema é retratado em cena. “A peça foge dos clichês como são apresentados normalmente quando a gente trata de escravidão contemporânea, ou do racismo em suas mais diversas formas. O texto é direto, é atual, mas ele vem de uma maneira muito poética, muito bonito. E esse olhar poético faz com que as pessoas saiam do espetáculo potencializadas para promover uma mudança”.
A atriz Cintia Rosa comemora seu retorno ao teatro depois de 11 anos sem subir ao tablado. “Fazer meu retorno falando dessa história e poder ressignificá-la para que ganhe contornos mais leves e de vitória no final é uma grande alegria. Estar com esse elenco e com essas diretoras foi uma cura coletiva para mim, que me deixa extremamente feliz. Essa peça fala de uma história universal, mas que precisa ser falada o tempo inteiro, pois vemos histórias de racismo todos os dias. É um espetáculo para refletir sobre as várias formas de escravização moderna”.
O espetáculo “12 Anos ou A Memória da Queda” é apresentado em São Paulo pela Apsen, através do ProAc ICMS, e conta com patrocínio das empresas Atacadão, Boa Vista e Volkswagen através da Lei Federal de Incentivo à Cultura. O espetáculo estreou no CCBB Rio em novembro de 2022. Ao receber esse projeto, o Centro Cultural Banco do Brasil oferece ao público oportunidade de reflexão sobre temas relevantes para a sociedade e reafirma o apoio ao teatro nacional e seu compromisso com a promoção da arte e ampliação da conexão dos brasileiros com a cultura. Compre o livro "12 Anos de Escravidão" neste link.
Sinopse:
“12 Anos ou A Memória da Queda” é inspirado no livro "12 Anos de Escravidão", escrito por Solomon Northup. Com dramaturgia original de Maria Shu e texto final de Onisajé, que também assina a direção com Tatiana Tiburcio, o espetáculo teatral traz à tona uma temática pulsante na atualidade: a escravização de corpos negros. O projeto tem como inspiração a história real de Solomon - um homem negro que após aceitar um trabalho que o leva a outra cidade, é sequestrado e escravizado por 12 anos. No elenco, David Júnior, Bruce de Araujo e Cintia Rosa. Você pode comprar o livro "12 Anos de Escravidão" neste link.
Ficha técnica:
“12 Anos ou A Memória da Queda”
Elenco: David Júnior, Cintia Rosa e Bruce de Araujo.
Dramaturgia original: Maria Shu.
Texto final: Onisajé.
Direção artística: Tatiana Tiburcio e Onisajé.
Idealização: Felipe Heráclito Lima.
Coordenação geral e artística: Anna Sophia Folch e Felipe Heráclito Lima.
Direção de produção: Leila Maria Moreno e Felipe Valle.
Assistente de direção: Cridemar Aquino.
Direção musical e música original: Jarbas Bittencourt.
Cenografia: Wanderley Gomes, Cachalote Mattos e Tatiana Tiburcio.
Figurino: Wanderley Gomes, Guto Carvalhoneto e Tatiana Tiburcio.
Desenho de luz: Jon Thomaz.
Direção de movimento: Jefferson Bilisco e Tatiana Tiburcio.
Preparação corporal: Jefferson Bilisco.
Visagismo: Diego Nardes.
Visagista cabeleireiro: Lucas Tetteo.
Produção executiva: Raissa Imani e Aliny Ulbricht (Kawaida Cultural).
Designer gráfico: Cadão. Fotógrafo: Ale Catan.
Assessoria de imprensa: Adriana Balsanelli e Renato Fernandes.
Gestão de redes sociais: LB Digital e Conteúdo.
Gestão de projeto e leis de incentivo: Felipe Valle e Mariana Sobreira (Fomenta Consultoria).
Produtoras associadas: Brisa Filmes, Sevenx Produções Artísticas e Curumim Produções.
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Serviço:
Espetáculo “12 Anos ou A Memória da Queda”
Local: Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo
Temporada: de 2 de março a 9 de abril de 2023.
Horário: quintas e sextas, 19h | Sábados e domingos, 17h.
Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia) em bb.com.br/cultura e bilheteria do CCBB
Duração: 80 minutos.
Classificação indicativa: 12 anos.
Capacidade: 120 lugares.
Endereço: Rua Álvares Penteado, 112 - Centro Histórico, São Paulo.
Funcionamento: Aberto todos os dias, das 9h às 20h, exceto às terças.
Entrada acessível: Pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e outras pessoas que necessitem da rampa de acesso podem utilizar a porta lateral localizada à esquerda da entrada principal.
Informações: (11) 4297-0600.
Estacionamento: O CCBB possui estacionamento conveniado na Rua da Consolação, 228 (R$ 14 pelo período de 6 horas - necessário validar o ticket na bilheteria do CCBB). O traslado é gratuito para o trajeto de ida e volta ao estacionamento e funciona das 12h às 21h.
Transporte público: O Centro Cultural Banco do Brasil fica a cinco minutos da estação São Bento do Metrô. Pesquise linhas de ônibus com embarque e desembarque nas Ruas Líbero Badaró e Boa Vista.
Táxi ou Aplicativo: desembarque na Praça do Patriarca e siga a pé pela Rua da Quitanda até o CCBB (200 m).
Van: Ida e volta gratuita, saindo da Rua da Consolação, 228. No trajeto de volta, há também uma parada no metrô República. Das 12h às 21h.
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