Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com.
A crítica especializada torceu o nariz, pois queria menos teatro e mais cinema - mesmo em uma história que se passa na casa do personagem. Ao que tudo indica, quem escreve sobre o assunto, embora finja o contrário para parecer culto, não suporta ir ao teatro - por isso a ojeriza ao filme e uma série de bobajadas relacionadas à acusação de gordofobia na obra. Parece que os especialistas que escrevem sobre o assunto apenas leem uns aos outros e, para parecer de fato que são "críticos" de alguma coisa, ficam buscando "pelo em ovo" e se repetindo a ponto de não terem um pingo de personalidade - gostar de algo que está sendo criticado por um veículo de grande popularidade é proibitivo para esse tipo de gente. O resultado é uma coleção de críticas pasteurizadas que parecem ter sido escritas pela mesma pessoa.
O único consenso positivo, de acordo com eles, é a atuação de Brendan Fraser como o protagonista. Eles no entanto se esquecem que o ator está rodeado de bons parceiros de cena - a filha, principalmente (Sadie Sink, a Max de "Stranger Things"), a amiga (Hong Chau), o rapaz que o visita esporadicamente (Ty Simpkins), a ex-mulher (Samantha Morton) e até o entregador de pizzas (Sathya Sridharan) em uma participação pequeniníssima, mas desoladora. Ninguém nesse filme está a passeio.
Brendan Fraser, no entanto, alcança o sublime de seu lado artístico ao interpretar um professor de literatura que abandonou a filha de oito anos e a mulher para viver com o amante - um ex-aluno. Só essa informação faz desse personagem um monstro, mas é ao contrário: com 270 quilos, ele é um homem apaixonante, com um olhar de coitado que parecem pedaços de mar e alguém que sempre pede desculpas a todos os que o rodeiam. À primeira vista, execráveis são as abandonadas que, na verdade, também não são tão desprezíveis assim. Todos têm um contexto e uma motivação para fazerem o que fazem - mesmo quando as atitudes, motivadas por vingança, não se justificam.
"A Baleia" faz pensar o abandono de outras pessoas e de si próprio. O espectador presencia o momento crucial de quando alguém paga pelas escolhas feitas no passado e conscientemente quer se matar sem tomar uma decisão extrema. Porque, em algum momento da vida, inevitavelmente, as pessoas abandonam aqueles que amam para se arrepender depois. Por que todos continuam sendo tão burros e repetitivos? Por que resolvem voltar, e por que isso sempre acontece?
Conscientemente, a comida é a arma letal do personagem. É agoniante ver, diante das telas, alguém com obesidade mórbida devorar tantas gostosuras calóricas, mesmo tendo a certeza de que vai fazer mal - a vontade é invadir o filme e obrigá-lo a ir ao hospital. Ele se recusa porque quer deixar uma herança a quem não merece - um exemplo do que a culpa faz com as pessoas: torna-as idiotas.
O alimento é o vilão e o alívio do protagonista em um filme tenso que se passa entre quatro paredes e outros cômodos de uma casa. Chove do lado de fora quase sempre. A chuva é o estado de espírito de todos. Quando o personagem se frustra, é na alimentação que encontra algum tipo de consolo. Ele é a personificação da baleia "Moby Dick", citada durante todo o longa-metragem. É um trocadilho péssimo com a forma física de alguém que precisa de ajuda, mas é mais do que isso.
Quanto mais ele come, mais se afoga. A filha, por sua vez, é um mar de mágoas e a metáfora de um peixe fora d'água. No final das contas, é uma aula sobre como escrever bem e de como se utiliza a técnica, mesmo quando se atravessa turbulências, para concluir trabalhos e linhas de raciocínio. "Use a verdade, na vida e no que você está expressando", ecoa o filme para depois do fim. Quando o sol aparece é pela redenção de um pai diante da filha. A morte é o renascimento para ambos. Eles representam um final feliz que não vai acontecer, mas que é o único possível.
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