sábado, 3 de dezembro de 2022

.: O Teatro de onde eu venho, por Celso Frateschi, que se apresenta no Sesc


Por Celso Frateschi. Foto: João Caldas.

Tinha por volta de 13, 14 anos quando entrei pela primeira vez no Teatro de Arena de São Paulo para assistir Arena Conta Zumbi.  Aos 17, cursava com Heleny Guariba e Cecilia Boal o curso de interpretação daquele grupo emblemático do teatro brasileiro. Logo em seguida entrei no elenco de Zumbi que tinha me aberto as portas do desejo de ser ator. Vivíamos sob violenta ditadura e ainda menor de idade fui sequestrado a primeira vez pela Operação Bandeirante (OBAN).

O cativeiro era uma cela improvisada num quartel do bairro de Ibirapuera. Desde então teatro e política já norteavam a minha vida, e assim continua, muito embora sempre se provocando mutuamente. Nessa tensão criativa construí a minha carreira. A arte sempre questionando a ideologia e vice-versa. Veio o golpe no golpe com o AI-5. Muita gente presa e muita gente morta. Gente muito próxima. Nossos mestres, Boal preso e exilado e Heleny assassinada em tortura e dada oficialmente como desaparecida. O terrorismo de estado imperava. Nossa arte resistia. Teatro Jornal, Zumbi, Doce América Latino América. O cerco crescia. 

O Teatro São Pedro, de Maurício Segall, nos acolheu até 1974, até que a ditadura com a censura prévia e suas prisões inviabilizou aquele projeto. Maurício foi preso pela “justiça militar” e eu junto de Denise Del Vechio, então casada, fui mais uma vez sequestrado. Dessa vez invadiram o palco logo no início do espetáculo. O cativeiro agora era a cela do DOI-CODI. Desde 1964, o teatro paulistano sempre resistiu artisticamente à ditadura tentando, e algumas vezes conseguindo, driblar a censura. 

O Teatro de Arena, o Teatro Oficina, grandes diretores como Boal, Zé Celso Martinez Corrêa, Fernando Peixoto, Flavio Rangel, Antônio Abujamra, Gianni Ratto, Antunes Filho, Márcio Aurélio e muitos outros. Autores como Plínio Marcos, Naum Alves de Souza, Maria Adelaide Amaral, Consuelo de Castro, Antônio Bivar, José Vicen te, Luís Alberto de Abreu, esses entre muitos. Atrizes e atores como Cacilda Becker, Tônia Carrero, Paulo Autran, Sérgio Mamberti, Renato Borghi, Fernanda Montenegro, Fernando Torres, Norma Bengel, enfim esgotaria todo este espaço com nomes de artistas de teatro dessas gerações que resistiram à violência da ditadura. Fui formado nessa geração e me orgulho disso. 

Ao sair do Teatro São Pedro fomos para a periferia de São Paulo e lá ficamos junto com os que lutavam por moradia, contra a carestia e por melhores salários e pela educação, até que os ventos da abertura sopraram depois das greves do ABC. Continuei sendo movido pela mesma tensão. Na década de oitenta, fui chamado por Marcio Aurélio para interpretar "Hamlet", sonho de todo ator. Nosso "Hamlet" espelhava a nossa geração que teve o trono usurpado, anunciando as portas da nossa democracia. Ao mesmo tempo, no bairro do Belenzinho, na Casa de Cultura Mazzaropi, formamos um grupo de teatro comunitário com um elenco de 60 atores não profissionais. 

Em seguida, uma outra experiência de teatro comunitário que resultou na ocupação do Tendal da Lapa, hoje uma consagrada Casa de Cultura da cidade de São Paulo. No começo dos anos 90, fui convocado pelo prefeito Celso Daniel para ocupar a Secretaria de Educação, Cultura e Esporte de Santo André, onde conseguimos, além de grandes avanços em todas as áreas, proporcionar o fortalecimento do teatro comunitário em muitos bairros da cidade, além da criação da Escola Livre de Teatro, referência em formação teatral. 

Na virada do século, junto com Roberto Lage, fundamos o Ágora Teatro onde estamos hoje eu, Sylvia Moreira e nosso núcleo de pesquisa teatral.  Nesses últimos vinte anos, a mesma tensão criativa continua me impulsionando. Junto com todo o repertório do Ágora Teatro – que inclui Dostoiévski, Shakespeare, Tchekhov, O’Neal, Tenesse Willians, Georg Buchner, Machado de Assis, e muitos outros autores brasileiros através de programas como Ágora Livre Dramaturgias, além de cursos, ciclos de conferências, debates e núcleos de pesquisa – ainda tive a honra de ser secretário de cultura da cidade de São Paulo e presidente da Funarte. 

Agora, ao comemorar 50 anos de carreira, com dois anos de atraso devido a pandemia, quero de alguma forma relembrar essa história e homenagear toda essa geração que produziu esse teatro vigoroso, apesar de toda a adversidade enfrentada. A montagem de “O Canto do Cisne”, essa pequena pérola da dramaturgia de Tchekhov, através das lembranças e reflexões de seus personagens Vassili e Nikita, permite espelhar de alguma forma esses nossos últimos cinquenta anos.

Ficha técnica: 
"O Canto do Cisne"
Texto:
 Anton Tchekhov
Adaptação: Celso Frateschi
Direção: Vivien Buckup
Co-direção: Francisco C. Martins
Elenco: Celso Frateschi e Thaïs Ferrara
Cenografia e figurino: Sylvia Moreira
Luz: Wagner Freire
Música original: Dan Maia
Visagismo: Leopoldo Pacheco
Montagem e operação de luz: Vinícius Rocha
Operação de som: Rogério Prudêncio
Assistência de palco e camarim: Elisabete Cruz e Jefferson de Oliveira
Fotos: João Caldas
Produção: Marlene Salgado e Ágora Teatro
Indicação etária: 14 anos
Duração: 60 minutos 


Serviço: 
"O Canto do Cisne"
Dia 3 de dezembro, sábado, às 20h 
Teatro do Sesc Santos 
Ingressos:
 R$ 40 (inteira). R$ 20 (meia-entrada). R$ 12 (credencial plena) 

Sesc Santos 
Rua Conselheiro Ribas, 136, Aparecida - Santos
(13) 3278-9800
www.sescsp.org.br/santos 

Orientação para acesso à unidade: 
Uso de máscara obrigatório

Bilheteria Sesc Santos - Funcionamento
Terça a sexta, das 9h às 21h30 | Sábado, domingo e feriado, das 10h às 18h30 

Estacionamento em espetáculos (valor promocional – mediante apresentação de ingresso): R$ 6 (credencial plena) R$ 11 (visitantes). Para ter o desconto, é imprescindível apresentar no caixa a credencial plena atualizada. 

Bicicletário: gratuito. Uso exclusivo para credenciados no Sesc. É necessária a apresentação da credencial plena atualizada e uso de corrente e cadeado por bicicleta. 100 vagas.


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