Aqueles que leram "Também os Brancos Sabem Dançar", de Kalaf Epalanga, devem ter reparado na presença de um afiadíssimo e bem-conectado personagem brasileiro que introduz o próprio autor em nosso universo cultural e musical. Pois esse amigo baiano do escritor e músico angolano é nada menos do que Quito Ribeiro, autor deste romance.
"No Canto dos Ladinos", lançado pela editora Todavia, enfeixa e dá sentido a um conjunto de histórias que vão compondo um quadro muito original. São personagens que vivem em bairros afluentes, viajam para conferências no exterior, frequentam bons restaurantes. Um traço em comum é sua negritude. Outro, o fato de serem figuras difíceis de acomodar nos padrões sociais - e ainda racistas - do Brasil.
“E no Brasil pode ser bem estranho um negro sentar-se num restaurante chique de um bairro de classe alta, usando uma roupa descolada, indo tomar um café da manhã no dia seguinte à virada de ano. Esse é um hábito para brancos brasileiros”, diz a certa altura um personagem do livro. Com grande habilidade narrativa, o autor traça um quadro amplo do ponto de vista social e delicado do ponto de vista subjetivo. O resultado a partir desses dois campos de força é a atordoante leitura de nossa vida social.
A chegada de milhares de estudantes negros às universidades nas últimas duas décadas; a recente e enorme difusão da obra de Frantz Fanon, o fundamental pensador antirracista e anticolonial; a busca por uma ancestralidade cujos registros foram apagados pelos escravizadores; as tradições familiares; o espaço movediço dos negros que dispõem de recursos materiais mas que ainda assim estão sujeitos ao preconceito e à ofensa. Tudo isso aparece neste romance que oferece - com inteligência e num texto que lança mão da ficção, do ensaio e do memorialismo - um painel singular da vida contemporânea brasileira.
Sobre o autor
Quito Ribeiro nasceu em Salvador, em 1971. É compositor com dezenas de músicas gravadas por artistas como Gilberto Gil, Moreno Veloso, Roberta Sá, entre outros.
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