Por: Mary Ellen Farias dos Santos
Em setembro de 2022
Diante de Maria Helena, sentada na cadeira de rodinhas, numa pose um tanto que confortável e relaxada, aquela mulher de longas madeixas pretas azuladas abriu um sorriso enquanto respondeu a pergunta que não saía da mente da escritora.
- Sou Aurora. A sua criação!, levantou-se com certo deboche no canto da boca enquanto dizia e, por fim, posicionou-se cara a cara com a dona da casa mantendo as sobrancelhas no alto, passou a língua nos dentes com os braços cruzados, pendeu o quadril para o lado esquerdo, batendo a ponta da sola do pé direito.
Maria Helena desviou o olhar. Colocou a caneca com chá de amora quentinha que estava entre as mãos, em cima do móvel ao lado. Coisa que nunca fez até hoje. Era zelosa e sabia que aquele repouso iria manchar parte da estante do computador que seu pai lhe dera aos 15 anos, feito pelo marceneiro da família, que veio equipada com um computador de " processador 166", microfone, impressora e scanner de mesa.
Era aquilo ou derrubaria todo o líquido no chão e ainda quebraria sua caneca favorita. Engoliu em seco com a afronta. Uma completa confusão mental invadiu os pensamentos duvidosos dela, somente foi capaz de questionar com a voz falha:
- Isso aqui é uma pegadinha ou...?!
Não conseguiu completar a pergunta, uma vez que foi invadida por uma tontura que lhe tirou o chão, embora tenha sido rápida para se segurar na lateral do móvel do computador antes de cair de joelhos, definitivamente no chão.
Respirou fundo, fechou os olhos. Tornou a respirar fundo, abriu os olhos. Levantou a cabeça e lá estava a tal Aurora sorrindo até que disse:
- Ora! Ora! Não se espante! Eu sou um pouco de você, de todos os que conhece e daqueles a quem você conheceu por tantos encontros da vida, por livros e vídeos. Eu sou o resultado deles, mas também muito de você! Não há o que temer, pois você me conhece, mais do que eu mesma.
Maria Helena sentou-se no chão acarpetado sem tirar os olhos de Aurora que tornou a se sentar na cadeira de rodinhas. E perguntou:
- Quem mandou você aqui para fazer essa brincadeira descabida comigo?
Aurora tirou o sorriso do rosto e respondeu:
- Calma, Maria Helena! Eu sou uma criação sua. É que eu não estava gostando da minha história e vim aqui propor um acordo.
Foi quando a campainha tocou. Era o marido de Maria Helena. Tinha chegado do trabalho.
- Você fique aqui. Que eu irei explicar tudo para o Eder. Se é que isso tem como dar alguma explicação que seja.
Aurora sentou-se na cadeira de modo despojado, enquanto sorriu para Maria Helena e disse:
- Ok. Até mais!
*Editora do portal cultural www.resenhando.com. É jornalista, professora e roteirista. Twitter: @maryellenfsm
.: Capítulo 5: "Aurora" em "Parte de Mim"
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