domingo, 24 de julho de 2022

.: Entrevista: Matheus de Moura fala sobre "O Coronel que Raptava Infâncias"

Jornalista que investigou o chocante caso do coronel responsável por uma rede criminosa envolvendo crianças fala com exclusividade ao Resenhando.com e revela detalhes sobre o caso que chocou o Brasil. Foto: Leo Aversa

Era dia 10 de setembro de 2016 quando a atendente do drive-thru de uma lanchonete em Ramos, subúrbio do Rio de Janeiro, saiu da cabine para entregar o lanche ao cliente de um Jetta branco. O vidro escuro é baixado e a jovem vê um homem de cabelo branco ao volante e, na carona, uma menina que aparenta não ter mais que dois anos. A cena seria corriqueira se não fosse incomum: o motorista era Pedro Chavarry Duarte, coronel reformado da Polícia Militar do Rio de Janeiro, no dia seguinte em todos os telejornais, acusado de estupro de vulnerável.

A carreira de Chavarry era marcada pela obscuridade de ações pautadas por bandeiras de assistência social que tinham enfoque em crianças na primeira infância, geralmente de famílias em condições de extrema pobreza. Com as credenciais que tornavam sua reputação inquestionável, Chavarry encontrava as vítimas em comunidades carentes: mulheres com filhos muito pequenos. O policial oferecia a elas emprego, assistência financeira e ainda por cima cuidava das crianças em uma suposta creche. Jamais foi descerto o endereço da instituição. 

Quando Chavarry colocava as crianças em seus carros de luxo alugados, as mães não sabiam para onde elas eram levadas ou o que acontecia durante as muitas horas de ausência. Até a noite no estacionamento da lanchonete em Ramos. O jornalista Matheus de Moura - colaborador de veículos como a revista Piauí e o UOL - escreveu o livro "O Coronel que Raptava Infâncias", lançado pela editora Intrínseca. Nesta entrevista exclusiva, ele conta detalhes sobre o caso que chocou o país.


Resenhando.com - Ser jornalista é ter a oportunidade de contar boas histórias. Por que escolheu justamente esta? 
Matheus de Moura - Eu diria que jornalista é muitas coisas, contar boas histórias não é uma oportunidade, mas uma disposição do repórter em procurá-las e aceitar as barreiras que cada história boa vai trazer.


Qual foi a a motivação para escrever a respeito de um caso tão perturbador quanto o do coronel Pedro Chavarry Duarte?
Matheus de Moura - Eu acabava de ler o clássico "A Sangue Frio", do (Truman) Capote, e sentia que a história certa para o meu TCC estaria perdida nas páginas de jornais. Foi o que senti quando vi o coronel no (programa) "Fantástico", numa nota coberta de 2-3 minutos. É uma sensação engraçada de que há algo ali, algo profundo, além do reportado e que conta alguma faceta da sociedade. 

Resenhando.com - Se tivesse a oportunidade de dizer algo ao coronel o que seria?
Matheus de Moura - Prefiro não responder essa, amigo.


Resenhando.com - E, se pudesse fazer uma única pergunta ao homem que protagonizou o seu primeiro livro, qual seria?
Matheus de Moura - Uma só? Ish... difícil! Talvez eu perguntasse: "por quê?".


Resenhando.com - Durante a pesquisa para a elaboração do livro, qual foi o detalhe e o depoimento que mais o impressionaram?
Matheus de Moura - Fiquei impressionado com a sistematização dele, a forma como um homem soube usar da máquina pública-privada em prol de si mesmo. Talvez o relato que mais me impressionou foi um detalhe, um detalhe de um PM que ouviu de outro colega: "o Chavarry a gente deixa passar", explicitando que tudo sempre ocorreu às luzes.

Resenhando.com - Há algo no passado ou na biografia do coronel que pode fazer com que as pessoas não o vejam como um monstro em sua totalidade?
Matheus de Moura - Ele é humano, parece amar a família que tem, veio de uma origem rígida e viveu intensamente demais com religiosos idosos enquanto ele mesmo era só moleque. Contudo, fica difícil acessar a humanidade de alguém que se recusa a falar com você. 


Resenhando.com - Quando percebeu que era a hora de parar de pesquisar e escrever o livro?
Matheus de Moura - Quando bateu o deadline (risos). Zé Hamilton Ribeiro já dizia: "não existe um momento de satisfação com uma reportagem, a gente para quando tem que entregar".


Resenhando.com - O livro tem tudo para dar origem a uma série documental. Há alguma movimentação para isso acontecer? Quando escreveu, tinha isso em mente?
Matheus de Moura - Olha, eu preferiria uma adaptação ficcional, uma vez que envolveria expor menos as vítimas a mais um testemunho. Houve conversas sobre isso, mas nada muito concreto até agora.


Resenhando.com - Você se inspirou no clássico do jornalismo literário "A Sangue Frio" para escrever "O Coronel que Raptava Infâncias". O que esse livro tem a ensinar sobre a arte de contar histórias reais?
Matheus de Moura - Ele tem a ensinar muito sobre como usar técnicas de romance em histórias reais e, diria eu, muito também sobre como ver numa história o potencial de contar sobre uma época, um contexto, algo além daquela singularidade. Acho que Capote se beneficiou muito de uma leitura sociológica sobre o caso que cobriu. Tentei fazer o mesmo, se consegui... bem, isso é outra história, o leitor que dirá.


Resenhando.com - Hoje, depois de ter escrito o livro, qual é a sua opinião pessoal sobre o coronel, e a punição mais justa para ele? 
Matheus de Moura - Prefiro não opinar.


Resenhando.com - Na literatura, quais são os seus próximos projetos?
Matheus de Moura - Estou envolvido com dois livros que devem demorar a sair. Ambos true crime, um sobre um assassino e outro sobre crime organizado. É tudo que posso dizer.



+Sobre o caso:
Você pode comprar o livro "O Coronel que Raptava Infâncias", de Matheus de Moura, neste link.


Ficha técnica
Livro: "O Coronel que Raptava Infâncias" | Autor: Matheus de Moura |  Editora: Intrínseca | Páginas: 268 | Link do livro na Amazon: https://amzn.to/3z6IteY



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