domingo, 1 de maio de 2022

.: Carol Costa, a estrela dos musicais, em uma entrevista exclusiva

"O sonho dela que se encontra com o meu em algum momento naquele palco", diz a atriz sobre a Roxie Hart, de "Chicago". A premiada artista esbanja talento e versatilidade em novo desafio profissional e se destaca por sua trajetória ascendente e inspiradora nos palcos. Fotos: Adriano Dória

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando. 

Atriz, cantora e bailarina carioca, Carol Costa faz sucesso em São Paulo como protagonista de um dos musicais mais famosos do mundo em palcos e telas, "Chicago", dando vida à icônica assassina, presidiária e sex Roxie Hart - papel que já foi interpretado por nomes como Gwen Verdon (na Broadway) e Renée Zellweger (no cinema). No musical, que chegou a ser adiado algumas vezes em função da pandemia da covid-19, Carol Costa contracena com Emanuelle Araújo e Paulo Szot.

Primeira protagonista em 12 anos de carreira, ela traz na bagagem, além de passagens pela TV, mais de 15 musicais no eixo Rio-São Paulo, dando vida à personagens marcantes como Hebe Camargo, em "Hebe - O Musical", "Annie" e Chiquinha, de "Chaves" - que lhe consagrou Melhor Atriz Coadjuvante nos Prêmios Bibi Ferreira e Destaque Imprensa Digital. Nesta entrevista, respondida em meio a sessões extras e uma agenda lotada de compromissos profissionais, Carol Costa revela detalhes sobre a carreira, fala sobre sucesso e ainda conta uma novidade sobre o próximo musical.


Como é ser Roxie Hart no teatro?
Carol Costa -
Ser Roxie é a realização de um sonho e o resultado de muitos anos de estudo e trabalho. Quando paro para pensar na dimensão que é estar interpretando esse papel, é realmente muito emocionante. 


Existe receio de ficar marcada pela personagem?
Carol Costa -
Não tenho receio de ficar marcada porque tenho uma carreira vasta no teatro musical e já sou conhecida por interpretar personagens muito diferentes uns dos outros. Gosto de trabalhar com essa elasticidade. De estar em constante transformação. Meu público me chama de "Hebinha", "Chiquinha", "Lili du Palace", "Cangaceira" e agora vão chamar de "Roxie" também (risos). Cada personagem marcou de alguma maneira e se marcou, quer dizer que fiz um belo trabalho.


Há alguma espécie de ritual para entrar na personagem? 
Carol Costa - 
Ritual se chama estudo (risos). Bastante estudo. Além disso, muita disciplina e concentração. A responsabilidade de entregar um musical desse porte é grande. Não existe um minuto que eu não esteja concentrada na cena que vem a seguir e no que preciso fazer.


Como você se prepara para as apresentações? 
Carol Costa - 
Durante a semana me preparo fazendo aulas de ballet, canto e exercícios de fono, além dos treinos de fortalecimento. Estar sempre saudável e hidratada é essencial, afinal são 2h30 em cena. A preparação antes da peça consiste em aquecimento corporal e vocal com todo o elenco reunido. Ensaios, se for preciso ajustar alguma coisa.


Como são os minutos antes de cada apresentação?
Carol Costa - 
No meu camarim gosto de ter "amuletinhos" de proteção, gosto sempre de rezar antes de entrar em cena também. Penteado, colocação de microfones e maquiagem. Eu acredito que uma boa coxia e um bom convívio em equipe reflete diretamente no resultado no palco. Então, mesmo com a correria, quando sobra um tempinho gosto de me conectar com meus amigos antes de entrar em cena. Eu corro para pegar aquele cafezinho e colocar o papo em dia. Isso me renova para começar a semana de shows.


O que a personagem tem de mais semelhante - e mais diferente - de você?
Carol Costa -
Eu e Roxie somos muito resilientes. Somos parecidas nesse sentido. Mas eu jamais faria tudo pelo sucesso que nem ela. A fama para mim é consequência. Eu gosto de aproveitar o caminho, de me deliciar com o processo.


Há muita pressão - interna e externa - para interpretar a personagem? 
Carol Costa - "Chicago" é um musical montado mundialmente, né? E ainda temos uma grande referência para o público que é o filme. Não tem pressão que me faça duvidar ou me questionar sobre o quanto batalhei para estar aqui. Lógico que o grande público compara com as referências que tem e especialmente o público que é fã de "Chicago". Mas a pressão só existe na nossa cabeça, se a gente deixar. O resultado e a parte glamorosa quem vê é o público. Eu sou a única e responsável pelo meu processo até chegar ao resultado final. Sempre fui uma artista pé no chão. Minhas conquistas sempre foram suadas. Sempre corri atrás. Se eu entrasse nessas de pressão, se eu ficasse só preocupada com o resultado, eu surtaria e não conseguiria fazer o meu melhor. Por trás de um trabalho bem-feito existe muito estudo, dedicação e disciplina. E nosso "Chicago" tem tudo isso!


Quais os maiores desafios em interpretá-la?
Carol Costa - 
O maior desafio é contar essa história com verdade! Roxie é uma das personagens mais completas de teatro musical. Ela possui tantas curvas, tantas nuances. Ela é tão complexa e tão infinita de possibilidades ao mesmo tempo. É um desafio, mas é um deleite também viver uma personagem tão completa assim. É uma responsabilidade contar essa história que é baseada em fatos reais. É a vida que imita a arte e tudo se mistura. O sonho dela que se encontra com o meu em algum momento naquele palco. E assim eu empresto minha bagagem para ela e ela me empresta tudo que ela viveu como mulher e me ensina todos os dias. Sobre resiliência, sobre sonho, sobre perdas e conquistas. Erros e acertos.


Por conta da covid-19, em que os teatros fecharam temporariamente as portas, foram dois anos de espera para a estreia do musical. O que fez neste período e como se preparou para a personagem?
Carol Costa -
Foram dois anos de dúvidas e ansiedades. Para viver Roxie, procurei manter os estudos em casa, fiz aulas de ballet on-line, procurei o yoga e busquei muitas referências assistindo tudo que eu podia em filmes e séries. Além das principais referências como Ann Reinking, Gwen Verdon e Reneé Zellweger, eu busquei me familiarizar com as referências dos anos 20 e pesquisei muito sobre a vida de Maurine Dallas Watkins, que escreveu a peça originalmente. Quando houve a flexibilização voltei para as aulas de dança e canto presenciais, além de fazer um trabalho de fortalecimento para o corpo. Na quarentena me reinventei com o teatro on-line. Participei de um projeto adulto e um infantil virtualmente. Dei aula de dança para a minha sobrinha e para adolescentes. Entrei para um grupo de estudos com oito atores, encabeçado pelo diretor Sergio Módena, e esse estudo de três meses virou um projeto que hoje estamos correndo atrás para realizar e colocar no palco.


Em um mundo em que grande parte das pessoas querem os 15 minutos de notoriedade - como a própria Roxie Hart - como você analisa a busca das pessoas pela fama instantânea no dia de hoje?
Carol Costa -
Tenho preguiça (risos). Eu gosto do estudo, do trabalho, do processo. O povo quer resultado, né? Mas eu sou de uma outra época. Hoje o contratante quer número de seguidores. Infelizmente. E nem sempre o número de seguidores vem acompanhado de conteúdo, de inteligência, de estudo etc… se não tiver o mínimo de talento não segura, né gente? A fama realmente vai ser instantânea e vai passar.


Interpretar Roxie Hart é o sonho de muitas atrizes do teatro musical. Com este sonho realizado, qual é a próxima personagem emblemática que você almeja interpretar?
Carol Costa - 
Sou muito abençoada porque tenho algumas personagens potentes no currículo. Hebe, Chiquinha, uma fazendeira nordestina, agora a multifacetada Roxie. Mulheres empoderadas. Fortes. Eu costumo dizer que confio nos planos do Universo e no que a arte reserva para mim. O que posso dizer é que depois de Roxie já voo direto para a Terra do Nunca, para dar vida a doce Wendy, em uma nova temporada de "Peter Pan - O Musical da Broadway", onde viverei um universo completamente diferente do que estou vivendo agora, em "Chicago". Amo esses desafios. E depois de Wendy, já tenho mais novidades, porém ainda não posso falar (risos)...


Você também já foi Hebe Camargo no teatro. Como é interpretar uma personalidade tão emblemática - e em que ela faz falta no Brasil de hoje?
Carol Costa - 
Foi bacana poder criar com liberdade essa história. Diferentemente de todo aquele glamor que o público estava acostumado, eu pude dar vida a uma fase de vida da Hebe que a grande maioria não conhecia. Vivi aquela menina quase adolescente de Taubaté, que tinha sonhos e batalhou por suas conquistas. Com muita dificuldade financeira e persistência conseguiu se transformar numa das maiores comunicadoras da TV brasileira. Hoje em dia, Hebe seria a apresentadora que daria espaço a todos, a todas as tribos, sem preconceito. Com certeza ela representaria muitas mulheres dando voz às suas lutas. Se Hebe já tinha uma enorme força naquela época mais machista, imagina hoje em dia? Naquela época, Hebe já tinha coragem para ser uma mulher mais livre com a mente aberta. Ela falava o que queria e deixava os outros falarem também. Mesmo que discordasse, ela dava chance do outro falar. Com a evolução do mundo e hoje, com tantas bandeiras sendo levantadas, Hebe sem dúvidas seria uma porta voz de várias tribos. Seria um exemplo, um grito de liberdade para muitos, principalmente para as mulheres!


A Chiquinha de "Chaves - O Musical" fez você ganhar prêmios de melhor atriz coadjuvante. Como foi interpretar esta personagem? É um desafio a mais passar pelo público infantil?
Carol Costa -
Foi no mínimo surpreendente. Eu não pareço em nada fisicamente com Maria Antonieta de Las Nieves. Então o desafio já começou no meu teste para o musical. Fazer com o que a banca criativa enxergasse que eu poderia fazer o papel. E deu certo. Não foi desafiador passar pelo público infantil, eu diria que foi desafiador passar pelo público de "Chaves" (risos). Meu Deus! Algumas noites sem dormir confesso (risos). Uma responsabilidade enorme entregar uma personagem que temos na memória. Eu também sou fã de "Chaves". Eu tinha essa responsabilidade com o público e com a minha memória de infância. Eu me dediquei muito para chegar o mais próximo possível, sempre respeitando o que foi construído originalmente pela atriz que concebeu Chiquinha. Além disso, contar essa história foi reviver um gosto de infância com cheiro de almoço da vó quando chega da escola, sabe? Era uma mistura de sensações. Foi mexer no imaginário, na criança interior. E foi um trabalho tão primoroso e feito com tanto cuidado, que foi o sucesso que foi. Foi um presente!


E o trabalho em "Annie"? Quais as principais lembranças?
Carol Costa - 
"Annie" foi uma delícia. Eu me diverti pra caramba com Miguel Falabella, Cleto Baccic, Ingrid Guimarães e um grande elenco. Trabalhar com o Falabella é sinônimo de muitas risadas e permissões deliciosas. Todo artista gosta de liberdade no palco. E Miguel é desses artistas/diretores que permite que o ator crie, que dá espaço, dá oportunidade. Era uma escola de comédia. Aprendi muito. E eu amava estar rodeada de tantas crianças talentosas, tantos jovens talentos.


Qual é a maior dificuldade - e o maior prazer - de ser atriz de teatro musical no Brasil?
Carol Costa - 
Olha, eu não posso reclamar, pois faço parte de uma mínima porcentagem de artistas que conseguem sobreviver de arte no país. Eu tenho noção disso. É gratificante reconhecer que sou realizada profissionalmente, e sucesso para mim é isso. Poder viver do que amo fazer. Mas estabilidade é outra coisa. Isso não temos. A realidade é dura. Enquanto tantos artistas não conseguem ou não têm oportunidades, quantas pessoas conhecemos que são realizadas na profissão? Eu vivo de teatro musical há 12 anos, mais ou menos, e nunca me faltou nada. Graças a Deus, ao meu esforço e as oportunidades. Mas, claro, não posso fechar os olhos para o que acontece. A incerteza e a insegurança sobre como será o mês seguinte é recorrente. Milhões de trabalhadores da cultura estão desempregados. Principalmente com o atual governante e as mudanças que ele causou no setor cultural. Estamos falando de um Brasil que, no momento, tem o governo com a pior gestão da área. Um governo em que há censura, cortes orçamentários, há perseguição aos fazedores de cultura. Um governo que, para aprovar leis de incentivo, só aprova a base de muita pressão. E quando aprova! Por isso penso que a maior dificuldade de fazer teatro no Brasil hoje em dia, é o atual governo que temos.



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