segunda-feira, 9 de maio de 2022

.: Exclusivo: as confissões de Andréa Del Fuego, autora de "A Pediatra"

Em "A Pediatra", Andréa del Fuego apresenta a história de uma personagem muito peculiar: Cecília, uma médica nada afeita a crianças. Foto: Instagram @andreadelfuego

Andréa Del Fuego é uma escritora com medo e coragem na mesma medida. Assim se define a escritora do momento. Autora do livro "A Pediatra", que arrebatou público e crítica, ela confessa que tem em comum com a protagonista que não gosta de crianças a falta de paciência. Com humor mordaz, o romance, lançado pela editora Companhia das Letras, pode ser lido como uma crônica do cotidiano em que se mergulha no universo de uma mulher tão furiosa quanto vulnerável.

Nasceu na cidade de São Paulo em 1975, ela é formada em Filosofia pela Universidade de São Paulo e é autora de contos, livros juvenis e romances, entre eles "Os Malaquias", que venceu o Prêmio José Saramago e foi publicado na Alemanha, Itália, França, Israel, Romênia, Suécia, Portugal e Argentina. Nesta entrevista exclusiva, a autora, com uma generosidade própria de grandes artistas, responde sobre "A Pediatra", rituais para escrever e, até, sobre ela mesma. 

O que você tem de mais próximo e de mais diferente da Cecília, de "A Pediatra"?
Andréa Del Fuego - De mais próximo, a falta de paciência; de mais diferente seria a capacidade de camuflar essa falta de paciência. Cecília é incapaz de frear os pensamentos.

Qual é a sua opinião pessoal sobre ela?
Andréa Del Fuego - Uma mulher que é mais vulnerável do que o bebê por quem ela se aproxima. Acredita no que pensa sem desconfiar que o pensamento não uma verdade. Encapsulada, solitária crônica e adoecida.

Como surgiu a ideia de escrever o livro? 
Andréa Del Fuego - A ideia surgiu de uma vontade antiga de escrever em primeira pessoa sobre uma mulher estranha, assim como escrever sobre a maternidade. Uma pediatra que não gosta de criança caiu como uma luva.


Imaginava que o livro faria tanto sucesso?
Andréa Del Fuego - Não imaginava o sucesso, ainda não imagino, é uma surpresa. 

O que representa a literatura em sua vida? 
Andréa Del Fuego - Tudo, em todas as esferas.

Na sua própria literatura, em que você se expõe mais, e por outro lado, em que você mais se preserva, em seus textos? 
Andréa Del Fuego - A exposição está falsamente camuflada numa certa preservação. Porque a linguagem não precisa lidar com minha biografia, mas ela lida com a biografia de tudo o que me cerca, é a intimidade do mundo que me atravessa; é também ambíguo porque tem uma impessoalidade aí.

Que conselhos você dá para as pessoas que pretendem enveredar pelos caminhos da escrita?
Andréa Del Fuego - Escrever como se ninguém fosse ler. É preciso ter essa experiência.

Quais livros foram fundamentais para a sua formação enquanto escritora e leitora?
Andréa Del Fuego - São muitos e aparecem a todo momento, cada fase tem seus totens. Nesse instante, estou inspirada pela brevidade de Lydia Davis, a quem sempre retorno.

Como e quando começou a escrever?
Andréa Del Fuego - Ainda criança, quando descobri que escrever era mentir. Desde então, sigo mentindo.

Quais escritores mais influenciaram a sua trajetória artística e pessoal? Por quê?
Andréa Del Fuego - Clarice Lispector, Lygia Fagundes Telles, Murilo Rubião, Machado de Assis, Graciliano Ramos, João Cabral de Melo Neto, para ficar nos clássicos brasileiros. Todos fazem parte da minha constelação por muitas razões, uma delas por escrever e pensar na minha língua, não por buscar uma identidade, mas porque é a mesma matéria bruta, a mesma pedra que eu também me atrevo a tocar.
 

É difícil ser escritor no Brasil?
Andréa Del Fuego - É difícil, embora haja neste momento um boom dos escritores nacionais em seu próprio país como Itamar Vieira Junior, Jeferson Tenório, Carla Madeira, entre outros.


Dá pra viver de literatura no Brasil? 
Andréa Del Fuego - A maioria dos autores não vive das vendas dos livros, mas de trabalhos paralelos. Entre outras atividades, também trabalho dando oficinas de escrita literária, por exemplo.

O quanto para você escrever é disciplina? É mais inspiração ou transpiração? 
Andréa Del Fuego - É disciplina e compromisso, inspiração pode até atrapalhar caso ela não se configure expressiva na hora da escrita. É trabalho. 


Quanto tempo por dia você reserva para escrever?
Andréa Del Fuego - Normalmente, escrevo à tarde, quando consigo ficar sozinha.

 
Você tem um ritual para escrever? 
Andréa Del Fuego - Tenho, mas eles mudam de tempos em tempos. No momento, o ritual é traçar linhas em cadernetas, há muito não fazia isso, era sempre direto no computador. Tenho procurado a textura do papel, esse lugar mais clandestino que é o papel, no computador aquilo já é um documento. Mas não escrevo o livro em si no caderno, apenas as coordenadas.


Qual o mote que faz você ficar mais confortável para escrever?
Andréa Del Fuego - Não me sinto confortável exatamente, mas procuro uma estabilidade e sustentação da escrita. O mote pode vir de todos os lados.


Em um processo de criação, o silêncio e isolamento são primordiais para produzir conteúdo ou o barulho não lhe atrapalha? 
Andréa Del Fuego - Preciso do silêncio para mergulhar, música muitas vezes, mas a serviço do silenciamento, jamais o barulho. Porque busco um tom que não seja familiar, algo mais subterrâneo.
 

O que há de autobiográfico nos textos que escreve?
Andréa Del Fuego - Meu objetivo é sempre ultrapassar minha biografia, não ser fiel à biografia justamente para ter a experiência de aprender com o que eu escrevo.

Como começar a ler Andréa Del Fuego? 
Andréa Del Fuego - São livros tão diferentes que eu poderia ter um pseudônimo para cada livro que publiquei. Talvez começar pelo ''A Pediatra'' porque conversa com uma atualidade que pode torna-se uma espécie de crônica.


Por qual de seus livros - ou personagem - você sente mais carinho? Por quê?
Andréa Del Fuego - Meu personagem preferido é Antônio de ''Os Malaquias'', porque é meu tio-avô como ele gostaria de ser lido.


Hoje, quem é a Andréa Del Fuego por ela mesma? 
Andréa Del Fuego - Uma escritora com medo e coragem na mesma medida, mesmo que esteja certíssima de sua escolha e de sua prática.


Você pode comprar o livro "A Pediatra", de Andréa Del Fuego, lançado pela editora Companhia das Letrasneste link.

Ficha técnica
Livro: 
"A Pediatra"
Autor: 
Andréa Del Fuego
Capa: 
Elisa von Randow
Páginas: 160
Selo: Companhia das Letras
Link do livro na Amazon: https://amzn.to/3myJ9EN


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