sexta-feira, 1 de abril de 2022

.: Entrevista com Janes Rocha, autora do livro "Os Outubros de Taiguara"


Por
 Luiz Gomes Otero, jornalista e crítico cultural.

Resultado de um trabalho intenso de pesquisa e entrevistas com pessoas que conviveram com o cantor e compositor, livro resgata a rica obra musical de Taiguara.

Considerado um dos músicos mais perseguidos pela censura durante o Governo Militar, Taiguara tem sua trajetória contada nas páginas do livro “Os Outubros de Taiguara”, da editora Kuarup. Escrito pela jornalista Janes Rocha, o livro foi resultado de um trabalho intenso de pesquisa e entrevistas com pessoas que conviveram com o cantor e compositor, que faleceu precocemente em 1996, vítima de um câncer agressivo na bexiga.

É possível entender por exemplo como se deu o seu processo de formação na música, a elaboração de canções clássicas e a mudança da carreira, que havia sido iniciada interpretando canções românticas e depois seguiu uma linha poética mais crítica contra a repressão e a diretriz imposta pelo Governo Militar nos anos 70.

Essa postura aliás foi um fator que levou os censores a persegui-lo de forma implacável, a ponto de forçá-lo a um autoexílio no exterior em duas ocasiões. Em entrevista para o Resenhando.com, Janes Rocha conta como foi que surgiu a oportunidade de mergulhar na rica história de Taiguara e como se deu o processo de elaboração do livro.


Como foi que surgiu a oportunidade de escrever esse livro?
Janes Rocha - 
Foi a pedido do jornalista Alcides Ferreira, sócio da editora Kuarup, que detinha os direitos de parte da obra de Taiguara e estava preparando um relançamento de músicas. O livro é parte de um projeto de curadoria e recuperação da obra do artista. Era 2012, eu morava no Rio de Janeiro e vivia de free-lancer. Há algum tempo planejava escrever uma biografia, estudava sobre esse tema como ouvinte em uma disciplina da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Alcides me pediu, em princípio, para fazer uma pesquisa no Arquivo Nacional sobre os processos de censura ao Taiguara na época da ditadura civil-militar (1964-1985). Depois do material levantado, ele me perguntou se eu queria escrever o livro, eu topei na hora. Só prá você entender, assim como eu, Alcides é jornalista da área econômica e foi nas coberturas de economia que nos conhecemos, muitos anos atrás, ele pelo Estadão, eu pela finada Gazeta Mercantil. Ele continua nessa área, eu saí, há três anos mudei a área de cobertura, hoje sou repórter de ciência, tecnologia e meio ambiente no Jornal da Ciência, uma publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).


Qual foi o capítulo que deu mais trabalho na elaboração do livro?
Janes Rocha - 
Não tive mais ou menos trabalho com capítulos específicos. Tudo deu trabalho, a pesquisa, as entrevistas, a organização dos dados, dos documentos. Um grande desafio é encontrar as pessoas que fizeram parte do passado do biografado e convencê-los a falar, principalmente quando o personagem viveu em outra época. Mas essa é uma dificuldade típica do trabalho de pesquisadores e jornalistas. 


Durante a obra de Taiguara, quando foi que o patrulhamento da censura começou a apertar o cerco?
Janes Rocha - 
Conforme relatei no livro, enquanto era um cantor essencialmente romântico, Taiguara não foi incomodado pelo regime militar. Porém, na época dos festivais de música – entre o fim dos anos 1960, início dos 70 -, no contexto da perseguição a outros artistas, quando ele passou a questionar poeticamente a situação ou avançar em temas considerados ofensivos ao moralismo (sexo, drogas), começou a chamar a atenção dos censores do Departamento de Censura e Diversões Públicas (DCDP) da Polícia Federal.


Ao contrário de Simonal, Taiguara não chegou a ser cancelado pela classe artística. Mesmo assim acabou se afastando da mídia. Na sua opinião, por que ele não deu continuidade ao trabalho no Brasil?Janes Rocha - São dois eventos separados da vida dele: as viagens e estadias fora do Brasil e o afastamento da mídia. Taiguara, assim como outros artistas (Geraldo Vandré, Caetano, Gil e Chico Buarque), foi “forçado” a um autoexílio. Coloco entre aspas porque ele não foi preso nem torturado, mas a censura ao seu trabalho, às letras das composições e o clima de perseguição tornou o ambiente irrespirável e ele decidiu partir para a Europa. Em 1974 ele parte para a primeira temporada artística em Londres. Depois ele volta ao Brasil, lança do disco “Imyra, Tayra, Ipy, Taiguara” que foi recolhido pela censura quando já estava nas lojas. Foi um tremendo baque e ele decide partir novamente, dessa vez para a África. Quando ele volta dessa viagem, em 1977, estava bastante mudado e muito politizado. Se engajou na militância política de esquerda, se aproximou muito do Luís Carlos Prestes e ficou nove anos sem lançar discos, sem lançar novas canções, sem se apresentar, em protesto pela censura. Esse foi o motivo do afastamento da mídia. 


Qual foi a importância do maestro Gaya na evolução do Taiguara como músico e intérprete?
Janes Rocha - 
O maestro Lindolfo Gaya foi um grande companheiro e conselheiro. Esteve presente em vários trabalhos de Taiguara: orquestrou o disco “Viagem” (1970) que traz entre suas faixas um dos maiores sucessos de Taiguara, a música “Universo no Teu Corpo”, dirigiu o disco “Piano e Viola” (1972) e regeu a versão final de sua obra prima, o disco “Imyra, Tayra, Ipy, Taiguara” (1975).


"Hoje"

"Universo do Teu Corpo"

"Teu Sonho Não Acabou"



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