Por Fernando Pereira, especialista em Cultura Brasileira e é professor de Jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). Foto: Globo/Divulgação
Elza Soares é uma diva, eleita pela BBC como a "voz do milênio". A cantora morreu na última quinta-feira, 20 de janeiro e, sem dúvida alguma, deixou um grande legado na sociedade, na cultura e na música brasileira, porque ela é a síntese do Brasil social, cultural e musical.
Brasil social porque a Elza, preta e pobre, que começou nos anos 30 a carreira musical, passou por todas as dificuldades que uma mulher negra de periferia passa e deu a volta por cima. Em uma de suas primeiras aparições musicais, em um programa do Ary Barroso, estava magra e esquelética. Quando Ary Barroso perguntou "minha filha, de qual planeta você veio?", ela respondeu "eu vim do planeta fome". Essa era Elza Soares . Mulher negra, pobre, que superou as dificuldades e conquistou o seu espaço.
A cantora é a síntese do Brasil cultural porque representa tudo aquilo que é o Brasil hoje em termos de cultura, uma cultura que inclusive nos últimos anos tem sido destruída e que foi, em alguns momentos da história do Brasil, sempre atacada, mas Elza, desde o seu surgimento, segurou as pontas, mostrou para o público o que era cultura brasileira na sua essência.
Além disso, Elza Soares também é síntese da música popular brasileira porque aos 91 anos de idade nunca ficou parada no tempo. Elza passeou por todos os estilos, por todos os gêneros da música brasileira. Iniciou no samba e inventou um jeito diferente de cantá-lo, adiantando ou atrasando a tônica dentro da nota musical, dentro da melodia.
Elza Soares foi uma das percussoras do sambalanço, a mistura do samba com o rock; fez uma maneira diferente de cantar o sambalanço. Ela misturou samba com jazz, samba com hip hop, samba com rap, e ultimamente samba com o funk e a música eletrônica, por isso que aos 91 anos nunca ficou parada no tempo: acompanhou as mudanças musicais de cada tempo, o mundo girou e ela seguiu em frente.
A cantora tinha uma ancestralidade na sua voz e na sua interpretação desde "A Lata D'água na Cabeça", uma de suas primeiras músicas a estourar na rádio nos anos 30/40. Ela tinha, carregou e terá para sempre essa ancestralidade. Elza Soares viveu a luta, o amor, ressignificou a vida como mulher e como mãe (mãe sofredora, diga-se de passagem). Sua voz foi durante muitos anos o eco de todas as vozes desse Brasil tão complicado que vivemos hoje.
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