sábado, 27 de novembro de 2021

.: Crítica: "Sem Palavras" é o idioma como instrumento de contestação


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do Resenhando. Fotos: Nana Moraes.

Espetáculo que abriu a edição 2021 da Ocupação Mirada, "Sem Palavras", da Companhia Brasileira de Teatro, é, de fato, uma celebração. Apresentado no palco do Sesc Santos dentro da programação de espetáculos presenciais, "Sem Palavras" é anárquico e combativo ao mesmo tempo. Ao longo de várias esquetes que, de alguma maneira, são conectadas à realidade das pessoas que assistem, a peça teatral escancara o Brasil de hoje.

Todos os atores de "Sem Palavras", espetáculo de autoria de Marcio Abreu, tem o seu momento de brilhar. Na estreia do espetáculo em território brasileiro, depois de passar por festivais internacionais na França e Alemanha, duas figuras atraíram todos os olhares: as travestis de cabelos cor-de-rosa e loiro que, dizem, são irmãs. Gêmeas. Livres, leves, soltas, muitas vezes nuas e combativas ao longo de scarpins rosa-metálicos e botas de cano alto. São puro poder em um país que mata a comunidade LGBTQIAP+ só por serem quem são.

No espetáculo figuram todos os tipos, que vão de Jem e as Hologramas a homens frustrados com a próprias vidas e descontando a tristeza em tudo e em todos. Não é, de fato, o que acontece? O teatro do Sesc Santos, lotado, marcou a reabertura do Festival, que ano passado foi impedido de ser realizado por conta das complicações da covid-19 ao redor do mundo. Isso foi de alguma maneira uma celebração à vida, um abraço à arte, as pessoas voltando à vida normal. 

Não se pode deixar que pensar que o espetáculo "Sem Palavras" homenageia a língua portuguesa. À palavra, à pronúncia, à beleza do idioma e, com isso, não se furta a lançar mão de nudez, gritos, danças e exemplos de vida na prática. A palavra e o idioma como ofício e instrumento de contestação. A anarquia como estratégia de recomeço. Ou há algo mais disruptivo e contra o sistema e o status quo como uma travesti, de escarpin rosa metálico, recebendo, nua, os aplausos do público no final do espetáculo? 


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