Por: Mary Ellen Farias dos Santos
Com o carro
parado, ao se dar conta de que atropelou alguém, Lolita, permaneceu sem se
mover, em estado de choque, quando deixou escorrer uma lágrima pelo olho
esquerdo. Samantha, decidida e prática, rapidamente abriu a porta do carro e
correu até a mulher.
Aparentemente,
a jovem que Lolita acertou com o carro não se feriu em nada, apenas deixou um
dos calçados voar longe e nada falava. Enquanto uma e outra perguntavam se ela
estava bem, as irmãs não pensaram muito e resolveram colocar a mulher no carro
até o hospital Santa Clara. E no trajeto o silêncio fez o momento ser de total
apreensão.
As gêmeas,
nervosas, acabaram tropeçando nas palavras ao tentar explicar o que acontecera
para a recepcionista. Quando Lolita foi apontar para a mulher, logo cutuca
Samantha que também se vira, e é iniciada busca pela jovem atropelada, mas a
mulher havia simplesmente desaparecido.
Seria impossível
ter entrado direto para atendimento, uma vez que naquela noite o plantão estava
tranquilo e a situação da quase paciente não era grave -aparentemente.
* * *
Ellen e Mary
já tinham voltado para a casa dos Winsherburgs após passar a manhã no Colégio
Santa Helena. Mary e Tarissa conversavam por chamada de vídeo longe da mãe,
professora, que aproveitava o tempo de o arroz ficar pronto para o almoço entre
mãe e filha, assim começou a separar o material que iria usar no dia seguinte
de aula.
Folheou um
livro em busca de rever o conteúdo a ser trabalhado e, com os estalos da
geladeira ecoando pelo corredor, nem percebeu quando Mary chegou
sorrateiramente atrás dela, ergueu o celular com a câmera filmando tudo, em
alto e bom som e colocou para tocar a introdução de três segundos do clássico “I
feel good”, na voz de James Brown.
Ao contrário
do que esperava, Ellen não jogou algo para o alto ou gritou de susto como nos
vários vídeos que rolam pelas redes sociais. A dona Winsherburg foi certeira. Com
a mão fechada, deu um tapão na face de Mary, numa resposta rápida e impensada por
qualquer um que quer se defender do perigo.
Com o coração
acelerado, Ellen simplesmente perguntou o que fora aquilo. Mary permaneceu sem
reação a ponto de nem ter voz suficiente para responder.
A filha se
encheu de vergonha, primeiro pela audácia da brincadeira e depois por ter
ficado com uma das bochechas mais vermelhas do que um morangão. Como resultado,
somente colocou as mãos no rosto, pousando uma delas diretamente na área que
estava quente igual ao sertão nordestino.
Definitivamente,
Mary não esperava uma reação forte e precisa de Ellen. Na verdade, ficou
arrasada com aquele tapão. Sem saber lidar com a situação, abaixou a cabeça e
foi para o quarto, segurando firmemente a pedra misteriosa, quando alertou a
mãe que iria usar o notebook enquanto a comida não ficava pronta.
O pior é que o
arroz daquele almoço queimou.
Sete minutos
depois, recomposta, Ellen arrumou a louça na mesa para o almoço com a filha, sem
gritar, o que Bernardo achava muito feio. Então, para avisar Mary que estava
tudo pronto, mandou uma mensagem pelo WhatsApp.
Melhor escolha.
A filha tinha
começado a assistir o documentário “Mamãe morta e querida” que retrata o caso
macabro entre mãe e filha, Gypsy Rose e Clauddine Blanchard. Mary havia
assistido a série “The Act” e ficara estarrecida com a atitude macabra da jovem.
Acreditava que iria diminuir a raiva que ficou de Gyspy e seu plano perverso. Sem
contar que aquela história era 100% real.
Imagine se
Ellen entrasse no quarto e entendesse tudo errado?! Afinal, Ellen era o tipo de
mãe pra lá de dramática. Certamente chamaria o detetive Bira do canal Fatos
Desconhecidos.
* * *
No dia
seguinte, as gêmeas, numa pausa no trabalho, saboreavam umas delícias na Cafeteria
Dollywood. Enquanto Samantha não parava de mastigar, Lolita pesquisava na
internet. Como aquela mulher sumiu? Naquele momento, ela se sentiu igual a um
personagem na série “Supernatural”, sendo que ela assumiu o papel do irmão mais
novo, o Sam, enquanto que Samantha era perfeitamente o Dean.
Eis que Lolita
encontra uma notinha jornalística a respeito de um atropelamento, de ontem, mas
há quatro quadras de distância.
- Samantha,
olha isso!
Distraída e
mais envolvida com os lambiscos matinais, a irmã somente olhou, sem dar a
mínima atenção. Estava interessada em se dedicar ao pecado da gula.
- Samantha!
Presta atenção!, ralhou Lola com a irmã.
- A foto da
câmera de segurança... Dá para ver que é a mulher do acidente comigo, mas não é
no mesmo lugar!
Involuntariamente,
Sam arregalou os olhos e deixou um donut
que levaria a primeira mordida cair virado na mesa.
- Mana! Não é
possível isso!!
Lolita sente
um forte arrepio na espinha, mas é no olhar de Samantha que o medo maior é
representado. Quem levava tudo na brincadeira simplesmente chorou ao se dar
conta da situação:
- Será que era
uma bruxa?! Por que assim, surge do nada, é atropelada, colocamos no nosso
carro e daí evapora. Aliás, leu o livro “HEX”, de Thomas Olde Heuvelt?!
Samantha se embanana toda para falar o sobrenome até que esbraveja um “Ah!”.
Lola fecha a
cara e pede para a irmã levar a situação a sério.
- Você e a
Mary só ficam assistindo essas séries cheias de coisas do outro mundo, com
espiritinho. Mana, isso é realidade. Já não basta o som da agência funcionar
quando desligado?! E até me chamou...
Samantha fica
boquiaberta e logo retruca:
- Som ligando
sozinho?! Ah, não! Ainda chamou você?! Isso aí não é série de terror, mas de “WandaVision”!
Irritada, Lola
ameaça ir embora e fala:
- A vida não é
fantasia!
* * *
Antes de se
juntar à mãe para almoçar, Mary recebe mensagens no WhatsApp.
Olá, Mary!? Aqui é a Melinda! Podemos
conversar?!
Feels like I'm dreaming, but I'm not
sleeping
(sweet, sweet fantasy)
Fantasy
Sweet fantasy
You're my fantasy
Sweet fantasy
Sweet, sweet fantasy
Fantasy, Mariah Carey
*~~~~ Capítulo 9: "As Winsherburgs" em "Acenando Através de Uma Janela" ~~~~*
*Mary Ellen Farias dos Santos é criadora e editora do portal cultural Resenhando.com. É formada em Comunicação Social - Jornalismo, pós-graduada em Literatura, licenciada em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos e formada em Pedagogia pela Universidade Cruzeiro do Sul. Twitter: @maryellenfsm
Assista em vídeo como história ilustrada
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