Por: Mary Ellen Farias dos Santos
O incidente
com Mary no banheiro do Colégio Santa Helena virou um segredo da jovem Winsherburg
que foi guardado a sete chaves com Tarissa.
Em casa, com
Ellen, mãe de Mary, as garotas almoçaram as sobras do churrasco de domingo que
ganhou um molho extra especial acrescido a um arroz clarinho, mas salpicado de
orégano, que ainda fumegava enquanto a mãe soltava os grãos da panela e
colocava no prato das meninas. De barriguinha cheia, a dupla que era carne e
unha, deixou o material escolar para encontrar com Juliette e Íris na
lanchonete.
No trajeto,
caminhando tranquilamente pelas ruas arborizadas de São Francisco de Assis, Mary
e Tarissa aproveitaram a chance para cochichar “o tal segredinho”.
A verdade é
que Mary estava muito preocupada com a possibilidade mínima do susto seguido de
desmaio virar um gigantesco boato protagonizado por ela. Não saberia lidar com
as meninas bestinhas do 2º e 3º ano do Ensino Médio. Isso a preocupava, não as
marcas arroxeadas que tinha ganhado nos cotovelos pela queda. Se virasse alvo
de fofoca, como iria encarar todos na escola?
- Será que tem
câmeras naquele banheiro?! Amiga, não quero ser chamada de “Carrie, a
Estranha”!, confessou Mary.
- Calma! Não
estudamos em um reality show. Como teria câmera no banheiro?! Acho que nem
pode. E, a propósito, você não tem o poder da telecinesia. Ou tem?, questionou
Tarissa virando-se preocupada para Mary.
Num tom
indignado, a pequena Winsherburg retrucou imediatamente:
- É claro que
não! Adoraria ter o poder da invisibilidade ou a capa mágica do Harry Potter. Acho
que iria me cair bem... Agora, sem brincadeirinha, Tari, aquele rosto... Tudo o
que sei até agora é que aquilo não era humano.
- Ai, pode
parar com isso, Mary!, repreendeu Tarissa que logo lembrou que elas madrugaram
na live da escola quando as duas e mais
nove alunos da turma assistiram a versão estendida do clássico “O Exorcista”.
- Hum. Sabe o
que você teve? Uma resposta pela privação do sono. Eu dormi um monte, mesmo
naquela gritaria do filme. Os pulmões do padre estavam em dia, né?! A
propósito, não entendi nada. Acredita que eu acordei quando aquela menina
estava vomitando verde?! Que nojo! Fiquei pensando, colocaram em dúvida a
ingestão de vegetais. Eu acho. E você, minha amiga, relaxa!
- Será, Tatá?!
Pode ser. Vi essas coisas e dormi pouco. Ah! Sabe o que eu assisti antes? O
sexto episódio de “American Horror Stories”, Feral. Levei cada susto. E o fim da
história?!
Tarissa
manteve a carinha de confusa e preferiu silenciar para que a conversa não evoluísse
para o lado assustador da força, a ponto de garantir um pesadelo naquela noite.
Ainda mais que Mary era craque na descrição e contação de histórias de terror. Em
nome de preservar a própria paz de espírito, Tarissa comentou:
- Opa! Não
venha me contar nada do que viu nesse seriado aí. Não que eu vá assistir. Sabe
que eu não sou fã dessas histórias com coisas nojentas. Nem pense em começar a
me contar os detalhes asquerosos. Da última vez que você me contou sobre o
episódio “Baal”... #peloamor. Stop!
* * *
Não tão
distante do Colégio Santa Helena, Lolita estava sem palavras diante do
roteirista Helder Lee. Ali, em carne e osso. Era grande admiradora. Aliás, Lee
sempre foi a maior fonte de inspiração para ela que sonhava um dia roteirizar
um filme famoso. E, claro, ganhar o Oscar.
Com o ídolo da
escrita sorrindo, Lolita deixou o lado “admiradora secreta” e o cumprimentou,
tentando controlar a euforia da situação inusitada. Não que o roteirista quisesse
cerimônia, afinal era amigo de Apollo, mas Lolita ficou impactada pela situação
a ponto de não saber o que dizer. E, principalmente, o que fazer.
Samantha
desinibida, serviu um donut a Lee enquanto
Apollo esclareceu tudo.
- Signo do
destino, meu parça. Como iria imaginar que encontraria você na fila da
cafeteria daqui? Justo de São Francisco de Assis?!, questionou Apollo quebrando
o breve silêncio no ambiente.
Com uma risada
um pouco solta, Lee respondeu:
- Vim visitar
a família da minha noiva. Precisei fazer hora no Centro da cidade, de carro. Ela
está no salão de beleza. Dei uma voltinha no quarteirão e quando vi a vitrine de
guloseimas daquela loja. Não resisti.
- Olha, eu
entendo perfeitamente, comentou Samantha enquanto soltava leves risadinhas de
felicidade. Posso estar sem fome, mas se eu olhar o que a Berenice acabou de
fazer, fresquinho, exposto na vitrine... Ah! Eu automaticamente quero comer,
nem que seja um pedacinho.
Um pouco mais
calma, mas como uma sensação de medo e não receio, talvez por saber exatamente o
que estava vivendo naquele momento, Lolita propôs:
- Que tal
aproveitar a oportunidade e conhecer a agência?!
Helder Lee assentiu
com a cabeça, pois terminara de degustar o donut
e estava com o copo de refrigerante completamente vazio.
* * *
Mesmo longe,
Mary e Tarissa avistaram Juliette e Íris, no balcão do fast-food. Deram uma corridinha para antecipar o reencontro. O
quarteto era dividido em duas escolas: Mary e Tarissa no Colégio Santa Helena enquanto
que Juliette e Íris estudavam no Colégio São Bento. Elas não se viam
pessoalmente desde o ano passado, mas agora, já vacinadas e com o fim da
pandemia, puderam ser livres novamente. A conversa iria rolar mais solta sem a
tela do celular ou do computador para separar a turminha.
Após muitos
abraços e beijos, Mary, uma matraqueira que só, jogou Íris na roda.
- Amiga, como
anda de papo com o Caio?
Íris, com uma
carinha triste, respondeu:
- Sabe... Ele era
mais velho e devia estar com segundas intenções, enquanto que eu estou nas
primeiras. Fora que ele está caindo de amores mesmo é pela moto que comprou com
ajuda do paizinho dele. O Caio até me levou na garupa, parou no estacionamento
do supermercado que é super arborizado e fiquei sem entender. Eu quase
perguntei se iríamos fazer as compras do mês. E aconteceu algo bizarro: ele mandou
eu ficar ao lado dele, segurando um rebatedor de luz que ele sacou não sei de
onde. Começou a fotografar a motoca e ainda disse que seria o wallpaper dele.
Não tinha como ser diferente, todo o romance subiu no telhado.
Tarissa fez
cara de surpresa e exclamou: - Que babaca!
Mary ficou sem
reação, foi surpreendida com o rumo dessa “quase” história de amor.
Juliette, a
brincalhona do grupo, logo soltou uma pérola:
- Ok! Aceitem!
A Íris não vai mais ser a primeira daqui a se casar, ter filhos, ser uma jovem,
recatada e do lar.
Foi
automático. As meninas trocaram olhares e gargalharam.
E assim aconteceu
na próxima uma hora e meia daquele dia histórico que marcou o reencontro do
quarteto. Ao vivo e a cores. Sem WhatsApp ou por lives.
* * *
Enquanto conhecia
o espaço, Helder Lee soube da situação da agência, mas o que mais o intrigou
foi algo na parede, o famoso quadro do menino chorando, de Bruno Amadio. Prestes
a perguntar se fora presente, o telefone dele sinalizou uma ligação. O rostinho
no aparelho era conhecido: Petra.
- Com licença!
É a minha noiva!, exclamou enquanto se afastava dos primos. Helder conversava
com alguém que demonstrava bastante empolgação com a ideia de se encontrar com
ele ali.
Lolita tentou
disfarçar, inventando uma ocupação com os livros da prateleira e ouviu ele
dizer:
- Pê, tem
certeza?!
Após uma pausa
na fala do roteirista, combinou:
- Sim, gata! Espero
você!
Na sequência, Helder
quis saber onde era o banheiro da agência. Planejava avisar a todos que Petra
estava a caminho dali ao sair, mas não deu tempo. Em menos de 7 minutos, Apollo
abriu a porta e lá estava ela:
- Oi! Você...,
disse Apollo.
Petra
respondeu a saudação entrando como um furacão até soltar um sorrisinho de lado
para as gêmeas Samantha e Lolita. Antes que as duas entendessem toda a
situação, Helder falou:
- Como foi
rápida. Amor, vou apresentar você aos meus futuros sócios!
No entanto, os
primos conheciam Petra de outros Carnavais... As gêmeas que o digam!
And when the storms out
You run in the rain
Put your sword down
Dive right into the pain
Stay unfiltered and loud
You be proud of that skin full of scars
That's all I know so far
All I know so far, Pink
*~~~~ Capítulo 7: "As Winsherburgs" em "Não é fim do mundo" ~~~~*
*Mary Ellen Farias dos Santos é criadora e editora do portal cultural Resenhando.com. É formada em Comunicação Social - Jornalismo, pós-graduada em Literatura, licenciada em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos e formada em Pedagogia pela Universidade Cruzeiro do Sul. Twitter: @maryellenfsm
Assista em vídeo como história ilustrada
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