terça-feira, 24 de agosto de 2021

.: Capítulo 6: "As Winsherburgs" em "Isso é tudo o que sei até agora"


Por: Mary Ellen Farias dos Santos


O incidente com Mary no banheiro do Colégio Santa Helena virou um segredo da jovem Winsherburg que foi guardado a sete chaves com Tarissa.

Em casa, com Ellen, mãe de Mary, as garotas almoçaram as sobras do churrasco de domingo que ganhou um molho extra especial acrescido a um arroz clarinho, mas salpicado de orégano, que ainda fumegava enquanto a mãe soltava os grãos da panela e colocava no prato das meninas. De barriguinha cheia, a dupla que era carne e unha, deixou o material escolar para encontrar com Juliette e Íris na lanchonete.

No trajeto, caminhando tranquilamente pelas ruas arborizadas de São Francisco de Assis, Mary e Tarissa aproveitaram a chance para cochichar “o tal segredinho”.

A verdade é que Mary estava muito preocupada com a possibilidade mínima do susto seguido de desmaio virar um gigantesco boato protagonizado por ela. Não saberia lidar com as meninas bestinhas do 2º e 3º ano do Ensino Médio. Isso a preocupava, não as marcas arroxeadas que tinha ganhado nos cotovelos pela queda. Se virasse alvo de fofoca, como iria encarar todos na escola?

- Será que tem câmeras naquele banheiro?! Amiga, não quero ser chamada de “Carrie, a Estranha”!, confessou Mary.

- Calma! Não estudamos em um reality show. Como teria câmera no banheiro?! Acho que nem pode. E, a propósito, você não tem o poder da telecinesia. Ou tem?, questionou Tarissa virando-se preocupada para Mary.

Num tom indignado, a pequena Winsherburg retrucou imediatamente:

- É claro que não! Adoraria ter o poder da invisibilidade ou a capa mágica do Harry Potter. Acho que iria me cair bem... Agora, sem brincadeirinha, Tari, aquele rosto... Tudo o que sei até agora é que aquilo não era humano.

- Ai, pode parar com isso, Mary!, repreendeu Tarissa que logo lembrou que elas madrugaram na live da escola quando as duas e mais nove alunos da turma assistiram a versão estendida do clássico “O Exorcista”.

- Hum. Sabe o que você teve? Uma resposta pela privação do sono. Eu dormi um monte, mesmo naquela gritaria do filme. Os pulmões do padre estavam em dia, né?! A propósito, não entendi nada. Acredita que eu acordei quando aquela menina estava vomitando verde?! Que nojo! Fiquei pensando, colocaram em dúvida a ingestão de vegetais. Eu acho. E você, minha amiga, relaxa!

- Será, Tatá?! Pode ser. Vi essas coisas e dormi pouco. Ah! Sabe o que eu assisti antes? O sexto episódio de “American Horror Stories”, Feral. Levei cada susto. E o fim da história?!

Tarissa manteve a carinha de confusa e preferiu silenciar para que a conversa não evoluísse para o lado assustador da força, a ponto de garantir um pesadelo naquela noite. Ainda mais que Mary era craque na descrição e contação de histórias de terror. Em nome de preservar a própria paz de espírito, Tarissa comentou:

- Opa! Não venha me contar nada do que viu nesse seriado aí. Não que eu vá assistir. Sabe que eu não sou fã dessas histórias com coisas nojentas. Nem pense em começar a me contar os detalhes asquerosos. Da última vez que você me contou sobre o episódio “Baal”... #peloamor. Stop!

*  *  *

Não tão distante do Colégio Santa Helena, Lolita estava sem palavras diante do roteirista Helder Lee. Ali, em carne e osso. Era grande admiradora. Aliás, Lee sempre foi a maior fonte de inspiração para ela que sonhava um dia roteirizar um filme famoso. E, claro, ganhar o Oscar.

Com o ídolo da escrita sorrindo, Lolita deixou o lado “admiradora secreta” e o cumprimentou, tentando controlar a euforia da situação inusitada. Não que o roteirista quisesse cerimônia, afinal era amigo de Apollo, mas Lolita ficou impactada pela situação a ponto de não saber o que dizer. E, principalmente, o que fazer.

Samantha desinibida, serviu um donut a Lee enquanto Apollo esclareceu tudo.

- Signo do destino, meu parça. Como iria imaginar que encontraria você na fila da cafeteria daqui? Justo de São Francisco de Assis?!, questionou Apollo quebrando o breve silêncio no ambiente.

Com uma risada um pouco solta, Lee respondeu:

- Vim visitar a família da minha noiva. Precisei fazer hora no Centro da cidade, de carro. Ela está no salão de beleza. Dei uma voltinha no quarteirão e quando vi a vitrine de guloseimas daquela loja. Não resisti.

- Olha, eu entendo perfeitamente, comentou Samantha enquanto soltava leves risadinhas de felicidade. Posso estar sem fome, mas se eu olhar o que a Berenice acabou de fazer, fresquinho, exposto na vitrine... Ah! Eu automaticamente quero comer, nem que seja um pedacinho.

Um pouco mais calma, mas como uma sensação de medo e não receio, talvez por saber exatamente o que estava vivendo naquele momento, Lolita propôs:

- Que tal aproveitar a oportunidade e conhecer a agência?!

Helder Lee assentiu com a cabeça, pois terminara de degustar o donut e estava com o copo de refrigerante completamente vazio.

*  *  *

Mesmo longe, Mary e Tarissa avistaram Juliette e Íris, no balcão do fast-food. Deram uma corridinha para antecipar o reencontro. O quarteto era dividido em duas escolas: Mary e Tarissa no Colégio Santa Helena enquanto que Juliette e Íris estudavam no Colégio São Bento. Elas não se viam pessoalmente desde o ano passado, mas agora, já vacinadas e com o fim da pandemia, puderam ser livres novamente. A conversa iria rolar mais solta sem a tela do celular ou do computador para separar a turminha.

Após muitos abraços e beijos, Mary, uma matraqueira que só, jogou Íris na roda.

- Amiga, como anda de papo com o Caio?

Íris, com uma carinha triste, respondeu:

- Sabe... Ele era mais velho e devia estar com segundas intenções, enquanto que eu estou nas primeiras. Fora que ele está caindo de amores mesmo é pela moto que comprou com ajuda do paizinho dele. O Caio até me levou na garupa, parou no estacionamento do supermercado que é super arborizado e fiquei sem entender. Eu quase perguntei se iríamos fazer as compras do mês. E aconteceu algo bizarro: ele mandou eu ficar ao lado dele, segurando um rebatedor de luz que ele sacou não sei de onde. Começou a fotografar a motoca e ainda disse que seria o wallpaper dele. Não tinha como ser diferente, todo o romance subiu no telhado.

Tarissa fez cara de surpresa e exclamou: - Que babaca!

Mary ficou sem reação, foi surpreendida com o rumo dessa “quase” história de amor.

Juliette, a brincalhona do grupo, logo soltou uma pérola:

- Ok! Aceitem! A Íris não vai mais ser a primeira daqui a se casar, ter filhos, ser uma jovem, recatada e do lar.

Foi automático. As meninas trocaram olhares e gargalharam.

E assim aconteceu na próxima uma hora e meia daquele dia histórico que marcou o reencontro do quarteto. Ao vivo e a cores. Sem WhatsApp ou por lives.

 

*  *  *

Enquanto conhecia o espaço, Helder Lee soube da situação da agência, mas o que mais o intrigou foi algo na parede, o famoso quadro do menino chorando, de Bruno Amadio. Prestes a perguntar se fora presente, o telefone dele sinalizou uma ligação. O rostinho no aparelho era conhecido: Petra.

- Com licença! É a minha noiva!, exclamou enquanto se afastava dos primos. Helder conversava com alguém que demonstrava bastante empolgação com a ideia de se encontrar com ele ali.

Lolita tentou disfarçar, inventando uma ocupação com os livros da prateleira e ouviu ele dizer:

- Pê, tem certeza?!

Após uma pausa na fala do roteirista, combinou:

- Sim, gata! Espero você!

Na sequência, Helder quis saber onde era o banheiro da agência. Planejava avisar a todos que Petra estava a caminho dali ao sair, mas não deu tempo. Em menos de 7 minutos, Apollo abriu a porta e lá estava ela:

- Oi! Você..., disse Apollo.

Petra respondeu a saudação entrando como um furacão até soltar um sorrisinho de lado para as gêmeas Samantha e Lolita. Antes que as duas entendessem toda a situação, Helder falou:

- Como foi rápida. Amor, vou apresentar você aos meus futuros sócios!

No entanto, os primos conheciam Petra de outros Carnavais... As gêmeas que o digam!

 

And when the storms out

You run in the rain

Put your sword down

Dive right into the pain

Stay unfiltered and loud

You be proud of that skin full of scars

That's all I know so far

 

All I know so far, Pink 



*~~~~ Capítulo 7: "As Winsherburgs" em "Não é fim do mundo" ~~~~*


*Mary Ellen Farias dos Santos é criadora e editora do portal cultural Resenhando.com. É formada em Comunicação Social - Jornalismo, pós-graduada em Literatura, licenciada em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos e formada em Pedagogia pela Universidade Cruzeiro do Sul. Twitter: @maryellenfsm


Assista em vídeo como história ilustrada





← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comments:

Postar um comentário

Deixe-nos uma mensagem.

Tecnologia do Blogger.