terça-feira, 20 de abril de 2021

.: "Sede", de Eugene O’Neill, em versão online e gratuita da Cia. Triptal


Texto escrito em 1914 e nessa montagem com direção de André Garolli traz no elenco Camila dos Anjos, Fabrício Pietro e Diego Garcias. De 23 a 30 de abril, às 21h30, no YouTube do Centro Cultural São Paulo.  

Contemplada pelo Proac Lab 36 do Estado de São Paulo a Cia Triptal avança para nova etapa com o texto SEDE, escrito em 1914 por Eugene O’Neill, propondo agora uma encenação gravada diretamente do palco do Teatro Gamaro. No elenco estão Camila dos Anjos e Fabrício Pietro, parceria bem realizada no trabalho mais recente da companhia “Inferno, Um Interlúdio Expressionista”, de Tennessee Williams. Soma-se no palco o jovem ator Diego Garcias, convidado após audição.

O diretor André́ Garolli realizou uma investigação profunda sobre a obra de Eugene O’Neill. Dirigiu diversas peças do dramaturgo, entre elas, “Luar sobre o Caribe”, "Longa Viagem de Volta para Casa”, "Macaco Peludo", “Rumo a Cardiff” (03 indicações ao Prêmio Shell, 2006) e “Zona de Guerra” (Prêmio APCA – Melhor espetáculo teatral, 2006). Com 30 anos no comando das produções da Cia. Triptal, Garolli retoma o caminho do mar que tanto inspirou a companhia.

"Sede" foi escrita apenas dois anos após o naufrágio do Titanic, o que pode ter influenciado O’Neill a escrever uma peça dessa natureza. Um Cavalheiro, uma Bailarina e um Marinheiro estão à deriva em uma balsa sem comida e água, longe das rotas comuns de navegação, cercados por tubarões e progressivamente enlouquecendo. "Sede" é uma peça sobre a luta por um sentido de humanidade em estruturas colapsadas. Qual seria a dose precisa de humanidade para a humanidade não colapsar?  

A peça aborda em muitos aspectos a natureza humana e a filosofia dos comportamentos, e isto já́ seria material suficiente para discorrer em defesa da essencialidade deste texto, porém há́ analogias circunstanciais presentes nesta obra e que ampliam sua atualidade e as possibilidades de um amplo diálogo com o público. 

"Deve ser horrível ouvir os gritos dos que estão morrendo". "O que nós fizemos pra ter que sofrer assim?". "É como se uma desgraça após a outra acontecesse pra tornar nossa agonia mais terrível". "Para isso serviram todos os meus anos de trabalho?". "Já́ não me lembro mais dos dias". "Que criaturas dignas de pena somos nós".

Estas frases reunidas aleatoriamente estão presentes no texto escrito por O’Neill. Frases que poderiam ser ditas neste episódio recente dos nossos tempos, o surto coletivo, pandêmico, enquanto buscamos no isolamento e no distanciamento chances de sobrevivência. As certezas que sempre asseguraram nossos planos e ambições colapsaram, mas as barreiras que delimitam os territórios sociais seguem inabaláveis, definindo quem entre quem será sacrificado primeiro. Estamos todos cercados. Há um inimigo invisível, letal e oportunista a espreita. Dizem que aguarda pelos mais fracos. 

Na trama Eugene O’Neill reúne em um mesmo bote salva-vidas um homem branco vestido em traje de gala (Fabrício Pietro), uma mulher branca vestida em traje elegante de uma dançarina (Camila dos Anjos) e um homem negro vestido em seu uniforme de marinheiro (Diego Garcias). Três figuras com papéis sociais bem definidos e que semanas antes ocupavam lugares distintos no navio que naufragou.

Sem demais sobreviventes à vista estão os três à deriva, em alto mar, confinados, limitados e rodeados por tubarões. Impulsivamente, cada um resgatou do navio, em tempo, um único objeto, aquele que mais lhe representa em vida, contudo todos carecem de algo mais elementar, comida e água. Só lhes resta esperar, questionar ou desesperar. 

Para a encenação inédita o time ganhou reforço de uma equipe artística completa. Beto França, parceiro de longa data da Triptal, apostou em efeitos especiais da maquiagem para desgastar o aspecto das personagens. A figurinista Telumi Hellen, estreante na companhia, propõe em sua criação a desconstrução das castas que cada personagem simboliza.

O cenário foi criado por Júlio Dojcsar propõe o isolamento e a dificuldade   entre os náufragos. A luz é uma criação de André Garolli em parceria com Sendi Moraes e estabelece um contraponto entre realidade e ilusão. A fotografia de vídeo é de Tato Vilela e a produção de vídeo da produtora Kroon.

Em 2020. a Cia. Triptal apresentou ao público uma leitura encenada do texto "Sede", com transmissão única e ao vivo pelo Facebook e YouTube. Na ocasião o trabalho foi realizado de forma remota com cada ator em sua casa. Ao apostar em uma iluminação básica e em uma linguagem simples que priorizava o entendimento do texto, a leitura alcançou ótima aceitação com 1,8 mil visualizações nas redes.


A presença do corpo negro e o pacto da branquitude
Ao conceber "Sede", O’Neill introduz a figura de um marinheiro, mas lhe atribui outra característica que é a condição de ser um marinheiro negro. Este fato não é algo que deve passar despercebido, mas que deve ser analisado de maneira minuciosa, de forma a levantar alguns questionamentos sobre a discussão racial presente no texto.

A pesquisadora Maria Aparecida Bento, em sua tese de doutorado defendida na USP, cunhou a expressão “pacto narciso de branquitude”, um acordo silencioso entre pessoas brancas que se contratam, se premiam, se protegem.  Este pacto de branquitude está presente na peça e é o que une o Cavalheiro e a Dançarina nos seus diálogos conspiratórios contra o marinheiro.

A cumplicidade que se estabelece entre os dois faz com que encontrem o “bode expiatório” perfeito para culpabilizar o negro pela morte iminente. A discussão sobre a representatividade e o protagonismo negro é uma questão que influencia o pensamento e a produção artística atual. É um debate que tem possibilitado instrumentos para disputar a narrativa da história do modo que nos foi contada e mais do que isso criar novas.

São muitas as novas dramaturgias que surgem e colocam a figura do negro em outro lugar e sob outra perspectiva, mas existem também peças de autores consagrados, como Sede em que propicia um olhar sobre a situação estrutural do negro e que merece um estudo aprofundado. 


O autor
Eugene Gladstone O’Neill (Nova Iorque, 16 de outubro de 1888 – Boston, 27 de novembro de 1953) foi um dramaturgo anarquista e socialista estadunidense. Recebeu o Nobel de Literatura de 1936 e o Prêmio Pulitzer por várias vezes. Suas peças estão entre as primeiras a introduzir as técnicas do realismo influenciado principalmente por Anton Tchekhov, Henrik Ibsen e August Strindberg. Sua dramaturgia envolve personagens que habitam as margens da sociedade, com seu comportamento desregrado, tentando manter inalcançáveis aspirações e esperanças do "milagre norte-americano".

Tendo escrito apenas uma comédia, (Ah, Wilderness!), todas as suas peças, desenvolvem graus de tragédia pessoal e pessimismo. Sua dramaturgia influenciou reconhecidamente um importante dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues, além de uma de suas peças, "O Imperador Jones" ("The Emperor Jones"), ter sido o ponto de sua partida do Teatro Experimental do Negro de Abdias do Nascimento.


Ficha Técnica:

Ministério do Turismo, Secretaria Especial de Cultura e Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa e Cia Triptal 30 anos apresentam:


Ficha técnica
Espetáculo:
"Sede" (1914)
Autor: Eugene O’Neill
Direção artística: André Garolli
Elenco: Camila dos Anjos, Diego Garcias e Fabrício Pietro.
Voz off: Ricardo Ripa
Cenografia: Julio Dojcsar
Figurino: Telumi Hellen Yamanaka
Assistente de figurino: Mariana Morais
Visagismo e maquiagem: Beto França
Desenho de luz: André Garolli
Técnico de luz: Rodrigo Alves (Salsicha)
Técnico assistente de luz: Rafael Augusto Moreno Parra
Produção executiva: André Garolli e Fabrício Pietro
Assessoria administrativa e de produção: Maristela Bueno
Assessoria de imprensa: Morente Forte
Gerenciamento de mídias online: Carol Rossi e Fabrício Pietro
Design gráfico: Nando Medeiros
Fotografia (steel): Carla Gobbi e Catherine Gobbi
Apoio cultural: Kroon
Equipe audiovisual: Kroon - produção
Diretor de produção: Felipe Janowsky
Produtor executivo: Evandro Ragonha
Coordenadora sr. de produção: Mariana Milanez
Produtor: Bruno Sechini
Assistente de produção: Eloah Sat
Assistente de produção: Felipe Agresta (Milk)
Coordenadora de pós produção: Beatriz Hatori
Editor: Andreas Couto
Garagem filmes: suporte técnico
Diretor de fotografia: Tato Vilela
Desenho de luz: Sendi Morais
Operador de câmera: Felipe Agresta (Milk)
Operador de câmera: Arthur Machado
Técnico de som: Ivan Muniz


Greyhound media - transmissão
Diretor de transmissão:
Mário Costa Junior


Equipe Teatro Gamaro:
Conservação:
Dayane Louise Oliveira
Coordenadora: Monize Bueno
Analista de eventos PL: Thiago Cavalcante


Equipe protocolo Covid-19
Enfermeira:
Majorie Santos
Consultoria Covid-19: BioSafe
Laboratório testes Covid-19: Mendelics
Comercial Mendelics: Aline Bastos
Comercial Mendelics: Kleber Silva
Serviço de catering: Food Film
Fiscal de set – Protocolo Covid: Eloah Sat


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