domingo, 1 de setembro de 2019
.: Meio ambiente, feminismo, racismo e diversidade na Bienal do Livro do Rio
O passado da escravidão e o presente e o futuro do movimento negro reuniram escritores, ativistas, artistas, intelectuais e jornalistas em bate-papos e debates no segundo dia da Bienal do Livro do Rio.
Em uma conversa-aula na tarde deste sábado, no Café Literário, a jornalista e ativista negra Flávia Oliveira e o jornalista e escritor Laurentino Gomes falaram da trilogia que o autor está lançando na Bienal do Livro 2019, sobre a escravidão de africanos no Brasil. Em quase duas horas de uma conversa, Flávia e Laurentino tocaram em pontos dolorosos, silenciados e controversos da história da diáspora africana e da mercantilização de pessoas no Brasil.
Logo de início, o autor da trilogia 1808-1822-1889 lembrou que a escravidão está contida em narrativas do mundo todo, mas que sempre se baseou na ideia do "outro": "Por isso, dizer que africanos escravizaram africanos não faz a menor diferença, porque a África é um continente enorme, cheia de culturas. Então, africanos escravizaram africanos que representaram o outro também", analisou.
Perguntado por Flavia sobre a diferenciação que faz entre escravidão e racismo em seus livros, Laurentino lembrou: "escravidão houve em todo o mundo, mas foi no Brasil que a escravidão foi associada à cor da pele pela primeira vez".
Flávia fez uma pergunta que, em tempos de ativismo 2.0, provavelmente estava na ponta da língua de várias pessoas na plateia: "Por que um homem branco resolveu falar de escravidão?". Laurentino respondeu que a escravidão "deveria ser uma preocupação dos mais de 200 milhões de brasileiros, do contrário os brancos podem dizer 'Por que vou apoiar cotas, que é um problema do outro?'. E o fato de eu ser autor de best-sellers me coloca no palco, então tenho que usar essa visibilidade".
Já o encontro Afrofuturo, juntou as vozes da grafiteira Crica Monteiro; da pós-doutora em História Social Giovana Xavier, do Grupo de Estudos de Intelectuais Negra; da atriz e ativista Jennifer Dias (a Dandara de Malhação) e do designer Renato Cafuzo, criador do canal Nigeek, sobre cultura nerd voltada ao público negro; além de Ana Paula Lisboa, escritora de contos e poesias.
Giovana Xavier falou sobre os desafios de uma mulher negra ocupar espaços majoritariamente brancos: "Como historicamente pessoas negras podem pensar no futuro? O papel e a caneta não têm sido as ferramentas que nós usamos para projetar nosso futuro. E, ainda assim, a nossa cultura prospera!".
"Feminismos", sessão aberta por uma performance da atriz Mariana Ximenes a partir de um texto da inglesa Virginia Woolf, de 1931, "O Anjo do Lar", causou enorme frisson entre as participantes e os participantes do último Café Literário. E introduziu a temática numa relação com o racismo.
"É espantoso o caminho que o feminismo fez nesse tempo todo. Um texto de 1931, quando estamos em 2019. Eu acredito que o feminismo mexe com todos os sistemas, o econômico, o religioso... já caminhamos muito, mas há muito ainda a percorrer", destacou Heloísa Buarque de Hollanda, outra integrante da mesa.
Em um recorte racial sobre o texto da escritora inglesa, a historiadora e professora Giovana Xavier falou sobre a negação cultural às mulheres negras das palavras anjo e lar. "E nesse processo social, a maioria da população do Brasil está posta à margem de ser reconhecida como escritora, como autora", complementou.
Mais cedo, o meio ambiente esquentou a plateia. Uma das maiores lideranças indígenas do país, Ailton Krenak, criticou o fato de os homens não se sentirem parte da natureza. E avaliou que esta separação é um dos motivos de os seres humanos não respeitarem o ecossistema. Krenak participou de uma das mesas mais aguardadas pelos interessados na questão, a mesa "Meio ambiente, ambiente de todos nós", que reuniu no Café Literário as jornalistas Cristina Serra e Ana Lúcia Azevedo, que cobriram os crimes ambientais de Mariana e Brumadinho, com mediação do jornalista Emanuel Alencar, especialista em meio ambiente.
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