terça-feira, 5 de março de 2019

.: Lista de lugares assombrosos no Brasil - Roteiro de Sustos #1


Para que a literatura do horror amadurecesse no Brasil era necessário um escritor com características de evangelizador convicto e incansável, e que viesse a somar o grande cabedal do folclore e superstições brasileiras a um complexo e abundante repositório de ideias originais. 

Não por acaso, o último livro de M. R. Terci*, foi muito requisitado na 25ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo. O autor que trouxe à vida os horrores campesinos na cultuada série “O Bairro da Cripta” e redefiniu o folclore nacional com “O Mythos – O Fim do Mundo é Logo Ali”, objeto de admiração de um número cada vez maior de leitores. 

Afinal, ninguém é capaz de contemplar sem deleite e surpresa as descritivas passagens de Crônicas de Pólvora e Sangue, livro 1 da série Imperiais de Gran Abuelo, publicado em 2018 pela Editora Pandorga.

Mas de onde vem o sobrenatural verde e amarelo? Exímio conhecedor dos lugares mais perigosos e assombrosos do Brasil, Terci não poupa esforços, nem coragem, para visitar os locais mais estranhos, rincões de histórias fantásticas e lendas pavorosas, cuja reputação não decorre das respectivas tragédias, chacinas, crueldades, torturas e assassinatos, mas dos fenômenos inexplicáveis e assustadores que até hoje ainda sucedem quando o sol se põe. 

A lista a seguir foi idealizada pelo escritor. Nas palavras de Terci: “Abstraindo-se da condição de não conhecer, nenhum leitor poderá contemplar, sem assombro e enlevo, a arte e o horror que transluz nesses locais”.


Barco Fantasma – Baía de Chacororé, Pantanal, Mato Grosso: os moradores das comunidades ribeirinhas contam que no final do século XIX, um barco afundou no pantanal mato-grossense e todos os seus tripulantes e passageiros morreram afogados. Desde o ocorrido, o valente que montar vigília em noite de lua cheia na Baía de Chacororé, poderá observar, na maré vazante, o barco ressurgindo do fundo das águas lamacentas, fantasmagoricamente estivada, rangendo em uníssono com os risos e vozerio da tripulação até desaparecer, subitamente, sem deixar vestígios;


Hospital Colônia Barbacena – Barbacena, Minas Gerais: palco do descaso das autoridades, o lugar foi criado pelo governo estadual, em 1903, para oferecer assistência aos alienados. Milhares de vítimas travestidas de pacientes psiquiátricos, sucumbiram de fome, frio, diarreia, pneumonia, maus-tratos, abandono e tortura. Para lá eram enviados desafetos, homossexuais, militantes políticos, mães solteiras, alcoolistas, mendigos, pessoas sem documentos e todos os tipos de indesejados, inclusive, doentes mentais. Em média, 16 pessoas morriam por dia e seus corpos eram vendidos ou decompostos em ácido para viabilizar o comércio das ossadas com faculdades de medicina. Nos anos 1980, após a reforma antimanicomial o local passou a abrigar apenas 160 pacientes. Pacientes e funcionários da instituição dizem ouvir choro, gritos e pancadas nas paredes de celas vazias em uma ala desativada há muitos anos;


Penitenciária de Cariri – Juazeiro do Norte, Ceará: Dizem que as penas devem ser justas e adequadas ao crime. Mas e quando a punição se alonga para além da vida? Os detentos de Cariri, relatam que durante a noite é comum se ouvir lamentos e choro, gritos e vociferações enraivecidas nos corredores entre os blocos, muitas vezes, até mesmo dentro das celas. Houve quem, em meio a toda essa angústia e pavor, vivenciados comumente por todos os presos, desse cabo da própria vida por não suportar o medo. Não recomendo nem aos mais experientes estudiosos do paranormal;


O fantasma de Lampião – Mossoró, Rio Grande do Norte: Em 1927 a cidade de Mossoró vivia um período de expansionismo comercial e industrial. Mas a riqueza que circulava na cidade despertou a cobiça do mais famoso cangaceiro do Brasil. Após dias de sítio à cidade, combates acirrados e custosas perdas, o cangaceiro e seu bando foram afugentados. Para alguns moradores da região, o lendário cangaceiro jamais aceitou essa derrota e, de tempos em tempos, o bando fantasmagórico, tendo Virgulino Ferreira da Silva à sua vanguarda, é avistado cavalgando em redor dos limites do município, fazendo cerco, notadamente delimitado pelas nuvens de poeira que surgem sem que brisa alguma sopre. O cultista do estranho poderá constatar tal fenômeno apenas ao longo das madrugadas de maio;


Mercado Modelo – Salvador, Bahia: famoso em todo Brasil por seu histórico de comércio, com mais de 250 lojas, grande variedade de artigos de artesanato, lembranças e restaurantes, é também conhecido por ser cenário de hórridas narrativas. O investigador do oculto que se prestar a consultar qualquer um dos lojistas do Mercado, vai ouvir sobre seus túneis assombrados. A história oficial diz que os túneis que servem dispensa de bebidas e adega, antigamente tinham outra função. Os escravos que vinham da África eram ali trancafiados e muitos entre estes nunca mais viram a luz do dia. Há ainda gente que se perdeu por ali e nunca mais foi vista. O escrutinador do fantasmagórico nunca deve descer aos túneis sozinho;


Fantasma de Bento Gonçalvez – Triunfo, Rio Grande do Sul: a casa onde nasceu Bento Gonçalves em 1788 sempre foi cercada de mistérios e estranhos avistamentos. Após ser tombada como patrimônio histórico, tornou-se museu, onde o epicurista do macabro pode examinar todo tipo de artefato da Guerra dos Farrapos, incluindo, garruchas, revolveres, sabres, espadins e uniformes manchados de sangue. Muitas pessoas da cidade relatam que, à noite, os fantasmas dos combatentes mortos, incluindo o próprio Bento, andam pelos corredores;


Castelinho do Flamengo – Rio de Janeiro: idealizado em 1916, é mais uma construção carioca que tem muita história para contar. O atraente prédio se tornou a moradia de Avelino Fernandes, sua esposa Dona Rosalina Feu Fernandes e a sua filha Maria de Lourdes Feu Fernandes. Tudo indica que o casal Fernandes morreu em 1932, atropelados em frente à residência. Maria de Lourdes passou a ser criada por um tutor que a roubou e maltratou, deixando-a presa na torre principal da construção. Além dessa história de crime, crueldade e do assombro que o Castelinho causa em contraste com os outros prédios da região, o pesquisador atento poderá, esquivando-se dos moradores de rua da circunvizinhança, constatar que após a morte de Maria, seu fantasma voltou para assombrar o lugar em busca de vingança. Seu atormentado espírito, muitas vezes, é avistado junto às janelas baças e empoeiradas. Qualquer que seja sua vedeta, convém, entretanto, não permanecer muito no local;


Assombração da Praia dos Padres – Guarapari, Espiríto Santo: vultos estranhos e vozes advindas do além-túmulo e um estranho episódio de exorcismo são a razão da alcunha. Mesmo os turistas desavisados relatam rumores de múltiplas vozes ouvidas na praia deserta. Avistamento de sombras e fantasmas dos nativos são comuns. Não é permitido acampar na praia e a permanência de transeuntes durante a noite tem sido reprimida pelas autoridades locais. Ao pesquisador, recomendo cautela no trato com os moradores locais que são muito reticentes e demonstram certo pavor de falar sobre o assunto;


Edifício Joelma – São Paulo: cenário de uma das maiores tragédias paulistanas. Em 1º de fevereiro de 1974, um incêndio ceifou a vida de 191 pessoas, deixando outras 300 gravemente queimadas. As histórias macabras do local, com todas as suas assombrações e mitos, no entanto, remetem a antes do incêndio. Anos antes, um professor chamado Paulo Camargo assassinou sua mãe e suas irmãs, suicidando-se depois em um dos apartamentos do edifício. O investigante espectral atento, certamente perceberá que as assombrações relatadas vão além do incêndio e do múltiplo assassinato. A palavra para o local, dessa forma deixa de ser assombrado e toma contornos de amaldiçoado. Até o final do século XIX, o local onde construíram o edifício Joelma, abrigava um pelourinho que segundo consta dos anais judiciosos da Província de São Paulo, foi regado com muito, muito sangue de criminosos;


Assombração do Cemitério dos Caboclos – Maringá, Paraná: o cemitério em questão foi abandonado, há muitos anos, pela municipalidade local, de forma que observadas as devidas precauções, convém não se dirigir ao local sozinho. Os restos mortais de mestiços e índios foram sepultados no local até 1950. Comumente oferendas e outros rituais de religiões afro-brasileiras são encontrados sobre as lápides em péssimo estado, o que denota frequência noturna, portanto, cautela. Em princípio, é mais frutífero entrevistar os moradores da circunvizinhança. Os relatos falam de aparições, batuques e outros sons inexplicáveis, bem como uma estranha chuva de pedras – mineral – que vem atingindo todos os telhados dessa comunidade há muitos anos.


*M. R. Terci é escritor, roteirista e poeta.  Antes de se dedicar exclusivamente a escrita, foi advogado com especialização em Direito Militar e mestrado em Direito Internacional, Ciência Política, Economia e Relações Internacionais. Autor de "Imperiais de Gran Abuelo", publicada pela Pandorga, e o criador da série "O Bairro da Cripta", lançada anteriormente pela LP-Books, obras que reforçaram seu nome como um dos principais autores brasileiros de horror da atualidade. 

Com base em fatos históricos, Terci substitui os castelos medievais pelos casarões coloniais, as aldeias de camponeses pelas cidadezinhas do interior, os condes pelos coronéis e as superstições por elementos de nosso folclore e crendices populares, numa verdadeira transposição do gótico para a realidade brasileira. Seus livros não são apenas para os fãs do gênero horror. Seu penejar é para quem aprecia uma narrativa envolvente, centrada na experiência subjetiva dos personagens mediante as possibilidades que o contexto sobrenatural de suas estórias permite.

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