terça-feira, 2 de outubro de 2018

.: Crítica: "Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812" é adorável maluquice


Por Helder Moraes Miranda, com a colaboração de Alex Sandro Gama e Mary Ellen Farias dos Santosem outubro, de 2018.


"Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812" é uma experiência sensorial que fala com o espectador de diversas maneiras. É um espetáculo que é plantado durante a apresentação e floresce depois, de diversas maneiras, para o espectador mais atento e sensível. 

Em cartaz no espaço 033 Rooftop, do Teatro Santander, em São Paulo, é diferente de tudo o que já foi apresentado e visto no Brasil e, nos tempos sombrios que ameaçam se aproximar, é um respiro de arte, cultura e entretenimento de primeira linha, tão necessários nos dias de hoje. O musical alterna vozes, cores, músicas e talento em um espetáculo inesquecível em que todos são movidos pelo amor. É sobre personagens que, enquanto o cometa vai, não esperam a vida passar e, no fundo, só querem amar e ser amados.

Baseada nas 70 páginas do volume 2, parte 5, do romance clássico "Guerra e Paz", de Leon Tolstoi, "Natasha, Pierre e o Cometa de 1812" é a mistura de literatura, canções e genialidade. O musical questiona o que as pessoas fariam frente à possibilidade de o mundo acabar com a chegada de um cometa, que ficou visível por nove meses, começando em 1811. 

Entre essas pessoas à mercê do fim do mundo, está a romântica Natasha, em um momento de consagração na carreira de Bruna Guerin nos musicais. Segura na pele da protagonista, ela atrai todos os olhares, mesmo quando o foco não é a sua brilhante Natasha, sempre vestida de roupas claras para delinear a leveza de uma personagem tão emocional que, no fim das contas, só quer - desesperadamente e com a mesma intensidade das músicas que (en)canta - ser amada.

Essa passionalidade também fica evidente no embate entre a ótima Hélène de Carol Bezerra, cujo talento indiscutível - que pode ser visto nas temporadas anteriores de "Beatles Num Céu de Diamantes", críticas neste link e aqui - vem sendo cada vez mais recompensado com grandes papéis. 



Hélène é uma mistura de mulher vulgar, baixa, infiel, maledicente e deliciosa, características que fazem com que o talento de sua intérprete estoure no ápice da trama, quando interpreta a canção cujo delicioso refrão "Ficou vermelha, lindinha..." continua na cabeça durante muito tempo após o espetáculo. Hélene tenta convencer a doce Natasha a ter experiências nada abonadoras para as donzelas de 1812, mas que para a atualidade são mais pueris do que os dilemas de qualquer adolescentes contemporâneos.



O Pierre, no dia interpretado por Thiago Perticarrari ator substituto de André Frateschi, é um personagem à mercê da própria sorte que precisa de motivações externas para tomar atitudes na própria vida, mas não hesita em ser o personagem agente das outras histórias ao redor dele, inclusive a de Natasha - e é assim que se conhecem. A voz, o carisma, o talento e a alma com que Perticarrari defende cada canção, como se de cada nota dependesse a vida dele, fazem com que o Pierre brasileiro seja um personagem apaixonante, mesmo com toda a passividade que ele apresenta no início do espetáculo. O cometa vai transformá-lo e, de alguma forma, vai transformar o público que o assistiu.

E nessa avalanche de sensações, em que muitas vezes o espectador mais atento vai se sentir dentro do "Moulin Rouge", embora a história se passe na Rússia, há espaço para outros dois personagens masculinos fazerem a diferença. Gabriel Leone, com o seu anti-herói Anatole, meio capitão Jack Sparrow, meio womanizer do clipe de Britney Spears, mostra uma versatilidade que dificilmente veríamos na televisão - e como ele é afinado! Patrick Amstalden que interpreta o romântico Andrey, nobre militar que vai para as Guerras Napoleônicas, e o velho ranzinza o Bolkonsky, pai dele, alterna entre a personificação do Príncipe Encantado (atenção, "Cinderella, o Musical"), e de um homem caquético que destrata os outros sem qualquer cerimônia.



Entre as mulheres, a graça de Fabi Tolentino, após protagonizar "Dois Filhos de Francisco" com uma personagem densa, mostra a versatilidade da atriz e cantora como uma gata, da trupe dos bagunceiros, em mais uma participação memorável. A entrada marcante dessa personagem sacode ainda mais o ritmo insano da peça, marcada por vários ritmos, do pop à ópera e até funk carioca. 

Outro destaque é Vitor Moresco, que também dá um show com aquelas roupas coloridas e malabarismos surpreendentes que explodem ainda mais a trama. André Torquato, o Dolokhov, é pura energia dentro dessa adorável maluquice. Tudo isso em um palco planejado para abrigar este espetáculo, que leva o espectador à imersão em um grande espaço da boemia da Rússia no século XVIII.

Dirigida por Zé Henrique de Paula, o espetáculo, escrito por Dave Malloy, tem versão nacional de Fernanda Maia, que também faz a direção musical. A montagem dos Estados Unidos foi indicada a 12 categorias no Tony Awards. O espetáculo mais libertador, em tempos de guerra, para pessoas que procuram paz e refúgio na arte transformadora e transgressora. Para assistir mais de uma vez e, se for possível, sempre.



Um guia para se preparar para "Natasha, Pierre e o Grande Cometa...", por Alex Sandro Gama
Eu não li o  livro "Guerra e Paz", mas para me preparar para o  espetáculo eu assisti o filme "Guerra e Paz", de  1956, com a Audrey Hepburn e depois vi a série da BBC de 2016,  com  Lily James.

Pesquisei também sobre "O Grande Cometa", que ficou visível por nove meses, começando em 1811. 
Cheguei a verificar a distância entre Moscou e São Petersburgo, onde se passa a trama do livro, e também a distância entre Moscou e Paris para ter ideia da jornada do exército de Napoleão.

Dei uma olhada por alto  também em outra versões em séries como uma francesa e outra russa. Eu estava na véspera do espetáculo super envolvido com as personagens então, o recebi já com certa intimidade. Claro que fiquei encantado! 

Já tinha espiado várias coisas como a versão americana com Josh Groban,  um dos meus cantores favoritos. Pretendo voltar o mês que vem e novamente jantar também, pois vale super a pena. As russas que passeiam pelo salão antes da peça fazendo brindes  me  sugeriu uma bebida com vodka russa, mel e frutas, maravilhosa.


Distância percorrida pelo exercito de Napoleão


Série da BBC


Para estudar:
Literatura Fundamental - "Guerra e Paz" 


Sobre "O Grande Cometa": O grande cometa de 1811 foi um cometa visível à vista desarmada durante cerca de 260 dias. Em outubro de 1811, durante a sua fase de maior brilho, apresentava uma magnitude aparente de 0 (zero), com uma coma facilmente distinguível. Em dezembro, os segmentos da sua cauda dupla estendiam-se ao longo de 60 graus no céu, tornando-se assim, o 54º na História documentada e um dos oito que se tornaram visíveis no século XIX.


De certa maneira, este foi um cometa similar ao Hale-Bopp. Apesar de não ter passado de forma particularmente próxima nem da Terra, nem do Sol, foi considerado espetacular, fato que se deu a um núcleo extremamente grande e ativo. Foi descoberto a 25 de março de 1811 por Honoré Flaugergues a cerca de 2.7 AU do Sol, tendo Jean-Louis Pons e Franz Xaver, Baron Von Zach confirmado a sua existência em abril do mesmo ano.


As observações continuaram até junho, quando se ocultou na claridade do sol. Foi novamente visto em agosto como um objeto de 5ª magnitude. O cometa continuou a aumentar de brilho à medida em que se aproximava do periélio (em setembro) e da distância mínima à Terra (1.1 AU). Estimou-se que o seu núcleo teria entre 30 a 40 quilômetros de diâmetro e um período orbital de aproximadamente 3.757 anos (mais tarde ajustado para 3.065 anos).


O cometa esteve visível à vista desarmada durante um total de nove meses, um recorde que foi mantido até à aparição do cometa Hale-Bopp em 1996 (mais de 18 meses). Leon Tolstói, em determinada altura da narração da sua obra-prima "Guerra e Paz", descreve o personagem Pierre observando este cometa.


Serviço:
“Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812”
Temporada: Até 25 de novembro de 2018
Local: 033 Rooftop
Endereço: Complexo do Shopping JK - Av. Juscelino Kubitschek, 2041 - Itaim Bibi - SP
Horário: Sextas - 21h30 / Sábados - 16h e 21h30 / Domingos - 19h30
Classificação Etária: 12 anos.
Duração: 2h30 (com 20 minutos de intervalo)
Capacidade: 404 pessoas
Acesso para deficientes
Estacionamento: Valet R$ 35 – aceita todos os cartões de débito/crédito



*Helder Moraes Miranda escreve desde os seis anos e publicou um livro de poemas, "Fuga", aos 17. É bacharel em jornalismo e licenciado em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos, pós-graduado em Mídia, Informação e Cultura, pela USP - Universidade de São Paulo, e graduando em Pedagogia, pela Univesp - Universidade Virtual do Estado de São Paulo. Participou de várias antologias nacionais e internacionais, escreve contos, poemas e romances ainda não publicados. É editor do portal de cultura e entretenimento Resenhando.

2 comentários:

  1. O mais belo de “Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812” é que, em meio a tanta eferverscência, há muitas histórias de amor... seja familiar, de amizade ou de casal.

    Espetáculo belíssimo e inesquecível!! Esse é para assistir muitas vezes, sim!

    Sem contar que a disposição inusitada do palco, oferece diversas experiências. Maravilhoso!!

    EU RECOMENDO!!

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  2. Site maravilhoso do próprio Dave Malloy:
    http://www.davemalloy.com/listen.html

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