Autor analisa o processo de declínio do ciclo lulopetista, a partir das Jornadas de Junho de 2013, e mostra como os brasileiros se tornaram reféns da divisão da sociedade entre “nós” e “eles”
Em "Guerra de narrativas – A crise política e a luta pelo controle do imaginário", o escritor e jornalista Luciano Trigo fala sobre a disputa sem trégua que tomou conta do Brasil nos últimos anos – disputa marcada pela politização insana de todos os aspectos da vida cotidiana, que divide a sociedade entre “nós” e “eles”.
A polarização decorrente da crise que resultou no fim do ciclo do PT no poder se acirrou. Longe de ser um embate passageiro, a controvérsia em torno da queda de Dilma Rousseff foi apenas a face explicitamente política dessa guerra, que continua em outros fronts. “A esquerda associada ao PT adotou a estratégia de tentar ganhar, na narrativa, a disputa que perdeu no Legislativo, no Judiciário e nas ruas”, afirma o autor. “Isso acaba contribuindo, paradoxalmente, para o aumento do apelo do populismo de direita, porque a esquerda fica associada, no imaginário popular, ao combate à operação Lava-Jato”.
Essa guerra ainda está em curso, em meio a um clima de histeria coletiva que ultrapassa a questão partidária. Às vésperas de uma nova eleição, Luciano Trigo faz, de forma original e engenhosa, um apelo à razão, com a necessária lembrança ao leitor de que a política não é uma disputa entre o bem e o mal. Muito menos no Brasil.
Perguntas e respostas:
Por que “Guerra de narrativas”?
A polarização da sociedade em torno do processo de impeachment de Dilma Rousseff não terminou com a queda da presidente, ao contrário: ela se radicalizou. Derrotado no Legislativo, no Judiciário e nas ruas, o campo lulopetista, ao qual a esquerda teima em se associar, decidiu apostar todas as fichas na reiteração de uma narrativa própria dos acontecimentos. Ainda que seja desmentida diariamente pela realidade, é essa narrativa particular que prevalece entre intelectuais e artistas – e principalmente na universidade. Acontece que esse campo não detém mais o monopólio da fala, e a divisão da sociedade entre “nós” e “eles” passa a se voltar contra ele.
Como isso acontece?
O apoio da maioria da população aos governos do PT não era ideológico, era pragmático. Enquanto foi possível combinar as conquistas sociais dos governos Lula, que foram reais, com o crescimento econômico, a base de apoio ao PT foi preservada, tanto entre as massas quanto entre as elites. Fechavam-se os olhos à corrupção sistêmica, que era percebida como um preço baixo a pagar por esse cenário. Mas quando ficou claro que a economia estava entrando em colapso, essa base se desfez muito rapidamente, porque a continuidade do Governo Dilma já não agradava nem às elites nem aos mais pobres, que voltavam a sofrer com a inflação e o desemprego. Ao mesmo tempo, com as manifestações de 2013, uma vasta parcela da população percebeu que as ruas não tinham mais dono, deixando de se sentir constrangida ao silêncio
Por que esse processo não se repetiu com o governo Temer, que também sofre denúncias de corrupção e bate recordes de impopularidade?
É necessária uma combinação muito rara de circunstâncias para que um processo como o que levou à queda de Dilma se repita, em dois aspectos que se complementam. Primeiro, é preciso que efetivamente existam as condições políticas e jurídicas para o impeachment, o que muita gente parece não entender. Condições jurídicas existiram na época do Mensalão e em governos anteriores; mas Lula não caiu em 2005 porque não existiam as condições políticas: a economia ia bem, o presidente era popular e contava com uma ampla base de apoio parlamentar. E aí entra o segundo aspecto: o que cria as condições políticas para a queda de um presidente é a soma dos comportamentos de diferentes atores sociais: o mercado, a mídia, o Legislativo, o Judiciário e as ruas. Todos confluíram contra Dilma. Contra Temer, apenas uma parcela do Judiciário e parte da mídia – incluindo, paradoxalmente, a chamada mídia golpista – se manifestaram: a base parlamentar de Temer não se desfez; o povo não foi em massa às ruas pedir sua queda; e, mal ou bem, a estabilidade econômica, depois dos anos desastrosos de Dilma, foi recuperada: o país inverteu a rota rumo ao abismo e voltou a crescer, ainda que de forma modesta. Sem povo nas ruas, com estabilidade e econômica e com apoio da base parlamentar, nenhum governo cai, ainda que existam tecnicamente motivos para isso.
Sobre o autor: Luciano Trigo é jornalista e escritor. É autor de ensaios, poesia, ficção e livros infantis. Em 2002, foi vencedor do Prêmio José Lins do Rego da Academia Brasileira de Letras. É pai da Valentina.
Ficha técnica
Título: Guerra de narrativas
Autor: Luciano Trigo
Páginas: 276 páginas
Formato: 16 x 23 cm
Gênero: Brasil / Política e Governo
ISBN: 978-85-250-6431-8
Preço: R$ 39,90
Editora: Globo Livros
“A política não é uma disputa entre o bem e o mal. Muito menos no Brasil” - Luciano Trigo
Em "Guerra de narrativas – A crise política e a luta pelo controle do imaginário", o escritor e jornalista Luciano Trigo fala sobre a disputa sem trégua que tomou conta do Brasil nos últimos anos – disputa marcada pela politização insana de todos os aspectos da vida cotidiana, que divide a sociedade entre “nós” e “eles”.
A polarização decorrente da crise que resultou no fim do ciclo do PT no poder se acirrou. Longe de ser um embate passageiro, a controvérsia em torno da queda de Dilma Rousseff foi apenas a face explicitamente política dessa guerra, que continua em outros fronts. “A esquerda associada ao PT adotou a estratégia de tentar ganhar, na narrativa, a disputa que perdeu no Legislativo, no Judiciário e nas ruas”, afirma o autor. “Isso acaba contribuindo, paradoxalmente, para o aumento do apelo do populismo de direita, porque a esquerda fica associada, no imaginário popular, ao combate à operação Lava-Jato”.
Essa guerra ainda está em curso, em meio a um clima de histeria coletiva que ultrapassa a questão partidária. Às vésperas de uma nova eleição, Luciano Trigo faz, de forma original e engenhosa, um apelo à razão, com a necessária lembrança ao leitor de que a política não é uma disputa entre o bem e o mal. Muito menos no Brasil.
Perguntas e respostas:
Por que “Guerra de narrativas”?
A polarização da sociedade em torno do processo de impeachment de Dilma Rousseff não terminou com a queda da presidente, ao contrário: ela se radicalizou. Derrotado no Legislativo, no Judiciário e nas ruas, o campo lulopetista, ao qual a esquerda teima em se associar, decidiu apostar todas as fichas na reiteração de uma narrativa própria dos acontecimentos. Ainda que seja desmentida diariamente pela realidade, é essa narrativa particular que prevalece entre intelectuais e artistas – e principalmente na universidade. Acontece que esse campo não detém mais o monopólio da fala, e a divisão da sociedade entre “nós” e “eles” passa a se voltar contra ele.
Como isso acontece?
O apoio da maioria da população aos governos do PT não era ideológico, era pragmático. Enquanto foi possível combinar as conquistas sociais dos governos Lula, que foram reais, com o crescimento econômico, a base de apoio ao PT foi preservada, tanto entre as massas quanto entre as elites. Fechavam-se os olhos à corrupção sistêmica, que era percebida como um preço baixo a pagar por esse cenário. Mas quando ficou claro que a economia estava entrando em colapso, essa base se desfez muito rapidamente, porque a continuidade do Governo Dilma já não agradava nem às elites nem aos mais pobres, que voltavam a sofrer com a inflação e o desemprego. Ao mesmo tempo, com as manifestações de 2013, uma vasta parcela da população percebeu que as ruas não tinham mais dono, deixando de se sentir constrangida ao silêncio
Por que esse processo não se repetiu com o governo Temer, que também sofre denúncias de corrupção e bate recordes de impopularidade?
É necessária uma combinação muito rara de circunstâncias para que um processo como o que levou à queda de Dilma se repita, em dois aspectos que se complementam. Primeiro, é preciso que efetivamente existam as condições políticas e jurídicas para o impeachment, o que muita gente parece não entender. Condições jurídicas existiram na época do Mensalão e em governos anteriores; mas Lula não caiu em 2005 porque não existiam as condições políticas: a economia ia bem, o presidente era popular e contava com uma ampla base de apoio parlamentar. E aí entra o segundo aspecto: o que cria as condições políticas para a queda de um presidente é a soma dos comportamentos de diferentes atores sociais: o mercado, a mídia, o Legislativo, o Judiciário e as ruas. Todos confluíram contra Dilma. Contra Temer, apenas uma parcela do Judiciário e parte da mídia – incluindo, paradoxalmente, a chamada mídia golpista – se manifestaram: a base parlamentar de Temer não se desfez; o povo não foi em massa às ruas pedir sua queda; e, mal ou bem, a estabilidade econômica, depois dos anos desastrosos de Dilma, foi recuperada: o país inverteu a rota rumo ao abismo e voltou a crescer, ainda que de forma modesta. Sem povo nas ruas, com estabilidade e econômica e com apoio da base parlamentar, nenhum governo cai, ainda que existam tecnicamente motivos para isso.
Sobre o autor: Luciano Trigo é jornalista e escritor. É autor de ensaios, poesia, ficção e livros infantis. Em 2002, foi vencedor do Prêmio José Lins do Rego da Academia Brasileira de Letras. É pai da Valentina.
Ficha técnica
Título: Guerra de narrativas
Autor: Luciano Trigo
Páginas: 276 páginas
Formato: 16 x 23 cm
Gênero: Brasil / Política e Governo
ISBN: 978-85-250-6431-8
Preço: R$ 39,90
Editora: Globo Livros
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