Ser confiante, lutar por representatividade e transformar opinião em rima é possível aos 14 anos? Para a cantora MC Soffia, sim. Aliás, isso é tarefa desde os dez, quando escreveu o seu primeiro rap. Como uma heroína, a adolescente canta às crianças sua mensagem de resistência diante do racismo que vive e vê no mundo. De tão bem-sucedida e engajada, chegou, no ano passado, à lista anual das 100 mulheres mais inspiradoras da rede britânica BBC.
“Me sinto poderosa por fazer músicas capazes de ajudar outras meninas”, diz. Desde pequena Soffia Gomes da Rocha Gregório ouve piadas sobre o seu cabelo e, apesar da pouca idade, encara o preconceito com a mesma sabedoria de um adulto e atribui esse processo de construção à sua mãe, a produtora Kamilah Pimentel, de 33 anos. MC Soffia divide com Tábata Amaral uma das três capas da revista Glamour de abril, que liberou esse trecho da entrevista e ainda traz Carol Duarte e Tatá Werneck nas outras duas opções de capa.
Qual recado você quer deixar para a próxima geração?
A importância de ser o que quiser e ter uma referência no mundo. A representatividade de que tanto falo é você enxergar alguém que te incentive a continuar.
Isso tem tudo a ver com o nosso prêmio "Gente Que Faz" que você ganhou.
Fiquei muito feliz. É importante uma menina negra ter esse destaque. Significa que tudo que eu tenho feito faz sentido. Obrigada!
E para quem você o daria?
Para todas as meninas negras, todas as mulheres. Por tudo que a gente passa desde sempre, não é só uma que merece, né?
Qual é o seu maior poder?
A habilidade de fazer músicas capazes de ajudar outras meninas. O que faço é poderoso. Acho grandioso e me sinto uma heroína.
O melhor de ser mulher hoje é...
Aceitar a nossa própria beleza! Nós sempre fomos muito diminuídas, mas agora temos consciência da importância de ajudar uma a outra. A internet tem facilitado isso também. É só olhar para as youtubers! Elas nos ensinam sobre maquiagem para nosso tipo de pele. Parece algo simples, mas as meninas negras nunca tiveram essas referências...
Falando em youtubers, você acompanha algum canal?
Eu sigo o da Nátaly Neri (Afros e Afins) e o da Gabi (De Pretas), mas não têm muitas meninas da minha idade que falam sobre representatividade.
E o que você acha do seu recado também atingir os adultos?
Normal, sabia? Apesar de ressaltar que as músicas são para as crianças, acho bom chegar nos mais velhos. O que mais me deixa feliz é saber que estou conseguindo combater o preconceito com as minhas letras. A sensação de transformar a dor de uma pessoa em aceitação, com música, é incrível. Como pode, né?
Você se sente segura com o seu cabelo?
Por conta da sociedade que nós vivemos, foi um processo de construção. Eles nunca vão falar que o cabelo crespo é bonito e por isso eu também não gostava do meu. Eu alisava, mas também me achava horrível.
E quando isso começou a mudar?
A minha família sabia que isso poderia acontecer e me preparou com histórias sobre a nossa origem. Hoje, o cabelo cacheado está sendo exaltado entre as empresas, mas é um terreno perigoso. Eles querem falar sobre inclusão, mas não mostram a realidade do cabelo crespo...
Em fevereiro passado, você foi alvo de ataques racistas na internet. Como encarou?
Todo tipo de racismo só me fortalece: daí eu crio as minhas músicas. Me aceito e estou bem com o meu cabelo, mas não deixo de denunciar os criminosos.
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