quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

.: Getty é Scrooge em "Todo o Dinheiro do Mundo"

*Texto escrito pelo cineasta Daniel Bydlowski para o jornal A tarde


Um dos museus mais famosos de Los Angeles, o Getty Museum, apresenta uma impressionante coleção artística que conta com exposição de arte desde a Idade Média até a atualidade. Quem o visita, tem uma impressão diferente de outros museus, já que a presença de obras artísticas de tantos lugares e tempos distintos parece mais uma coleção pessoal do que uma exposição feita por curadores tradicionais. Isso acontece porque o Getty Museum é exatamente uma antiga coleção pessoal de Jean Paul Getty, considerado em 1966 pelo Guinness o homem mais rico do mundo. Com o dinheiro de sua companhia petrolífera, Getty investia na compra de artefatos importantes, especialmente da Grécia e de Roma (há quem diga que ele acreditava ser a reencarnação do imperador romano Hadrianus). Assim, muitos dos artefatos não eram originalmente destinados ao museu, mas sim a casa de Getty.

Um homem tão rico e extravagante é geralmente acompanhado por histórias peculiares e curiosas, e isso não é diferente para ele. E é a parte mais trágica de sua história que "Todo o Dinheiro do Mundo" conta. Vivendo a vida como o personagem Scrooge, do conto “Um Conto de Natal”, de Charles Dickens, Getty protege cada dólar e cada centavo de maneira agressiva, mesmo possuindo bilhões de dólares. Diferentemente deste personagem, porém, Getty dá importância a sua família, desde que estes se conformem com os seus desejos.

Assim, quando seu filho necessita de dinheiro e vai, com sua mulher e filho, para a Itália (onde Getty decidiu viver), o bilionário os acolhe. Porém, a busca por ganhos continua. Ele coloca seu neto, John, para ler cartas de pessoas implorando por dinheiro, e nega os pedidos de maneira fria e direta, mesmo quando estas pessoas o pedem por ter doenças ou outros problemas sérios. Essa forma de lidar com sua fortuna nos dá um indício do que pode acontecer se sua família agir de modo contrário ao que se espera.

Seu filho, também chamado John, interpretado por Andrew Buchan, se torna viciado e trai a mulher Gail Harris (Michelle Williams). Ela, então, decide pedir divórcio e consegue a custódia de seu pequeno filho dizendo que quer apenas isso e nenhum dinheiro. Getty não entende como a nora faz isso, e acha que ela esconde algum trunfo que ele não consegue compreender. Assim, Getty tenta se desligar tanto da nora quanto do neto.

Porém, todo este quadro fica mais complicado quando seu neto é raptado por sequestradores italianos que querem milhões de dólares para devolver o garoto para a família. E o filme se foca exatamente no modo único e excêntrico que Getty lida com a situação, sempre tentando negociar até mesmo com sua família. O personagem principal do filme, então, fica claro, é Gail, a nora de Getty que agora precisa convencer o bilionário colecionador de arte a dar o dinheiro para a família que queria esquecer.


O filme mostra tanto o lado de Getty quanto o lado de Gail, de seu neto e ainda dos sequestradores, criando uma dinâmica muito interessante em que a paixão por arte, o amor pela família e o apego ao dinheiro criam obstáculos contra a simples solução do problema. Interpretado por Christopher Plummer, o personagem Jean Paul Getty consegue incorporar todas essas paixões e conflitos em um filme em que Getty lembra Scrooge.

Daniel Bydlowski é cineasta brasileiro e artista de realidade virtual com Masters of Fine Arts pela University of Southern California e doutorando na University of California, em Santa Barbara, nos Estados Unidos. É membro do Directors Guild of America. Trabalhou ao lado de grandes nomes da indústria cinematográfica como Mark Jonathan Harris e Marsha Kinder em projetos com temas sociais importantes. Seu filme NanoEden, primeiro longa em realidade virtual em 3D, estreia em breve.

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