Em livro-reportagem, Renata Cafardo conta como teve acesso à prova roubada em 2009, revela os erros da licitação para a aplicação do exame e faz um balanço das políticas públicas da educação dos anos 90 até hoje. O lançamento será no dia 30 de outubro, uma semana antes do ENEM 2017, na Livraria da Vila Pátio Higienópolis, a partir das 19h
30 de setembro de 2009, o telefone toca na redação de O Estado de São Paulo, um dos maiores jornais do país. Um “informante” diz à jornalista Renata Cafardo ter uma cópia da prova do ENEM, que seria aplicada dali a alguns dias a milhões de estudantes de todo o país. O exame daquele ano tinha sido anunciado com pompa pelo então ministro da Educação, Fernando Haddad: ele substituiria as 55 provas de vestibulares das universidades federais do país. Renata, que era chefe de reportagem na época, conseguiu convencer a direção do jornal a marcar o encontro para tirar a história a limpo. Ela foi acompanhada do colega de redação Sergio Pompeu e dois fotógrafos. O desafio era botar a mão na prova sem ceder à chantagem do informante, que queria dinheiro para entregar o documento ao jornal.
A história de como conseguiu publicar um dos maiores furos de reportagem do jornal está contada, em detalhes, em “O roubo do ENEM”, livro que ela lança no fim de outubro, pela Record. Como jornalistas não pagam para obter informações, Renata não pôde ficar com a prova, mas conseguiu memorizar várias questões e, com elas em mente, procurou imediatamente o Ministério da Educação. A confirmação de que a prova tinha sido mesmo roubada só veio de madrugada, mas o jornal conseguiu publicar a história no dia seguinte, já com a notícia de que o ENEM seria cancelado. Os homens que roubaram a prova do ENEM chegaram a procurar outros repórteres de jornais, revistas e até de um site de notícias, mas nenhum dos veículos levou a apuração adiante.
“O livro é precioso não apenas pelo ensinamento que deixa aos estudantes e praticantes da profissão, mas, principalmente, porque retrata com confiança e precisão o papel da imprensa em sociedades democráticas. Neste livro, aprendemos que, além de fiscalizar o poder, a imprensa lança luzes que podem balizar os atos da administração pública em noites de breu, como faróis ao longe”, escreve o jornalista Eugênio Bucci no prefácio à obra.
Renata, que cobre a área de Educação há mais de 17 anos, e é uma das fundadoras da Associação de Jornalistas da Educação (JEDUCA), recheia o livro com uma boa cronologia das políticas públicas da área desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, quando começaram a surgir as primeiras avaliações de instituições educacionais no país. Ela mostra também como erros na licitação do consórcio que aplicaria a prova e na fiscalização do processo acabaram facilitando o roubo da prova. Funcionários do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas em Educação), órgão responsável pelo ENEM, chegaram a escrever notas técnicas apontando falhas de segurança na gráfica que imprimiu a prova. Mas, segundo o então presidente do órgão, Reynaldo Fernandes, ele e o ministro Haddad não tiveram acesso a essas informações.
“O Enem perdeu muita credibilidade pelo que aconteceu, algo que não foi recuperado ainda hoje, apesar de ser o maior exame do país e selecionar para centenas de universidades. A cada ano surgem notícias de pequenos vazamentos, supostos ou verdadeiros. Mas, mesmo assim, por inúmeras razões que explico no livro, ele se consolidou fortemente. Difícil saber exatamente quais seriam as consequências para o Enem se ele tivesse sido anulado depois da realização naquele ano. Mas há uma possibilidade de que o novo Enem enfraquecesse tanto que deixaria de existir em um curto espaço de tempo”, reflete Renata, em entrevista ao blog da editora.
O livro traz revelações sobre como o Ministério vem tentando aprimorar a aplicação do ENEM, seja em termos de segurança, mas também, e principalmente, na qualidade do conteúdo das provas. Para isso, o grande desafio é o banco de itens das disciplinas. O MEC costumava testar as questões em escolas particulares, mas em 2011 outro escândalo abalou a credibilidade do ENEM: na prova daquele ano, havia questões aplicadas anteriormente num teste de um colégio no Ceará, e a prova para os alunos daquela unidade escolar teve que ser cancelada. Durante a apuração para escrever o livro, Renata descobriu que o governo criou um programa de bolsas chamado “Jovens Talentos para a Ciência” para alunos que cursavam o primeiro ano das faculdades federais. A prova para conseguir a bolsa servia como teste dessas questões, a serem aplicadas depois no ENEM.
A autora, que chegou a ser ameaçada pelos homens que roubaram a prova, contou que teve medo de transformar a história em livro, mas disse que decidiu ir adiante por achar que ele pode “contribuir na formação de outros jornalistas, fazê-los refletir sobre a profissão, as relações com o governo e com as fontes, sobre o posicionamento diante de uma notícia importante”. Além disso, diz Renata, “a história do roubo do Enem ajuda a aumentar o interesse pelo jornalismo de educação. Estudantes e jornalistas percebem que é possível também fazer grandes matérias de educação, com repercussão gigantesca, premiações. Isso não está restrito ao mundo da política ou economia. Ficaria muito feliz também se o livro levasse a reflexões sobre a educação no Brasil, sobre políticas de avaliação, sobre os políticos e técnicos envolvidos na educação brasileira. Os personagens dessa história do roubo do Enem estão todos por aí, ainda atuando na educação e na política”, conclui.
O livro será lançado no dia 30 de outubro, uma semana antes do ENEM 2017.
ORELHA: Por Antônio Gois
Na última semana do mês de setembro de 2009, mais de 4 milhões de jovens brasileiros e seus familiares contavam ansiosamente os dias finais à espera do maior vestibular que seria realizado no país. O Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) fora reformulado naquele ano pelo então ministro da Educação, Fernando Haddad, e passaria a substituir processos seletivos das mais concorridas universidades federais. Era uma grande operação de guerra, e nada podia dar errado.
Porém, numa quarta-feira, 72 horas antes do primeiro dia de prova, uma bomba em forma de notícia chegou à redação do jornal O Estado de S. Paulo: a prova havia sido furtada, e estava sendo oferecida a alguns dos principais meios de comunicação.
O que aconteceu depois entrou para a história do jornalismo brasileiro. Sem ceder aos pedidos de pagamento, os repórteres Renata Cafardo e Sergio Pompeu marcaram um encontro com os criminosos, que tentavam lucrar com o material. Bastou uma rápida folheada nos papéis para que Renata, repórter especializada em educação, percebesse que não era blefe: aquela era mesmo a prova do Enem, fato que ela confirmaria com o MEC em poucas horas. No dia seguinte, o Estadão estampou em sua manchete o furo, e o exame foi cancelado.
O roubo do Enem traz os bastidores e novas revelações desse episódio. Faz também um mergulho na trajetória do exame, desde sua origem, em 1998, passando por todas as mudanças que o fizeram ganhar a dimensão gigantesca que tem até hoje. É leitura eletrizante não só para jornalistas, estudantes e professores, mas também para todos aqueles que têm prazer em conhecer uma boa história, com apuração minuciosa e contada em narrativa envolvente.
TRECHO:
“Um deles perguntou se eu estava gravando o encontro. A pedido do Estadão, eu tinha um gravador em cada bolso do casaco, ambos ligados. Respondi que não.
O moreno acreditou e abriu a pasta. Tirou um caderno cheio de folhas brancas e a fechou de novo. Notei que havia mais coisa lá dentro. Ele deixou que eu manuseasse o material e não percebeu minhas mãos trêmulas. Passei a virar página por página, com o cuidado de quem duvida do que vê. Connasel, Inep, siglas familiares. [...]
Eu ainda não tinha certeza disso, mas, na noite de 30 de setembro de 2009, havia folheado o Enem. Naquele ano, pela primeira vez, a prova tinha sido levada à posição de maior vestibular da história do país por decisão do Ministério da Educação. Seria aplicada a 4,1 milhões de estudantes em todo o Brasil, dali a três dias. Deveria estar guardada sob rigoroso sigilo.”
SOBRE A AUTORA: Renata Cafardo é jornalista e escreve sobre educação desde o ano 2000. Trabalhou durante dez anos na redação do jornal O Estado de S. Paulo e foi repórter da TV Globo por seis anos. Em 2016, fundou com colegas a Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), que tem o objetivo de melhorar a cobertura jornalística na área de educação no país. Durante o período em que morou em Nova York, em 2016-2017, fez colaborações para a Folha de S.Paulo e foi uma das jornalistas do mundo todo aprovadas para participar do Dart Center Global Reporting Institute, sobre desenvolvimento na primeira infância, da Universidade de Columbia. Já recebeu mais de dez prêmios de jornalismo. Pela matéria sobre o vazamento do Enem, ganhou o Prêmio Embratel, o Prêmio Ayrton Senna e o Prêmio Estado, e foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo.
Livro: O roubo do ENEM
Autora: Renata Cafardo
Páginas: 210
Editora: Record / Grupo Editorial Record
30 de setembro de 2009, o telefone toca na redação de O Estado de São Paulo, um dos maiores jornais do país. Um “informante” diz à jornalista Renata Cafardo ter uma cópia da prova do ENEM, que seria aplicada dali a alguns dias a milhões de estudantes de todo o país. O exame daquele ano tinha sido anunciado com pompa pelo então ministro da Educação, Fernando Haddad: ele substituiria as 55 provas de vestibulares das universidades federais do país. Renata, que era chefe de reportagem na época, conseguiu convencer a direção do jornal a marcar o encontro para tirar a história a limpo. Ela foi acompanhada do colega de redação Sergio Pompeu e dois fotógrafos. O desafio era botar a mão na prova sem ceder à chantagem do informante, que queria dinheiro para entregar o documento ao jornal.
A história de como conseguiu publicar um dos maiores furos de reportagem do jornal está contada, em detalhes, em “O roubo do ENEM”, livro que ela lança no fim de outubro, pela Record. Como jornalistas não pagam para obter informações, Renata não pôde ficar com a prova, mas conseguiu memorizar várias questões e, com elas em mente, procurou imediatamente o Ministério da Educação. A confirmação de que a prova tinha sido mesmo roubada só veio de madrugada, mas o jornal conseguiu publicar a história no dia seguinte, já com a notícia de que o ENEM seria cancelado. Os homens que roubaram a prova do ENEM chegaram a procurar outros repórteres de jornais, revistas e até de um site de notícias, mas nenhum dos veículos levou a apuração adiante.
“O livro é precioso não apenas pelo ensinamento que deixa aos estudantes e praticantes da profissão, mas, principalmente, porque retrata com confiança e precisão o papel da imprensa em sociedades democráticas. Neste livro, aprendemos que, além de fiscalizar o poder, a imprensa lança luzes que podem balizar os atos da administração pública em noites de breu, como faróis ao longe”, escreve o jornalista Eugênio Bucci no prefácio à obra.
Renata, que cobre a área de Educação há mais de 17 anos, e é uma das fundadoras da Associação de Jornalistas da Educação (JEDUCA), recheia o livro com uma boa cronologia das políticas públicas da área desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, quando começaram a surgir as primeiras avaliações de instituições educacionais no país. Ela mostra também como erros na licitação do consórcio que aplicaria a prova e na fiscalização do processo acabaram facilitando o roubo da prova. Funcionários do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas em Educação), órgão responsável pelo ENEM, chegaram a escrever notas técnicas apontando falhas de segurança na gráfica que imprimiu a prova. Mas, segundo o então presidente do órgão, Reynaldo Fernandes, ele e o ministro Haddad não tiveram acesso a essas informações.
“O Enem perdeu muita credibilidade pelo que aconteceu, algo que não foi recuperado ainda hoje, apesar de ser o maior exame do país e selecionar para centenas de universidades. A cada ano surgem notícias de pequenos vazamentos, supostos ou verdadeiros. Mas, mesmo assim, por inúmeras razões que explico no livro, ele se consolidou fortemente. Difícil saber exatamente quais seriam as consequências para o Enem se ele tivesse sido anulado depois da realização naquele ano. Mas há uma possibilidade de que o novo Enem enfraquecesse tanto que deixaria de existir em um curto espaço de tempo”, reflete Renata, em entrevista ao blog da editora.
O livro traz revelações sobre como o Ministério vem tentando aprimorar a aplicação do ENEM, seja em termos de segurança, mas também, e principalmente, na qualidade do conteúdo das provas. Para isso, o grande desafio é o banco de itens das disciplinas. O MEC costumava testar as questões em escolas particulares, mas em 2011 outro escândalo abalou a credibilidade do ENEM: na prova daquele ano, havia questões aplicadas anteriormente num teste de um colégio no Ceará, e a prova para os alunos daquela unidade escolar teve que ser cancelada. Durante a apuração para escrever o livro, Renata descobriu que o governo criou um programa de bolsas chamado “Jovens Talentos para a Ciência” para alunos que cursavam o primeiro ano das faculdades federais. A prova para conseguir a bolsa servia como teste dessas questões, a serem aplicadas depois no ENEM.
A autora, que chegou a ser ameaçada pelos homens que roubaram a prova, contou que teve medo de transformar a história em livro, mas disse que decidiu ir adiante por achar que ele pode “contribuir na formação de outros jornalistas, fazê-los refletir sobre a profissão, as relações com o governo e com as fontes, sobre o posicionamento diante de uma notícia importante”. Além disso, diz Renata, “a história do roubo do Enem ajuda a aumentar o interesse pelo jornalismo de educação. Estudantes e jornalistas percebem que é possível também fazer grandes matérias de educação, com repercussão gigantesca, premiações. Isso não está restrito ao mundo da política ou economia. Ficaria muito feliz também se o livro levasse a reflexões sobre a educação no Brasil, sobre políticas de avaliação, sobre os políticos e técnicos envolvidos na educação brasileira. Os personagens dessa história do roubo do Enem estão todos por aí, ainda atuando na educação e na política”, conclui.
O livro será lançado no dia 30 de outubro, uma semana antes do ENEM 2017.
ORELHA: Por Antônio Gois
Na última semana do mês de setembro de 2009, mais de 4 milhões de jovens brasileiros e seus familiares contavam ansiosamente os dias finais à espera do maior vestibular que seria realizado no país. O Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) fora reformulado naquele ano pelo então ministro da Educação, Fernando Haddad, e passaria a substituir processos seletivos das mais concorridas universidades federais. Era uma grande operação de guerra, e nada podia dar errado.
Porém, numa quarta-feira, 72 horas antes do primeiro dia de prova, uma bomba em forma de notícia chegou à redação do jornal O Estado de S. Paulo: a prova havia sido furtada, e estava sendo oferecida a alguns dos principais meios de comunicação.
O que aconteceu depois entrou para a história do jornalismo brasileiro. Sem ceder aos pedidos de pagamento, os repórteres Renata Cafardo e Sergio Pompeu marcaram um encontro com os criminosos, que tentavam lucrar com o material. Bastou uma rápida folheada nos papéis para que Renata, repórter especializada em educação, percebesse que não era blefe: aquela era mesmo a prova do Enem, fato que ela confirmaria com o MEC em poucas horas. No dia seguinte, o Estadão estampou em sua manchete o furo, e o exame foi cancelado.
O roubo do Enem traz os bastidores e novas revelações desse episódio. Faz também um mergulho na trajetória do exame, desde sua origem, em 1998, passando por todas as mudanças que o fizeram ganhar a dimensão gigantesca que tem até hoje. É leitura eletrizante não só para jornalistas, estudantes e professores, mas também para todos aqueles que têm prazer em conhecer uma boa história, com apuração minuciosa e contada em narrativa envolvente.
TRECHO:
“Um deles perguntou se eu estava gravando o encontro. A pedido do Estadão, eu tinha um gravador em cada bolso do casaco, ambos ligados. Respondi que não.
O moreno acreditou e abriu a pasta. Tirou um caderno cheio de folhas brancas e a fechou de novo. Notei que havia mais coisa lá dentro. Ele deixou que eu manuseasse o material e não percebeu minhas mãos trêmulas. Passei a virar página por página, com o cuidado de quem duvida do que vê. Connasel, Inep, siglas familiares. [...]
Eu ainda não tinha certeza disso, mas, na noite de 30 de setembro de 2009, havia folheado o Enem. Naquele ano, pela primeira vez, a prova tinha sido levada à posição de maior vestibular da história do país por decisão do Ministério da Educação. Seria aplicada a 4,1 milhões de estudantes em todo o Brasil, dali a três dias. Deveria estar guardada sob rigoroso sigilo.”
SOBRE A AUTORA: Renata Cafardo é jornalista e escreve sobre educação desde o ano 2000. Trabalhou durante dez anos na redação do jornal O Estado de S. Paulo e foi repórter da TV Globo por seis anos. Em 2016, fundou com colegas a Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), que tem o objetivo de melhorar a cobertura jornalística na área de educação no país. Durante o período em que morou em Nova York, em 2016-2017, fez colaborações para a Folha de S.Paulo e foi uma das jornalistas do mundo todo aprovadas para participar do Dart Center Global Reporting Institute, sobre desenvolvimento na primeira infância, da Universidade de Columbia. Já recebeu mais de dez prêmios de jornalismo. Pela matéria sobre o vazamento do Enem, ganhou o Prêmio Embratel, o Prêmio Ayrton Senna e o Prêmio Estado, e foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo.
Livro: O roubo do ENEM
Autora: Renata Cafardo
Páginas: 210
Editora: Record / Grupo Editorial Record
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