terça-feira, 20 de setembro de 2016

.: "Melancia" usa a pornografia para refletir sobre as relações humanas

A primeira montagem da Cia. Monstro trata sobre a essência do ser contemporâneo: a liquidez, colocando uma lente de aumento própria da linguagem teatral a esta característica contemporânea.

Tendo o universo pornográfico como inspiração, "Melancia" nos coloca frente a frente com uma cidade em que as relações sociais se dão de forma explícita, apenas pela lógica do consumo. Com Sol Faganello, Ana Paula Lopez, Paulo Vinicius e Victor Mendes - que também assina a direção, a montagem estreia sexta-feira, dia 30 de setembro, às 21h30 no Sesc Ipiranga e faz temporada até 30 de outubro. Dramaturgia de Carolina Bianchi, Vinicius Calderoni e Cia. Monstro.


No espetáculo, quatro artistas moram em uma cidade que vive seus piores dias numa grande crise e dividem o sonho de realizar uma obra cinematográfica de sucesso. Com seus equipamentos precários de filmagem produzem pequenos roteiros de cinema. Com pouco ou quase nenhum recurso, eles se dividem nas funções de diretor, editor, sonoplasta, produtor e atores de seus próprios filmes. Tudo o que produzem não vende.

Como tentativa de superar a crise eles buscam maneiras de se reinventar em seus trabalhos para conseguir sobreviver e ao mesmo tempo solidificar um projeto comum. Ao focar na grave crise hídrica decidem, como tema da produção, substituir água por melancia, transformando-a num grande fetiche de consumo. Com o fracasso iminente de todas as ideias, os quatro chegam a uma solução mais apelativa, a pornografia.



A fábula e realidade se misturam a todo momento durante a montagem. As funções dos artistas da ficção, em busca da criação de sua obra cinematográfica, se fundem com as dos atores em cena, criando um jogo fresco e vivo durante as cenas. A encenação ágil e efêmera reflete o dinamismo e a velocidade característicos do nosso tempo. A lógica pornográfica, onde tudo é descartável, revela nossa condição atual, sempre ligada à satisfação imediata de nossas necessidades. Tudo que busca alguma profundidade morre.

Inicialmente estimulado pelo filme “O Sabor da Melancia” de Tsai Ming Liang, a peça teve seu início dentro da universidade sob orientação de Cristiane Paoli Quito. Fora do âmbito acadêmico, o cinema continuou como elemento essencial para criação do grupo. Além da inspiração do filme japonês, agora  projeção e a presença da câmera para projeção ao vivo também integram a encenação do espetáculo.


Além do recurso audiovisual, a dança contemporânea também tem influência estética na encenação deste trabalho na medida em que as propostas de desenho no espaço se fundem com a próxima cena. Possibilitando que um solo com extrema delicadeza se desdobre numa cena coletiva com movimentos rápidos e frenéticos. Os corpos que atravessam essa peça são corpos firmes e vorazes, com a busca do desenho no espaço. A coreografia é assinada pela bailarina e atriz do espetáculo Ana Paula Lopez.

A pornografia está presente na temática e na forma do trabalho. “A lógica do consumo provoca um tipo de relação insaciável, em que observo meu objeto de desejo, almejo fortemente e me apodero para consumir e logo em seguida despertar meu desejo novamente, é próprio do mundo consumista a sensação de que nunca estamos satisfeitos”, explica Victor Mendes, ator e diretor da montagem.

Umberto Eco diz que a pornografia é a arte da ausência de elipses. "Melancia" não tem elipses. A história é contada ao passar por cada etapa, revelando as dificuldades que estão presentes no fazer teatral. “A transposição da linguagem utilizada nos filmes pornográficos é uma fonte de pesquisa para este espetáculo, Deixamos o espectador como voyer do ato teatral, sem truques ou soluções fáceis, observando os atores expostos 'nus' na sua função”, finaliza o diretor.

Assim como na hora da transa pela primeira vez, em que cada movimento é uma descoberta, tudo o que entra em cena e sai dela de cena acontece aos olhos dos espectadores, sem máscaras ou proteções, revelando os caminhos e as descobertas. Estreando seu primeiro espetáculo, a Cia Monstro aposta no dinamismo e efemeridade das cenas para falar do contemporâneo.

Espaço constante para novos grupos e autores - o espetáculo integra o projeto ‘Teatro Mínimo’, proposta programática mantida pelo Sesc Ipiranga desde 2011 e que abre espaço para novos grupos e dramaturgos.




Sobre a Cia. Monstro
A companhia reúne quatro atores formados pela Escola de Arte Dramática (USP): Ana Paula Lopez, Paulo Vinicius, Sol Faganello e Victor Mendes.Victor Mendes, ator e diretor de "Melancia", é formado também pelo Studio Beto Silveira (2005-2007), seguiu como participante da "Carpintaria do Ator", grupo de estudos coordenado pelo próprio Beto. Já estudou com Phillipe Gaulier, na França, "Doutores da Alegria", Bete Dorgam e Ésio Magalhães. Trabalhou com diversos diretores, como Cristiane Paoli Quito, Carla Candiotto, Rafael Gomes, Anna Kfouri, Isabel Teixeira e Celso Frateschi. Seus últimos trabalhos no teatro foram “Música Para Cortar Os Pulsos”, de Rafael Gomes (Premio APCA de Melhor Peça Jovem), "Não Nem Nada”, de Vinicius Calderoni, com direção do autor, “Aldeotas”, de Gero Camilo, com direção de Cristiane Paoli Quito, e “Caminham Nus Empoeirados”, de Gero Camilo, com direção do autor. Atualmente prepara também o espetáculo “Razão Social”, no qual escreve, dirige e atua ao lado de seu parceiro Gero Camilo. 

Ficha Técnica
Direção: Victor Mendes. Dramaturgia: Cia Monstro, Carolina Bianchi e Vinicius Calderoni. Organização dramatúrgica: Paulo Vinicius. Coreografia: Ana Paula Lopez. Desenho de Luz: Beto Bruel. Cenário: Cia. Monstro. Figurino: Amrita. Vídeo e foto: Sol Faganello. Pesquisa de imagens e música: Cia Monstro. Edição de fotos: Pedro Costa e Sol Faganello. Operação de luz: João Blumenschein. Operação de som e projeção: Godô. Designer: Angela Ribeiro. Produção:  Cia. Monstro. Apoio: Studio Beto Silveira. Criação e Realização: Cia. Monstro.

Serviço
"Melancia", da Cia. Monstro. Temporada: de 30 de setembro a 30 de outubro, sextas às 21h30, sábados às 19h30 e domingos às 18h30. *Não haverá espetáculo dia 2 de outubro. Local: Sesc Ipiranga. Rua Bom Pastor, 822, Ipiranga - São Paulo. Ingressos: R$20 inteira, R$10 meia e R$6 para associados do Sesc. Duração: 60 minutos. Capacidade: 30 lugares. Classificação: 18 anos.

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