sábado, 4 de junho de 2016

.: Nova edição de “Destino: poesia”, seleta dos poetas da geração 70

No ano em que Ana Cristina César é a homenageada da Festa Internacional de Paraty, a José Olympio lança nova edição de “Destino: poesia”, uma antologia que reúne obras da poeta e de outros quatro autores da chamada “Geração 70”, ou “Geração marginal”: Cacaso, Paulo Leminski, Torquato Neto e Waly Salomão. 

Organizado pelo professor Italo Moriconi, o livro é um convite ao leitor que quer conhecer ou revisitar cinco vozes, segundo ele, inauguradoras da poesia contemporânea brasileira.

Na apresentação da obra, Moriconi afirma que os cinco, que nos deixaram cedo, em épocas e por causas diversas, foram “discípulos, na literatura, do impacto produzido na cultura e no comportamento pelo advento do rock internacional e da MPB local. Também se falou deles como ‘geração mimeógrafo’, pelo caráter artesanal dos livrinhos de poesia, populares na época, vendidos pelo próprio poeta em portas de cinemas, teatros, bares. Os cinco deram respostas vivenciais e estéticas a seu tempo, regido pela lei número 1 da loucura utópica: mais vale viver 100 anos em 10, que 10 anos em 100”.

Apesar de terem reatualizado o mito do caráter aventureiro e arriscado, fatal ou trágico, de um “destino de poeta”, para Moriconi, Ana C., Cacaso, Leminski, Torquato e Salomão produziram menos uma poesia de angústia e sofrimento que de euforia e celebração, ironia e um certo desencanto.

“Na proposta de fusão entre poesia e vida, traço típico da geração 70, identificado já por sua primeira crítica e antologista, Heloísa Buarque de Hollanda, os cinco poetas aqui apresentados estiveram entre os que exploraram até o limite a inextricável e sempre misteriosa sinergia entre vida, criação e morte. Para o bem e para o mal. Deles e nosso. O bem é a poesia, presença perene. O mal é a saudade, ausência presente. Nos corações e mentes dos demais poetas e artistas surgidos nos anos 1970, ainda vivos e produtivos, chegando por agora à casa dos 60 anos de idade, Ana C.-Cacaso-Leminski-Torquato-Waly permanecem como referência. Seus versos acendem o clarão de nossa imagem da juventude fixada no tempo — efêmera, eterna”, escreve o professor.

“Destino: poesia” chega às livrarias em junho, como nova capa, fac-símiles dos manuscritos, biografias dos autores, apresentação de Italo Moriconi e bibliografia.


TRECHOS



"Noite Carioca"
(Ana Cristina César)

Diálogo de surdos, não: amistoso no frio. Atravanco na contramão. Suspiros no contrafluxo. Te apresento a mulher mais discreta do mundo: essa que não tem nenhum segredo.



"Logias e Analogias"
(Cacaso)

No Brasil a medicina vai bem
mas o doente ainda vai mal.
Qual o segredo profundo
desta ciência original?
É banal: certamente
não é o paciente
que acumula capital.



Paulo Leminski

das coisas
que eu fiz a metro
todos saberão
quantos quilômetros
são
aquelas
em centímetros
sentimentos mínimos
ímpetos infinitos
não?


LET’S PLAY THAT
(Torquato Neto)
quando eu nasci
um anjo louco muito louco
veio ler a minha mão
não era um anjo barroco
era um anjo muito louco, torto
com asas de avião
eis que esse anjo me disse
apertando a minha mão
com um sorriso entre dentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
let’s play that



GRUMARI
(Waly Salomão)

Entra mar adentro
Deixa o marulho das ondas lhe envolver
Até apagar o blá-blá-blá humano.
Maré que puxa com força, hoje.
É a lua cheia, talvez...
As retinas correm a cadeia de montanhas que circunda a praia.

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