segunda-feira, 23 de março de 2015

.: Com personagens da literatura, Cláudio Marzo incentivou a leitura

Por Helder Miranda
Em março de 2015

É possível dizer que Cláudio Marzo, que morreu no último domingo, influenciou a literatura ao longo de sua carreira, seja vivendo personagens clássicos de nossa literatura, seja participando de tramas diretamente ligadas a eles. Um feito em tanto para um ator inserido em um país que não gosta de ler, e que parou de estudar aos 17 anos, o que era comum na época de juventude da geração de 40. 


Sendo menos pessimista, Cláudio Marzo envelheceu em um país viciado em redes sociais, que lê e escreve o tempo todo na internet e, de vez em quando, é arrebatado pelo best-seller do momento. Talvez tenha sido isto, este tempo, que ele presenciou antes de morrer, já que estava internado desde o dia 4 de março, com pneumonia, e morreu aos 74 anos, às 5h39 do domingo de 22 de janeiro, na Clínica São Vicente, na Gávea, Zona Sul do Rio de Janeiro.

Antes de morrer, Cláudio Marzo passou por outras duas internações. No ano passado, em 28 de dezembro, ele foi internado no Centro de Tratamento Intensivo (CTI) com arritmia cardíaca e pneumonia. Recebeu alta no dia 31 e passou o réveillon em casa. Dia 8 de fevereiro voltou a ser internado, desta vez por um quadro infeccioso associado à insuficiência renal e, também, a um enfisema descompensado. Ele deixa a atriz Alexandra Marzo, fruto do seu casamento com a atriz Betty Faria, o filho Diogo, com a atriz Denise Dumont, e Bento, fruto do seu casamento com a atriz Xuxa Lopes.

Nascido em 26 de setembro de 1940, em São Paulo, filho de um metalúrgico e de uma dona de casa e descendente de italianos. Abandonou os estudos aos 17 anos para trabalhar como figurante na TV Paulista. Depois, foi contratado pela TV Tupi.

Tinha 25 anos quando recebeu o convite para trabalhar na emissora e, nesta época, atuava como dublador da série americana “Mr. Novac”, fazia parte do Grupo Oficina, e morava em São Paulo. Precisou se mudar para o Rio de Janeiro e assinou contrato, integrando o primeiro grupo de atores globais contratados da emissora, que inaugurou em 26 de abril de 1965. Durante muitos anos foi considerado ator do primeiro escalão da Rede Globo.

Nesta emissora, fez diversos personagens da literatura brasileira. E, como estava dublando filmes comprados pela Globo, foi escalado para uma das primeiras novelas da emissora, no horário das 19h. Era “A Moreninha”, de autoria e direção de Otávio Graça Mello, que durou 35 capítulos e foi exibida de 25 de outubro a 10 de dezembro de 1965. Na produção, uma adaptação do folhetim de mais sucesso no Brasil, assinado por João Manuel de Macedo, ele era Augusto, que se apaixonava por Carolina, interpretada por Marília Pêra. A produção se esmerou na reconstituição de época e ainda adequou diálogos à trilha sonora.

Também foi o jornalista Fernando Seixas, que abandona Aurélia (Norma Blum), uma moça pobre, para se casar com Adelaide (Fátima Freire) por causa do dote dela. O personagem é do romance “Senhora”, um sucesso de José de Alencar, assinada por Gilberto Braga, entre 30 de junho a 17 de outubro de 1975, em 80 capítulos.
 

Em 1987, Marzo protagoniza a novela "Bambolê", no horário das 18h, exibida entre 7 de setembro de 1987 a 25 de março de 1988, em 172 capítulos. Escrita por Daniel Más, com colaboração de Ana Maria Moretzsohn e direção-geral de Wolf Maya, a obra foi baseada no romance de Carolina Nabuco, "Chama e Cinzas". 

O retorno à TV Globo, em 1993, foi marcado pelo coveiro Orestes Fronteira, em "Fera Ferida", de Aguinaldo Silva, Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, com a colaboração de Márcia Prates e Flávio de Campos. A obra foi inspirada na obra de Lima Barreto, mais especificamente nos romances "Clara dos Anjos", "Recordações do Escrivão Isaías Caminha", "Triste Fim de Policarpo Quaresma", "Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá" e em personagens dos contos "Nova Califórnia" e "O Homem que Sabia Javanês". 

Em 1995, participou do remake de "Irmãos Coragem", vivendo o poderoso coronel Pedro Barros, o vilão que perseguia a família Coragem. Em 2007, fez parte do elenco da novela "Desejo Proibido", de Walther Negrão, e da minissérie "Amazônia - De Galvez a Chico Mendes", de Gloria Perez, interpretando o ex-governador do Acre Ramalho Jr. Em 2009, o último trabalho na Globo foi o seriado "Guerra e Paz", de Carlos Lombardi, interpretando o capitão Guerra. Ao todo, foram 38 novelas e seis minisséries. 

No cinema, Marzo fez 35 filmes, entre eles "O Homem Nu", dirigido por Hugo Carvana, com roteiro de Fernando Sabino, lançado em 1997. E até no cinema a literatura o persegue. "O Homem Nu" é uma comédia nacional dirigida por Hugo Carvana, com roteiro de Fernando Sabino, baseado em crônica do livro "O Homem Nu". Uma refilmagem do filme homônimo de 1968, dirigido por Roberto Santos e com Paulo José no papel principal. Na história, o escritor Sílvio Proença precisa embarcar para São Paulo, para divulgar seu novo livro. No aeroporto, encontra um grupo de velhos companheiros. 

Com o embarque cancelado devido à uma forte tempestade, o grupo segue para o apartamento de Marialva, sobrinha de um dos amigos de Proença. Seduzido pela música e pelos encantos de Marialva, Proença passa a noite ali mesmo, onde desperta no dia seguinte, completamente nu. Ainda zonzo da ressaca, vai apanhar o pão deixado à porta do apartamento; é quando o vento fecha a porta e deixa-o nu do lado de fora. Mas engana-se quem pensa que Cláudio Marzo ficou o tempo todo nu para fazer o filme. Para estas cenas, foi usado um dublê de corpo: o agrônomo Elder Aragão, na época, com 33 anos. Cláudio ficou nu apenas para fazer cenas de interiores. Mas, como o personagem passa 98% do filme em plena maratona física, foi usado um dublê para não desgastar o ator.

Fotos: Memória Globo

Cláudio Marzo e Marília Pêra em "A Moreninha", adaptação do folhetim de João Manuel de Macedo
Marzo como Fernando Seixas, ao lado de Aurélia (Norma Blum): "Senhora", de José de Alencar, adaptada por Gilberto Braga
Marzo em "Fera Ferida", novela inspirada em obras de Lima Barreto: retorno à emissora que o consagrou

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