sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

.: Análise sobre crítica literária e alguns dos vieses que a compõem

Por: Mary Ellen Farias dos Santos*
Em janeiro de 2015*


O juiz do tribunal das letras, assim pode ser definido o papel do crítico literário, aquele que lê, avalia a obra e lhe dá uma sentença, positiva ou negativa, e por fim, contribui para a propagação da obra, ou não. Na visão de alguns escritores este é um empecilho, para outros, importante colaborador para o aperfeiçoamento da escrita e até um veículo para a produção de uma nova obra como resposta ao crítico. Contudo, em meio a mal-entendidos e atritos, sabe-se o quão é necessária à função do crítico literário, ao fazer o intermediário: escritor e leitor.
 Antes de explanar o assunto, é de extrema importância saber um pouco do que é leitura, tendo em vista que esta é grande válvula propulsora da crítica literária. De acordo com o Dicionário enciclopédico Focus ilustrado, ler é ver o que está escrito, proferindo ou não, mas conhecendo as respectivas palavras, interpretar por meio da leitura. Este dado é comprovado no livro Histórias da Leitura, de Albert Manguel. A publicação mostra que, dentro da história da mentalidade, está a história da leitura.
Este processo o qual a leitura está ligada, envolve o conhecimento da linguagem e a da língua, sendo que toda leitura é plural, isto é, possibilita diferentes interpretações em um mesmo texto. Entretanto, é importante salientar que este procedimento somente ocorre devido à formação intelectual do leitor.
No Dicionário enciclopédico Focus ilustrado, literatura está classificada como “conjunto das composições de uma língua, com preocupação estética; de trabalhos literários de um país ou de uma época, os homens de letras”. (1983, p.328).
Para tanto, é válido fazer uma breve citação do filósofo Gerd Bornheim: “a crítica vive da morte da comunicação”, isto é, solicita um intérprete, principalmente ao saber que o surgimento da crítica que acontece em função da alteração do estatuto da arte, que se aprimora tornando-se mais complexa, problemática e expressiva.
Afinal, o que é crítica literária?
Esta consiste na análise de uma obra à luz de pressupostos teóricos, a fim de emitir juízos de valor. De acordo com uma leitura devidamente fundamentada, o sujeito pensante estabelece uma postura diante do que leu, tendo (cons)ciência de que este procedimento não abarca a grandeza do fenômeno literário.
É então, a partir de uma produção textual criada inicialmente pelo autor, que o crítico literário tem a possibilidade de interpretar, de julgar, de discutir, de recriar a obra, e por fim, de gerar multiplicadas visões e impressões, o que o torna um “novo autor” da mesma obra, como se ele fosse o criador do produto inicial.
Tendo em vista que a crítica é considerada como ciência e não como gênero literário, Fidelino de Figueiredo, expõe que as obras são, pois o componente de estudo do crítico literário. “O que busca ele por esse estudo? O mesmo que os outros investigadores em todas as ciências”.  (FIGUEIREDO, 1962, p. 30)
“A crítica literária tem um campo de investigações próprio [...] tem também o seu método próprio, mas não consegue formular leis, que organizem as conclusões obtidas pela prática desse método”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 40)
Com a obra criada e devidamente criticada, pode-se chegar então, no leitor. Ele que por sua vez é o epicentro de todo este processo, logo que a publicação é construída para o consumo de leitores. Neste grupo estão inclusos o público formado por leitores comuns e críticos, isto é, duplicam a ligação com o escritor e sua obra.
Por conseqüência, estes estudos, finalizam no sentido de que “os conhecimentos gerais adquiridos através dos estudos de Literatura trazem sempre para todo indivíduo novos horizontes e um anseio permanente para fugir à mediocridade”. (MEIRA, 1974, p. 13).
“Isolados ou em grupo, nós exercitamos bem cedo os sentidos, janelas abertas sobre o mundo externo, na imagem dum filósofo; interessamo-nos primeiramente pelo que nos rodeia”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 38)
Como resultado é importante ressaltar:

“A crítica não conclui o seu trabalho, logo que tenha explicado a obra; deve também avaliá-la, como obra estética, julgar, medir o seu grau de poder emocional, e, como todo o juízo implica um segundo termo de comparação, torna-se nesta altura uma questão prévia o problema da estética absoluta, do belo absoluto”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 32)

Na evasão do mediano, a função do crítico engrandece e enriquece a concepção da crítica, pois este procura conhecer em profundidade o processo de desenvolvimento da obra, a personalidade do escritor e a atmosfera cultural e social que envolvem tais elementos.
Ao problematizar a ligação visceral entre a literatura e o homem, é possível estabelecer uma diferença entre leitores, tendo em vista que a grande característica do crítico seja a eterna busca de um nível acima, diferenciando-o do leitor comum.
Em virtude desta investigação, causada anteriormente pelo inconformismo da leitura do que foi produzido por outro escritor. É então que a força da argumentação é uma ponte entre leitor comum e escritor. Com a argumentação bem conduzida, esta fundamenta hipóteses, colhe razões, analisa a realidade e não abafa ou apaga o seu objetivo, comunicar e fazer-se entender e até convencer.
Qual a diferença entre um crítico e um leitor comum, então? É certo que ambos lêem e avaliam a obra, dão o seu valor, seja positivo ou negativo, e acabam propagando a produção, no muito conhecido “boca-a-boca”, que muito colaboram na venda dos mesmos. Mas a diferença entre o leitor comum e o crítico está na necessidade cultural que o segundo tem para o público em geral: o de expor a sua leitura do intervalo da obra, pois este tem mais ciência da importância da Literatura para a formação cultural de seu povo.

“A Literatura é o fio luminoso que nos conduz a todas as terras, a todos os climas, a todos os tempos, nos desvenda os mistérios, fala-nos da glória, da guerra, da beleza e do amor. Para o espírito impregnado desse alto sentido tudo mais lhe parecerá estéril, sem energia, sem vida”. (MEIRA, 1974, p. 13)

Tendo em vista esta magia da Literatura exercida sobre o público, a necessidade de um crítico literário torna-se mais forte. Esclarecida esta necessidade, logo, percebe-se que a crítica literária desempenha o seu papel de extrema importância para o crescimento, o amadurecimento e melhor fundamentação da argumentação.

“A Literatura brasileira, pelo muito que já fizemos, é uma realidade que nos encanta e consola. E se o destino dos povos está vinculado à sua literatura nos tem legado, simples alvorecer de um futuro, que não está longe, e que há de conduzir-nos, em sua fatalidade histórica, à vanguarda de todos os povos”. (MEIRA, 1974, p. 278)

Com o valor da Literatura para a formação cultural, sabe-se também que há a leitura dos espaços brancos, os intervalos. Para destruir a idéia (fechada) de que sempre há um emissor e um receptor, criou-se a crítica literária, isto é, por meio desta, a mediadora do autor e do público, formou-se e continua a forma-se um quociente (pelo menos) mínimo de integração com a obra. Para tanto, volta-se a função do crítico literário.

“O texto está, pois entremeado de espaços brancos, de interstícios a serem preenchidos, e quem o emitiu previa que esses espaços e interstícios seriam preenchidos e os deixou brancos por duas razões. Antes de tudo, porque o texto é um mecanismo preguiçoso (ou econômico) que vive da valorização de sentido que o destinatário ali introduziu; e somente em casos de extremo formalismo, de extrema preocupação didática ou de extrema repressividade o texto se complica com redundâncias e especificações ulteriores – até o limite em que se violam as regras normais de conversação. Em segundo lugar, porque à medida que passa da função didática para a estética, o texto quer deixar ao leitor a iniciativa interpretativa, embora costume ser interpretado com uma margem suficiente de univocidade. Todo texto que alguém o ajude a funcionar”. (ECO, 1979, p. 37)

Para fazer esta máquina cheia de engrenagens trabalhar, isto é, (tentar) decifrar o enigma que envolve a Literatura, o crítico utiliza a interpretação e faz possíveis leituras de seu objeto de estudo: as obras. Em contraponto, neste processo de ler o intervalo, o crítico literário examina a linguagem e/ou forma da obra e tentar notar as perfeições e as imperfeições. Algo não muito fácil de realizar, dependendo da produção textual em estudo.

“E ler é impossível, ler integralmente, penetrar com todo o nosso mundo interior dum escritor, que já, ao construir a sua obra, lutou desesperadamente com a impotência dos seus meios de expressão, limitados e gastos por serem do uso de toda gente, delidos com as efígies das moedas há muito em curso, apáticos como lugares comuns, caixilhos de medida fixa em que se enquadra a realidade movente”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 41)

Seria então o texto algo fechado, como um quebra-cabeça que após ser resolvido não guarda a mesma ansiedade para ser concluído do que outro jamais terminado? Tudo depende do texto. Alguns sugerem interpretações e podem ser lidos de mil e uma maneiras, ou mais, ou seja, são textos abertos, enquanto que outros não.
No entanto, o escritor Umberto Eco explica bem os “textos abertos” e “textos fechados” na obra Lector in Fábula, dedicando um capítulo para o tema, sendo que na página 42 diz: “Não há nada mais aberto que um texto fechado. Só que a sua abertura é efeito de iniciativa externa, de um modo de usar o texto, e não de ser suavemente usado por ele”.
É o que ocorre com o crítico literário, deixa-se “usar” e por dedicar-se bastante a olhar a criação de outro com novo olhar, o que para ele, anteriormente, era uma obra fechada, torna-se aberta. Conquanto que o leitor comum tem dificuldades de chegar a este olhar, o texto continua fechado.
A verdade é que (para o crítico literário) “só uma coisa ele tentará com sagaz estratégia: que por maior que seja o número de interpretações possíveis, uma ecoe a outra, de modo que não se excluam, mas antes, se reforcem mutuamente”. (ECO, 1979, p. 42)
“Para o crítico a realidade é a obra literária, que por vezes tem tal autonomia, que se destaca por completo das suas razões circunstanciais para seguir uma carreira própria, através dos anos e dos séculos”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 41)
Dentro desta astúcia está o autor-modelo, citado por Umberto Eco, que é aquele que coopera com o texto com o intuito de atualizar ou preencher os vazios e os índices que o texto carrega, pois “a obra de arte usa, com quem lhe fala, a linguagem com que este pode escutá-la melhor. [...] Cabe ao intérprete interrogar a obra de modo a obter dela a resposta mais reveladora para ele, daquele seu ponto de vista”. (PAREYSON, p. 173)

“A configuração do Autor-Modelo depende de traços textuais, mas põe em jogo o universo do que está atrás do texto, atrás do destinatário e provavelmente diante do texto e do processo de cooperação (no sentido de que depende da pergunta: ‘Que quero fazer com esse texto?’)”. (ECO, 1979, p. 49).

A persona ao criar seu universo ficcional pressupõe um leitor-modelo com a competência necessária para decodificar os variados significados de seu texto, tornam-se então em estratégias discursivas nas quais o texto prevê o leitor-modelo e o autor-modelo. Resultado: ambos cooperam e desempenham seus papéis importantes e enriquecedores no processo de construção textual.
Pode-se perceber, então, que o texto estabelece o seu destinatário, pois ele é emitido por alguém que o atualiza e/ou moderniza, ou seja, o “vê” (interpreta) de outra forma, que o diferencia da visão do autor. Às vezes, esta atualização é de fato grande colaboradora para o aperfeiçoamento do texto, outras não.
Por meio das várias leituras organizadas e compatíveis, o crítico, estabelece uma ligação (autor e leitor) que seduz a ler o que não foi lido e a reler o que já foi lido. Embora tenhamos conhecimento de que são muitos os sentidos, é preciso que seja dada apenas uma definição ao que foi lido, para que desta forma o texto comunique e exponha novas idéias que colaborem para o crescimento de conhecimento e amadurecimento intelectual do leitor.
Contudo, “na leitura e na crítica, interpretação e juízo são inseparáveis, e se chega à avaliação universal da obra através da pessoalidade do gosto: e isto torna difícil a formulação e a comunicação do juízo”. (PAREYSON, p. 180)
Para ler literariamente é preciso ler o que está no intervalo (aquilo que o autor quis dizer), mas é preciso ser rápido e sagaz para entender e não deixar escapar esta possível interpretação das entrelinhas.
Contudo, há ciência de que toda crítica “deve” ser muito bem-vinda pelo criador da obra, embora não seja muito bem aceita, algumas vezes.

“O significado de uma proposição, assim como o seu interpretante não exaure a possibilidade que a proposição tem de ser desenvolvida em outras proposições e, em tal sentido, é ‘uma lei, uma regularidade de futuro indefinido’. O significado de uma proposição abrange ‘toda sua necessária e óbvia dedução’”. (ECO, 1979, p. 18)

A crítica literária tem a função de possibilitar novas leituras e releituras de um mesmo texto, é uma viagem estimulante para fruir, pensar, concordar ou contrariar, situação semelhante à de uma conversa.
A crítica literária deve se ocupar do real, do discurso, da obra, enquanto universo de palavras e formas e, sobretudo, deve analisar o exercício combinatório que o escritor desempenha.
A Literatura é vida, parte da vida, por meio das obras literárias toma-se contato com a vida, seja mesmo nas suas verdades eternas, comuns a todos os homens e lugares, porque são as verdades da mesma condição humana.
O artista literário cria e recria um universo de verdades que não são mensuráveis pelos mesmos padrões das verdades factuais. A Literatura é uma transfiguração do real, é a realidade recriada através do espírito do artista e retransmitida por meio da língua para as formas, que são os gêneros, e com os quais ela toma corpo e nova realidade.
O mesmo acontece com o ato de criticar. O caminho da crítica é o do estudo do texto, a análise da obra como criação artística. Caso não houvesse esse mediador, seria lamentável, pois haveria a ausência na comunicação. Certamente, muitas narrativas seriam simplesmente lidas e esquecidas. Sem comunicar, não teriam a oportunidade de ser motivo para discussões, leituras e releituras, que conseqüentemente resistem ao tempo e passam de geração em geração.

“Dissemos que o texto postula a cooperação do leitor como condição própria de atualização. Podemos dizer melhor que o texto é um produto cujo destino interpretativo deve fazer parte do próprio mecanismo gerativo. Gerar um texto significa executar uma estratégia de que fazem parte as previsões dos movimentos de outros – como aliás, em que qualquer estratégia”. (ECO, 1979, p. 39)

Ao ser um gênero auxiliar, a crítica literária, alcança o rigor analítico, por esse motivo sabe-se que “o interpretante não é somente o significado de um termo, mas também a conclusão de um argumento inferido das premissas”. (ECO, 1979, p. 18). Por esse motivo, é necessário ressaltar o juízo do escritor Umberto Eco de que os textos são máquinas preguiçosas que carecem da cooperação e interpretação dos leitores a todo o momento.
Desta forma, é importante tentar compreender quais são os aspectos mais relevantes que atuam durante a atividade interpretativa dos leitores. Por esse motivo, faz-se necessária uma ligação entre o texto e o leitor, pois “se não houvesse certa identidade de linguagem entre o autor e o público, não seria possível a comunicação entre um e outro”. (FIGUEIREDO, 1979, p. 41).
Partindo do pressuposto que a crítica literária é um acontecimento historicamente recente e cronologicamente localizável, isto é, em um universo em que não havia conhecimento (ciência) de indivíduo ou de subjetividade, em que tudo parecia estar submetido a uma ordem superior, houve o rompimento desta tradição por meio da modernidade.

“Foi só no fim do século XIX que se começou a discutir o problema do método científico da história literária. Até então apenas se trabalhara na investigação das causas gerais da obra artística, fazendo-se portanto estética e teoria da arte literária e não teoria do método”. (FIGUEIREDO, 1962, p. 34)

A partir do momento em que as idéias de progresso ou revolução aceleraram o ritmo das mudanças sociais, econômicas e cultural. Surge então a idéia de autoria e da obra como expressão de experiências subjetivas. É quando o que antes era comunicação de conteúdos compartilhados pelos artistas e pela comunidade passar a ser expressão estética de conteúdos inventados por um homem singular, que de seu isolamento fala para outros homens igualmente distantes da alienação.
A dessacralização da obra pelo crítico instala-se justamente nesse modo de ver aquilo que no passado nem precisava ser dito. O início da crítica literária se apóia na energia de uma devastação na própria razão de ser da evolução geral das artes, isto é, por em crise os níveis possíveis de comunicação entre a arte e o seu público; altera o curso de um momento decisivo.
O enigma inaugural da crítica se fixa neste lugar exato, ou seja, saber decifrar as ocorrências que se verificam através da alucinação dessa instância formadora de mundos, e daí deriva a criatividade da crítica, pois investigar o ato da crítica é saber inventar a si próprio.
A crítica pressupõe justamente na crise de comunicação, a ponto de esgotar o próprio tema, como que a medir a distância entre a vida e a morte, pois este fenômeno prolifera-se de inúmeras maneiras, isto é, o esplendor daquele entendimento universal desaparece, ela deixa de ser nova e se faz simplesmente antiga; desponta então um outro princípio: a impossibilidade de a arte ser expressão do fundamento, neste ponto é que está, de certa forma, a razão de ser de toda a crítica de arte.
É a atividade do crítico que implica na explicitação se faça mediada pela obra. Eis a crítica literária que tenta quebrar as barreiras e inclui um intermediário entre criador e público.
Atualmente, com a evolução temos o fenômeno tecnológico, a internet, a popularização de “novos” críticos literários vem crescendo exageradamente, o que pode ser observado no extenso número de sites e blogs voltados a resenhas críticas de livros atuais e antigos. É certo que tais produções são feitas por leitores comuns muitas vezes leigos no assunto, mas que querem expressar a sua opinião.
Por conseqüência a crítica tem como pressuposto fundamental o âmago da própria cultura ocidental, sabe-se que é grande a necessidade de questionar e opinar. Não obstante, quando as posições são invertidas, ou seja, quando o crítico literário decide publicar o seu material fictício, este, nem sempre é aclamado pelo público.
Um exemplo recente é o dos professores de literatura Davi Arriguci Jr., autor de O Rocambole e Silviano Santiago, autor de Histórias Mal Contadas, que nestes seus últimos lançamentos não tiveram o privilégio de receber elogios, pelo menos pelo crítico literário Jerônimo Teixeira, da revista Veja. “Por melhor que seja, a crítica sempre será secundária. Pode até mudar o modo de ler e interpretar uma obra literária – mas nunca poderá tomar o lugar dessa obra”.
Ao reconhecer esta premissa, Teixeira conclui seu pensamento sobre esta inversão de papéis e diz: “Talvez isso explique a tentação que alguns críticos têm de ocupar o centro do palco, produzindo eles mesmos poesia ou ficção”.
Também é de conhecimento público que muitas obras rejeitadas, posteriormente ganharam o seu valor, enquanto que muitas que agradaram o público em seu momento, ao longo dos anos, acabaram sendo esquecidas.
O mestre da literatura Machado de Assis viveu este dilema com algumas obras, como por exemplo, Helena, sendo que com Memórias Póstumas de Brás Cubas obteve o reconhecimento merecido. Hoje em dia a leitura dos dois são solicitadas para que estudantes prestem vestibular em universidades estaduais, por exemplo. Atualmente, Memórias Póstumas de Brás Cubas é a obra de Machado mais popular, apesar de contar com reflexões metalingüísticas, que criticam a linguagem e a estrutura da narrativa tradicional, além de questionar o próprio processo de criação literária.
O escritor italiano Umberto Eco, que fez muito sucesso com o romance O Nome da Rosa, no ano de 1981, não obteve o mesmo êxito de crítica e público, com os seus romances seguintes: O Pêndulo de Foucault e A Ilha do Dia Anterior. Somente em 2001, com Baudolino, que (re)conquistou o seu espaço e este (livro) foi considerado seu melhor romance desde O Nome da Rosa.
A escrita transforma, indiferente de quem quer que tenha realizado essa viagem sem volta em direção ao mundo da escrita e dos livros, a aventura de todos os leitores do mundo, sabe o poder que os textos representam em nossas vidas. O fato é que se ganha sentido, dimensão e intensidade na medida em que a leitura de textos são feitas.
Com o auxílio destas leituras, o leitor, transforma-se e amadurece ao ter uma visão de mundo que se escolhe entre linguagem, humor, estilo e vocabulário. Por esse motivo, criticar é analisar as características de uma obra literária, dar-lhe um valor de juízo, pois é o crítico aquele que “ouve” o que a obra tem a dizer e se encarrega de que este intervalo seja exposto ao público.

Enfim, o crítico ilumina ao julgar as produções literárias, abre o caminho para o leitor questionar e fazer novas leituras, pois a ciência da literatura deve estudar a literariedade, tendo em vista que o texto crítico não deve se afastar desta que análoga ao objeto de estudo, o texto crítico, compõe, num ato de semiose ilimitada, uma literatura que se reinventa. 


*Trabalho originalmente realizado para o módulo Crítica Literária, do curso de Pós-graduação em Literatura, da Universidade Católica de Santos, em 24 de julho de 2005.
* Mary Ellen é editora do site cultural www.resenhando.com. É jornalista, professora e roteirista. Twitter: @maryellenfsm



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