segunda-feira, 19 de novembro de 2007

.: O livro mais triste do mundo e a identificação alheia


Por Helder Moraes Miranda, editor do ResenhandoEm novembro de 2007.

Quer saber mais? Fernanda Young está de volta às prateleiras com o livro mais ousado de sua carreira.


Pessoas lidam com a dor de diferentes formas. Algumas, se vestem com a melhor roupa para se atirarem na frente do primeiro carro. Outras, abafam gritos no travesseiro. Umas, menos intensas, simplesmente choram. Essas lavam almofadas com lágrimas ou se trancam em qualquer banheiro público, dispostas a esconder o choro do olhar alheio e, ao sair dali, fingirem que está tudo bem. Nunca está, e a nova protagonista de Fernanda Young, no romance "Tudo que Você Não Soube" – lançado pela Ediouro no final de setembro – exterioriza isso de forma inusitada: tenta matar a mãe a marteladas.

Pela primeira vez um livro traz uma narrativa de Fernanda Young em primeira pessoa. O romance gira em torno das desventuras, em ordem não-cronológica, de uma personagem homônima que resolve contar tudo ao pai em um livro escrito para ele, porque não se falam há anos. Uma mulher que sempre reage: tentando martelar a mãe bruaca, se envolvendo com uma mulher na cadeia, se casando com um homem que na verdade representava uma tábua de salvação, tendo filhos com ele e, por fim, escrevendo um livro que remexe em feridas abertas. Tudo em busca da felicidade, ou de objetivos que possam transformar a vida em algo menos amargo.

Explicitamente, a personagem é uma carente. Como todos nós, que vivemos e morremos em busca da aprovação de olhares alheios. O que choca não é a tentativa de assassinato de uma mãe por meio de um martelo, é a maneira evidente de como cada um reage a dor. É um livro truncado, duro, que mostra uma escritora amadurecida, mas nem por isso menos intensa. Não chega a ser o melhor livro de Fernanda Young, mas está acima da média porque é escrito com uma verdade dificilmente identificada nos lançamentos que surgem nas prateleiras das livrarias. Se "O Efeito Urano" é o livro mais provocativo de Fernanda Young, "Tudo que Você Não Soube" é o mais ousado até agora.

Este lançamento também tem o mérito de comprovar uma característica que vem se firmando com a evolução a cada romance: Fernanda escreve como homem, característica que não tem qualquer conotação machista. Explico, ela não é mulher de escrever literatura feminina. Não afirmo, com isso, que homens têm textos melhores que as mulheres, ou que escritoras que produzem a rotulada “literatura feminina” são inferiores. O que quero dizer é que tem fôlego para escrever, de uma tacada só, coisas que fogem da ternura, sem que perca o lirismo.

Integra e honesta, seja em suas respostas durante as entrevistas, seja em seus livros sempre aguardados por um público cativo, ela se reinventa a cada livro. Relações entre pais e filhos nunca foram as melhores, desde que o mundo é mundo, e exteriorizar a raiva é sempre uma maneira de dizer que se está vivo e não ceder a hipocrisia que nos rodeia. "Tudo que Você Não Soube" é um livro que mostra que não estamos sós com nossa raiva, embora cada frustração seja única e compartilhá-las com alguém seja impossível. Não estamos sozinhos na dor, mas estamos. Entende?


Livro: "Tudo que Você Não Soube"
Autora: Fernanda Young
134 páginas
Ano: 2007
Editora: Ediouro

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