quinta-feira, 17 de maio de 2007

.: Resenha de "Contos", de Machado de Assis

Por: Mary Ellen Farias dos Santos

Em maio de 2007


O veneno que gera prazer intenso. O sarcasmo da humanidade narrado com ironia pelo grande mestre da literatura brasileira.


Não importa a quantidade de personagens, mas a infinita qualidade. O forte de seus contos está no cenário e nas atitudes destas personagens. Refiro-me a "Contos", de Machado de Assis, obra de grande valor para os iniciantes e amantes da literatura. A publicação da Editora Paulus traz os contos O Enfermeiro, A causa secreta, A cartomante, Missa do Galo, Um apólogo, Teoria do medalhão, O caso da vara e O alienista, no total de 112 páginas. Há também uma breve apresentação do autor nas páginas iniciais: "Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 1839, na cidade do Rio de Janeiro, e aí morreu em 1908. De origem humilde, trabalhou como tipógrafo e revisor, passando depois a colaborar na imprensa carioca, vindo a tornar-se um dos mais importantes escritores da nossa literatura, escrevendo romances, contos, poesias, crônicas, crítica literária e peças de teatro".

É claro que há muito mais sobre este formidável autor, digo no verdadeiro sentido da palavra isto é, formidável "que causa pavor; muito bom (popular)". Como assim? Simples. A literatura de Machado nestes contos é requintada e traz um toque aprofundado de malícia. Um bom exemplo é encontrado em "O Enfermeiro", com personagens podem fazer e dizer o que bem entendem, há um misto de prazer cruel no Coronel (ferir o outro de formas possíveis e diversificadas), enquanto que Procópio José Gomes Valongo traz à tona o prazer da vingança.

O insuportável e estúrdio coronel, de tão  exigente, não era suportado pelos outros, até mesmo por seus amigos. Eis que entra em cena Procópio, assim chamado pelo paciente impaciente (o coronel). Juntos, ele vivem setes dias em "lua-de-mel".

"No oitavo dia, entrei na vida dos meus predecessores, uma vida de cão, não dormir, não pensar em mais nada, recolher injúrias e, às vezes, rir delas, com um ar de resignação e conformidade; reparei que era um modo de lhe fazer corte. Tudo impertinência da moléstia e do temperamento. A moléstia era um rosário delas, padecia de aneurisma, de reumatismo e de três ou quatro afecções menores. Tinha perto de sessenta anos, e desde os cinco toda a gente lhe fazia a vontade. Se fosse só rabugento, vá; mas ele era também mau, deleitava-se com a dor e humilhação dos outros. No fim de três meses estava farto de o aturar".

Nesta relação de "amor e ódio" há um estopim o sujeito-narrador esgana o coronel durante uma briga e... passa por maus bocados. Em contraponto, tanta dedicação foi merecedora de recompensa. "Assim, por um ironia da sorte, os bens do coronel vinham parar às minhas mãos. Cogitei em recusar a herança. Parecia-me odioso receber um vintém do tal espólio; era pior do que fazer-me esbirro alugado".

Contos com uma narrativa inteligente e de finais surpreendentes, que podem ser lidos e relidos por infinitas vezes. Não deixe esta leitura para depois!


Livro: Contos

Autor: Machado de Assis

112 páginas

Ano: 2005

Coleção: Nossa Literatura

Editora: Paulus

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