"Qualquer imagem, qualquer coisa que apareça, sempre vai beber na fonte da literatura". – Leonardo de Moraes
Por: Helder Moraes Miranda
Em maio de 2006
Leonardo de Moraes fala sobre literatura, roteiros e porque a teledramaturgia precisa se renovar. Conheça o autor de "A Caixa de Confeitos & Contos Sortidos"!
Ele sempre gostou de ler, mas o caminho para chegar à literatura não foi direto. Antes, ele desenhava, talvez o percurso escolhido antes de se aventurar, e sair vencedor, no mundo das letras. Assim pode ser definido nosso entrevistado do mês, Leonardo de Moraes, escritor que estréia com o brilhante "A Caixa de Confeitos & Contos Sortidos", publicado pela editora Manole e composto, em sua maioria, de contos retirados do blog http://ragazzodifamiglia.blogspot.com.
O personagem em questão agrega diversas atividades: é professor universitário, advogado, integrante da assessoria especial do atual Governador de São Paulo, Claudio Lembo, e moderador de uma das maiores listas de discussão sobre roteiros de televisão do Brasil -o GRTV - GRUPO ROTEIROS PARA TELEVISÃO, que atualmente conta com quase 500 membros.
Moraes figura ao lado de outros advogados que rumaram pra o caminho das artes, como a escritora Lygia Fagundes Telles, os atores Paulo Autran e Raul Cortez, além do diretor teatral José Celso Martinez.
Para o Resenhando, o "X" da questão era saber como um advogado poderia desempenhar tão bem o papel de escritor de ficção, e ainda flertar com a arte de escrever roteiro. "A Carreira do Direito te dá uma visão muito ampla da sociedade. Você aprende muito do bom senso, e tem uma visão muito ampla da sociedade. Conclusão: você lê muito, tem de redigir muito, ter um bom português, esforçar sua capacidade de expressão. Se você tem um pouquinho de criatividade, para virar escritor é um pulo", explicou. Saboreie agora a entrevista, como se cada pergunta fosse um confeito sortido, e cada resposta o prazer que a glicose é capaz de proporcionar.
RESENHANDO - O que o livro "Caixa de Confeitos & Contos Sortidos" tem do Leonardo?
LEONARDO DE MORAES - Absolutamente tudo, principalmente pelo senso de humor. Talvez tenha muito mais o Leonardo nos contos sortidos do que na própria "A Caixa de Confeitos", uma história de ação que tem um ritmo vertiginoso. Tudo que está lá tem um pouco meu: referências, lembranças, associações. Não tem como negar: faz parte dos meus pensamentos, do meu imaginário.
RESENHANDO - Você acha que a produção literária é autobiográfica?
LEONARDO DE MORAES - Sim e não. Você não precisa experimentar absolutamente todo tipo de vivência para poder escrever sobre ela. Na verdade, um dos pré-requisitos básicos de você ser escritor é ter capacidade de observação. Por exemplo, no próprio livro, um dos contos, "Sangue Pardo", tem como protagonistas pessoas de meia-idade com senso de humor próprio, brincadeiras da idade. Quer dizer, estou com 28 anos: é mais capacidade de observação do que propriamente vivência, ou autobiografia.
RESENHANDO - Com o lançamento de seu primeiro livro, as pessoas começam a cobrar um romance. O que nos pode adiantar sobre isto?
LEONARDO DE MORAES - Na verdade tenho vários projetos ao mesmo tempo, mas dificilmente toco um só. Não conseguiria fazer isto, porque as idéias vão brotando, independentemente do projeto. Às vezes estou parado e vem alguma coisa que pode agregar a uma história. Tenho um projeto de romance que é uma história de amor que se passa na Roma Antiga, um estilo totalmente diferente, fiz pesquisa, tem muito de mitologia. Já escrevi um terço desse livro, mas ele está meio guardadinho, porque não adianta você tentar iniciar uma carreira literária com algo muito denso, pesado. E tem um outro projeto que é mais ou menos no mesmo estilo de "Caixa de Confeitos", gira em torno de um casal de falsificadores de arte que são envolvidos em uma trama internacional e tem que fazer uma determinada coisa pra conseguir se livrar dessa perseguição, mas vão se enrolar cada vez mais. Já está metade escrito.
RESENHANDO - No conto "Tudo culpa da filosofia" você escreve que depois dos 50 as pessoas deveriam ser proibidas de beijar de língua. Que história é essa?
LEONARDO - Na verdade, quem sempre falou isto foi minha mãe, que está com 63 anos. Ela costuma falar que acha muito feio gente muito mais velha ficar beijando exageradamente, até quando vê telenovela fica tirando sarro, falando: "ai, que absurdo!". Foi uma piada, na verdade o humor normalmente nasce de um preconceito, de uma gracinha.
RESENHANDO - O que de sua personalidade reflete no temperamento das personagens?
LEONARDO - O que é mais claro em minha personalidade é um pouco da ironia, do sarcasmo, das tiradas e da capacidade de rir das coisas mais medíocres. Aliás, todas as pessoas que me conhecem a fundo e lêem o livro falam que dão risada porque parece que sou eu que faço muitos dos comentários.
RESENHANDO - Você tem algum ritual na hora de criar? Como é seu processo criativo?
LEONARDO - Nenhum tipo de ritual. Só dois contos de "Caixa de Confeitos" foram escritos especialmente para o livro, "Sangue Pardo" e "Dona Catarina", os outros foram publicados no blog e foram escritos de forma bem espontânea, na verdade até contrariei muitas das recomendações que se dá a um autor novato, que é planejar a história. "A Caixa de Confeitos" foi escrito de forma bem intuitiva. Comecei o primeiro capítulo sem ter a mínima idéia de como a história iria terminar. E como ela foi escrita ao longo de dois meses e meio no blog, muita gente foi acompanhando, algumas sugestões eu incorporei. Talvez hoje em dia eu já não consiga fazer essa forma intuitiva que, aliás, nem acho recomendável.
RESENHANDO - A experiência de escrever para você é mais transpiração ou inspiração?
LEONARDO - Mais transpiração na medida em que você tem de se predispor. Eu, pelo menos, estabeleci um horário para escrever, que iria publicar em meu blog as segundas, quartas e sextas. Então, todo domingo, terça e quinta à noite lá estava eu escrevendo. E tinha de fazer, publicar. A transpiração está neste sentido da disciplina. A partir do momento que me predispus, que ficava diante da tela em branco, lógico, entra um pouco de inspiração, enfim, das associações livres que a gente faz até conseguir formar uma história interessante.
RESENHANDO - O que faz você querer escrever mais, e o que trava seu processo criativo?
LEONARDO - A crítica sempre pode impulsionar pra frente, ou para trás. A vontade de escrever é a vontade de criar em si, e isto não tem explicação. Criar é uma coisa um tanto quanto inata. Acho que todo mundo tem, em maior ou menor grau. No meu caso, ou eu escrevia, ou ia ficar louco, porque é um numero muito grande de personagens quem vêm na cabeça, em falas, em situações. E uma imaginação muito exagerada tinha de ser "desovada" em algum lugar. Agora, em relação a me frear, só a opinião de algumas pessoas bem próximas talvez tenha força de me paralisar durante alguns instantes.
RESENHANDO - Como você lida com críticas? Quando você postava no blog, qualquer um poderia criticar o que estava escrito. Como é isto?
LEONARDO - Lidar com crítica nunca é bom. Mente quem diz que acha o máximo ser criticado. Na verdade, é gostoso ser criticado só quando você sabe que a pessoa que está critica tem capacidade e uma vivência na frente. Agora, muitas vezes as pessoas criticam por pura e simples inveja. Se você não gosta da crítica invejosa, a pessoa diz: "Ah, não aceita levar críticas", e ainda fala que você é orgulhoso! Quanto ao blog, eu praticamente só recebia críticas positivas. Ninguém entra em um blog, ou vai perder tempo fazendo críticas, se não gostar dele.
RESENHANDO - Você é moderador de uma das maiores listas de discussão sobre roteiros de televisão do Brasil -o GRTV. Qual o objetivo deste grupo?
LEONARDO - Criar uma espécie de porto seguro para o roteirista perdido, náufrago na Internet. Lá a gente consegue reunir muito material de estudo. Também é voltado para aquele que já tem algum conhecimento, e capacidade de ser autodidata. Serve como um intensivo pra entrada no mercado de roteiros. Você encontra sinopses de telenovelas, seriados, capítulos, roteiros completos, apostilas, livros, enfim, um monte de coisas que vão orientar sobre qual o formato correto que as grandes emissoras e as produtoras querem. Fazemos, também, um clipping de cinco em cinco dias sobre todo panorama da teledramaturgia e sobre o mercado de cinema. Temos muita discussão, muita gente bacana como roteiristas profissionais entre roteiristas novatos. Também tem bastante gente incógnita: colunistas de TV, escritores e, recentemente, uma grande escritora que pretende retornar ao mercado. Não que ela precisasse estar no grupo, mas resolveu entrar para ver, se atualizar e conhecer gente nova para, de repente, formar uma equipe.
RESENHANDO - Você transita entre literatura e roteiro. O que escolheria se fosse para ficar em uma coisa só?
LEONARDO - Os dois dão tipos diferentes de prazer. Não dá pra você optar entre um ou outro. Na verdade, minha vontade é ser um bom contador de histórias, que possam ser levadas tanto por meio de um livro ou de uma imagem. Acontece que no Brasil é muito difícil se viver de literatura. Na verdade, grandes escritores acabam flertando com a própria escrita de roteiros de cinema ou de telenovela. Agora, se tivesse de optar entre um ou outro sem possibilidade nenhuma, escolheria por ser um escritor de literatura famoso, com vários livros publicados e, de preferência, que pudesse pagar as contas no final do mês.
RESENHANDO - Dá pra levar a qualidade da literatura para a televisão?
LEONARDO - A literatura tem pontos interessantíssimos, que jamais serão transportados para a televisão, como a capacidade de reflexão, introspecção dos personagens... Na verdade, quando você lê um livro, vai criar os quadros por meio de sua própria experiência. E isso jamais será levado para a TV ou para o cinema, porque estes já oferecem a imagem pronta. Não adianta, a literatura nunca vai deixar de ter sua relevância. Na verdade, a literatura é a base de tudo. Qualquer imagem, qualquer coisa que apareça, sempre vai beber na fonte da literatura.
RESENHANDO - Como você avalia, hoje, a teledramaturgia?
LEONARDO - É preciso dar uma refrescada com introdução de autores novos. Os autores estão cada vez mais se repetindo e se autoplagiando, digamos assim. Gilberto Braga sempre escreve aquela elite carioca, com toques de glamour, Glória Perez sempre com seus temas polêmicos e modernos, Benedito Rui Barbosa com ares rurais, Silvio de Abreu retratando a cidade de São Paulo. É preciso de uma safra nova, mas não acho que esteja ruim o que está passando. Se não, não estaria querendo entrar. E que outros canais abram a teledramaturgia pra gente conseguir competir e ter mais emprego pra todo mundo.
RESENHANDO - Já foi dito que a Internet poderia afastar leitores. No entanto, seu livro foi lançado a partir de textos coletados do seu blog...
LEONARDO - Acho que muito pelo contrário. A Internet serve de estímulo a leitura. O jovem nunca escreveu tanto quanto agora. Ainda que seja uma escrita de má qualidade, na linguagem esquisitíssima da Internet, mas está escrevendo mais, tentando criar mais. Você entra em flogs, blogs, sites pessoais e você encontra fotos, textinhos, poemas, isso disseminou de tal forma que está realmente estimula o pessoal a criar e a ler. Se não fosse a Internet, acho que nunca teria tido contato com todos escritores ou conhecido as pessoas que conheci até agora. Minha experiência pessoal com a Internet é ótima, na verdade só me levou cada vez mais rumo à literatura e à criação. Não posso reclamar.
RESENHANDO - Na literatura, quem são seus ídolos?
LEONARDO - Não tenho ídolos, nunca tive. Posso admirar a escrita de um ou outro. Se eu tivesse de citar uma única pessoa, até pode parecer lugar comum, mas seria Machado de Assis. Ele tinha uma clareza e uma sagacidade maravilhosa para retratar o brasileiro do final do século XIX, com uma fina ironia. Outro que admiro demais, seja pelo suspense, pela graça, é o Marcos Rey, mas tem muitos outros.
RESENHANDO - Você acredita que alguém da nova safra de autores pode vir a superar estes imortais?
LEONARDO - Queira Deus que sim, porque apesar do nome negar, os imortais morrem. E a literatura precisa ser renovada e superada, porque não? Não que a palavra superação seja correta, porque cada época tem o seu estilo, e um não supera o outro. Por outro lado, a literatura brasileira não pode morrer e tem que crescer em qualidade. Acredito que sim, tem muita gente boa. Na verdade, quero me esforçar o suficiente não para ser um imortal, mas para pelo menos conseguir eternizar muitas das minhas criações.
RESENHANDO - Hoje, já com livro publicado, você reescreveria algo?
LEONARDO - "Taí" uma coisa que prefiro não pensar. Uma vez escrito, não vou ficar me criticando e entrando em crise com isto. O livro saiu, foi o retrato do amadurecimento intelectual e literário que eu tinha no momento e, se acredito que estou melhor que isso, então que escreva um novo livro.
Por: Helder Moraes Miranda
Em maio de 2006
Leonardo de Moraes fala sobre literatura, roteiros e porque a teledramaturgia precisa se renovar. Conheça o autor de "A Caixa de Confeitos & Contos Sortidos"!
Ele sempre gostou de ler, mas o caminho para chegar à literatura não foi direto. Antes, ele desenhava, talvez o percurso escolhido antes de se aventurar, e sair vencedor, no mundo das letras. Assim pode ser definido nosso entrevistado do mês, Leonardo de Moraes, escritor que estréia com o brilhante "A Caixa de Confeitos & Contos Sortidos", publicado pela editora Manole e composto, em sua maioria, de contos retirados do blog http://ragazzodifamiglia.blogspot.com.
O personagem em questão agrega diversas atividades: é professor universitário, advogado, integrante da assessoria especial do atual Governador de São Paulo, Claudio Lembo, e moderador de uma das maiores listas de discussão sobre roteiros de televisão do Brasil -o GRTV - GRUPO ROTEIROS PARA TELEVISÃO, que atualmente conta com quase 500 membros.
Moraes figura ao lado de outros advogados que rumaram pra o caminho das artes, como a escritora Lygia Fagundes Telles, os atores Paulo Autran e Raul Cortez, além do diretor teatral José Celso Martinez.
Para o Resenhando, o "X" da questão era saber como um advogado poderia desempenhar tão bem o papel de escritor de ficção, e ainda flertar com a arte de escrever roteiro. "A Carreira do Direito te dá uma visão muito ampla da sociedade. Você aprende muito do bom senso, e tem uma visão muito ampla da sociedade. Conclusão: você lê muito, tem de redigir muito, ter um bom português, esforçar sua capacidade de expressão. Se você tem um pouquinho de criatividade, para virar escritor é um pulo", explicou. Saboreie agora a entrevista, como se cada pergunta fosse um confeito sortido, e cada resposta o prazer que a glicose é capaz de proporcionar.
RESENHANDO - O que o livro "Caixa de Confeitos & Contos Sortidos" tem do Leonardo?
LEONARDO DE MORAES - Absolutamente tudo, principalmente pelo senso de humor. Talvez tenha muito mais o Leonardo nos contos sortidos do que na própria "A Caixa de Confeitos", uma história de ação que tem um ritmo vertiginoso. Tudo que está lá tem um pouco meu: referências, lembranças, associações. Não tem como negar: faz parte dos meus pensamentos, do meu imaginário.
RESENHANDO - Você acha que a produção literária é autobiográfica?
LEONARDO DE MORAES - Sim e não. Você não precisa experimentar absolutamente todo tipo de vivência para poder escrever sobre ela. Na verdade, um dos pré-requisitos básicos de você ser escritor é ter capacidade de observação. Por exemplo, no próprio livro, um dos contos, "Sangue Pardo", tem como protagonistas pessoas de meia-idade com senso de humor próprio, brincadeiras da idade. Quer dizer, estou com 28 anos: é mais capacidade de observação do que propriamente vivência, ou autobiografia.
RESENHANDO - Com o lançamento de seu primeiro livro, as pessoas começam a cobrar um romance. O que nos pode adiantar sobre isto?
LEONARDO DE MORAES - Na verdade tenho vários projetos ao mesmo tempo, mas dificilmente toco um só. Não conseguiria fazer isto, porque as idéias vão brotando, independentemente do projeto. Às vezes estou parado e vem alguma coisa que pode agregar a uma história. Tenho um projeto de romance que é uma história de amor que se passa na Roma Antiga, um estilo totalmente diferente, fiz pesquisa, tem muito de mitologia. Já escrevi um terço desse livro, mas ele está meio guardadinho, porque não adianta você tentar iniciar uma carreira literária com algo muito denso, pesado. E tem um outro projeto que é mais ou menos no mesmo estilo de "Caixa de Confeitos", gira em torno de um casal de falsificadores de arte que são envolvidos em uma trama internacional e tem que fazer uma determinada coisa pra conseguir se livrar dessa perseguição, mas vão se enrolar cada vez mais. Já está metade escrito.
RESENHANDO - No conto "Tudo culpa da filosofia" você escreve que depois dos 50 as pessoas deveriam ser proibidas de beijar de língua. Que história é essa?
LEONARDO - Na verdade, quem sempre falou isto foi minha mãe, que está com 63 anos. Ela costuma falar que acha muito feio gente muito mais velha ficar beijando exageradamente, até quando vê telenovela fica tirando sarro, falando: "ai, que absurdo!". Foi uma piada, na verdade o humor normalmente nasce de um preconceito, de uma gracinha.
RESENHANDO - O que de sua personalidade reflete no temperamento das personagens?
LEONARDO - O que é mais claro em minha personalidade é um pouco da ironia, do sarcasmo, das tiradas e da capacidade de rir das coisas mais medíocres. Aliás, todas as pessoas que me conhecem a fundo e lêem o livro falam que dão risada porque parece que sou eu que faço muitos dos comentários.
RESENHANDO - Você tem algum ritual na hora de criar? Como é seu processo criativo?
LEONARDO - Nenhum tipo de ritual. Só dois contos de "Caixa de Confeitos" foram escritos especialmente para o livro, "Sangue Pardo" e "Dona Catarina", os outros foram publicados no blog e foram escritos de forma bem espontânea, na verdade até contrariei muitas das recomendações que se dá a um autor novato, que é planejar a história. "A Caixa de Confeitos" foi escrito de forma bem intuitiva. Comecei o primeiro capítulo sem ter a mínima idéia de como a história iria terminar. E como ela foi escrita ao longo de dois meses e meio no blog, muita gente foi acompanhando, algumas sugestões eu incorporei. Talvez hoje em dia eu já não consiga fazer essa forma intuitiva que, aliás, nem acho recomendável.
RESENHANDO - A experiência de escrever para você é mais transpiração ou inspiração?
LEONARDO - Mais transpiração na medida em que você tem de se predispor. Eu, pelo menos, estabeleci um horário para escrever, que iria publicar em meu blog as segundas, quartas e sextas. Então, todo domingo, terça e quinta à noite lá estava eu escrevendo. E tinha de fazer, publicar. A transpiração está neste sentido da disciplina. A partir do momento que me predispus, que ficava diante da tela em branco, lógico, entra um pouco de inspiração, enfim, das associações livres que a gente faz até conseguir formar uma história interessante.
RESENHANDO - O que faz você querer escrever mais, e o que trava seu processo criativo?
LEONARDO - A crítica sempre pode impulsionar pra frente, ou para trás. A vontade de escrever é a vontade de criar em si, e isto não tem explicação. Criar é uma coisa um tanto quanto inata. Acho que todo mundo tem, em maior ou menor grau. No meu caso, ou eu escrevia, ou ia ficar louco, porque é um numero muito grande de personagens quem vêm na cabeça, em falas, em situações. E uma imaginação muito exagerada tinha de ser "desovada" em algum lugar. Agora, em relação a me frear, só a opinião de algumas pessoas bem próximas talvez tenha força de me paralisar durante alguns instantes.
RESENHANDO - Como você lida com críticas? Quando você postava no blog, qualquer um poderia criticar o que estava escrito. Como é isto?
LEONARDO - Lidar com crítica nunca é bom. Mente quem diz que acha o máximo ser criticado. Na verdade, é gostoso ser criticado só quando você sabe que a pessoa que está critica tem capacidade e uma vivência na frente. Agora, muitas vezes as pessoas criticam por pura e simples inveja. Se você não gosta da crítica invejosa, a pessoa diz: "Ah, não aceita levar críticas", e ainda fala que você é orgulhoso! Quanto ao blog, eu praticamente só recebia críticas positivas. Ninguém entra em um blog, ou vai perder tempo fazendo críticas, se não gostar dele.
RESENHANDO - Você é moderador de uma das maiores listas de discussão sobre roteiros de televisão do Brasil -o GRTV. Qual o objetivo deste grupo?
LEONARDO - Criar uma espécie de porto seguro para o roteirista perdido, náufrago na Internet. Lá a gente consegue reunir muito material de estudo. Também é voltado para aquele que já tem algum conhecimento, e capacidade de ser autodidata. Serve como um intensivo pra entrada no mercado de roteiros. Você encontra sinopses de telenovelas, seriados, capítulos, roteiros completos, apostilas, livros, enfim, um monte de coisas que vão orientar sobre qual o formato correto que as grandes emissoras e as produtoras querem. Fazemos, também, um clipping de cinco em cinco dias sobre todo panorama da teledramaturgia e sobre o mercado de cinema. Temos muita discussão, muita gente bacana como roteiristas profissionais entre roteiristas novatos. Também tem bastante gente incógnita: colunistas de TV, escritores e, recentemente, uma grande escritora que pretende retornar ao mercado. Não que ela precisasse estar no grupo, mas resolveu entrar para ver, se atualizar e conhecer gente nova para, de repente, formar uma equipe.
RESENHANDO - Você transita entre literatura e roteiro. O que escolheria se fosse para ficar em uma coisa só?
LEONARDO - Os dois dão tipos diferentes de prazer. Não dá pra você optar entre um ou outro. Na verdade, minha vontade é ser um bom contador de histórias, que possam ser levadas tanto por meio de um livro ou de uma imagem. Acontece que no Brasil é muito difícil se viver de literatura. Na verdade, grandes escritores acabam flertando com a própria escrita de roteiros de cinema ou de telenovela. Agora, se tivesse de optar entre um ou outro sem possibilidade nenhuma, escolheria por ser um escritor de literatura famoso, com vários livros publicados e, de preferência, que pudesse pagar as contas no final do mês.
RESENHANDO - Dá pra levar a qualidade da literatura para a televisão?
LEONARDO - A literatura tem pontos interessantíssimos, que jamais serão transportados para a televisão, como a capacidade de reflexão, introspecção dos personagens... Na verdade, quando você lê um livro, vai criar os quadros por meio de sua própria experiência. E isso jamais será levado para a TV ou para o cinema, porque estes já oferecem a imagem pronta. Não adianta, a literatura nunca vai deixar de ter sua relevância. Na verdade, a literatura é a base de tudo. Qualquer imagem, qualquer coisa que apareça, sempre vai beber na fonte da literatura.
RESENHANDO - Como você avalia, hoje, a teledramaturgia?
LEONARDO - É preciso dar uma refrescada com introdução de autores novos. Os autores estão cada vez mais se repetindo e se autoplagiando, digamos assim. Gilberto Braga sempre escreve aquela elite carioca, com toques de glamour, Glória Perez sempre com seus temas polêmicos e modernos, Benedito Rui Barbosa com ares rurais, Silvio de Abreu retratando a cidade de São Paulo. É preciso de uma safra nova, mas não acho que esteja ruim o que está passando. Se não, não estaria querendo entrar. E que outros canais abram a teledramaturgia pra gente conseguir competir e ter mais emprego pra todo mundo.
RESENHANDO - Já foi dito que a Internet poderia afastar leitores. No entanto, seu livro foi lançado a partir de textos coletados do seu blog...
LEONARDO - Acho que muito pelo contrário. A Internet serve de estímulo a leitura. O jovem nunca escreveu tanto quanto agora. Ainda que seja uma escrita de má qualidade, na linguagem esquisitíssima da Internet, mas está escrevendo mais, tentando criar mais. Você entra em flogs, blogs, sites pessoais e você encontra fotos, textinhos, poemas, isso disseminou de tal forma que está realmente estimula o pessoal a criar e a ler. Se não fosse a Internet, acho que nunca teria tido contato com todos escritores ou conhecido as pessoas que conheci até agora. Minha experiência pessoal com a Internet é ótima, na verdade só me levou cada vez mais rumo à literatura e à criação. Não posso reclamar.
RESENHANDO - Na literatura, quem são seus ídolos?
LEONARDO - Não tenho ídolos, nunca tive. Posso admirar a escrita de um ou outro. Se eu tivesse de citar uma única pessoa, até pode parecer lugar comum, mas seria Machado de Assis. Ele tinha uma clareza e uma sagacidade maravilhosa para retratar o brasileiro do final do século XIX, com uma fina ironia. Outro que admiro demais, seja pelo suspense, pela graça, é o Marcos Rey, mas tem muitos outros.
RESENHANDO - Você acredita que alguém da nova safra de autores pode vir a superar estes imortais?
LEONARDO - Queira Deus que sim, porque apesar do nome negar, os imortais morrem. E a literatura precisa ser renovada e superada, porque não? Não que a palavra superação seja correta, porque cada época tem o seu estilo, e um não supera o outro. Por outro lado, a literatura brasileira não pode morrer e tem que crescer em qualidade. Acredito que sim, tem muita gente boa. Na verdade, quero me esforçar o suficiente não para ser um imortal, mas para pelo menos conseguir eternizar muitas das minhas criações.
RESENHANDO - Hoje, já com livro publicado, você reescreveria algo?
LEONARDO - "Taí" uma coisa que prefiro não pensar. Uma vez escrito, não vou ficar me criticando e entrando em crise com isto. O livro saiu, foi o retrato do amadurecimento intelectual e literário que eu tinha no momento e, se acredito que estou melhor que isso, então que escreva um novo livro.
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