quinta-feira, 2 de março de 2006

.: Entrevista com Bruna Angrisani, jornalista

"Se algo mudou, eu diria que foram meus valores". – Bruna Angrisani

Por: Helder Moraes Miranda, com colaboração de Rômulo Roberto Pereira e Andréa Cobra

Em março de 2006



Vegetariana Cosmopolita: Bruna Angrisani, ex-participante do Projeto Piloto na MTV, fala que nem tudo que é assistido nos reallity shows corresponde à realidade. Confira o imperdível depoimento sobre seu trajeto no caminho de Santiago


Ela tem 24 anos, mas suas experiências a fazem se destacar das outras pessoas. Tanto que foi escolhida entre dez mil pessoas para participar de um programa que a tornou famosa. No mês do Dia Internacional da Mulher, a personalidade em questão é uma moça linda, de fala doce e olhos expressivos, que complementam suas idéias e poderia ser representada pela música You´re Beautiful, de James Blunt. 

Trata-se de Bruna Angrisani, conhecida nacionalmente por sua participação no programa Projeto Piloto, exibido em 2005 pela MTV. Na verdade, do convite até a concretização da entrevista –por falta de tempo dos entrevistadores e da entrevistada–, foi um longo namoro, e Bruna falou, em dois momentos extremamente oportunos: a consolidação dos reallity shows –embora com fórmula desgastada, a sexta edição do programa Big Brother Brasil rende à Globo picos acima de 40 pontos, pouco menos que a edição passada. 

E pelo fato de que o filme favorito ao Oscar –O segredo de Brokeback Mountain– que liderava a corrida com oito indicações ao Oscar, ter terminado a disputa com apenas três prêmios, além de inclusive perder a principal premiação para Crash – No Limite. Ambos os filmes tratam de preconceito, mas enquanto Crash focava em questões sociais e raciais –algo considerado mais digerível pela academia?–, o foco central de Brokeback Mountain é a homossexualidade de dois homens. 

O crítico do Los Angeles Times, Kenneth Turan, viu no pequeno número de estatuetas para Brokeback Mountain como uma prova de que Hollywood não está pronta para aceitar o tema do amor homossexual. Na entrevista exclusiva, Bruna fala sobre a vida transformada em show, sua homossexualidade, o percurso no Caminho de Santiago e porque se tornou vegetariana. Acompanhe, agora, um dos melhores RG já publicados no Resenhando.com.

          



RESENHANDO -  Tudo que é mostrado em um reallity show é verdade? Há distorções? Quais?
BRUNA ANGRISANI - Se considerarmos que um reallity show é gravado em período integral e que os telespectadores assistem apenas de 30 minutos a 1h do material gravado em um dia inteiro, podemos concluir que este material foi editado certo? Se a partir disso, analisarmos que o diretor e o editor de imagens são seres humanos e que cada um possui seus valores, inclinações, são seres parciais por natureza e que além de tudo isso a emissora precisa cumprir os compromissos com os patrocinadores, ou seja, garantir a audiência do programa, não nos restaria a menor dúvida quanto às distorções. Entre as diversas que eu pude presenciar estão desde o incentivo a certo tipo de comportamento e críticas, até a eliminação de imagens que pudessem comprometer a popularidade de determinados participantes. Episódios que certamente ocorrem em qualquer reallity show.


RESENHANDO - Você está entre um grupo restrito de pessoas que teve a experiência de participar de um reallity show, em uma emissora de grande porte no Brasil. O que isto acrescentou a você, e o que mudou em sua vida?
BRUNA ANGRISANI - Ah, para falar a verdade não mudou muita coisa não, ainda bem. Acrescentei esta experiência em meu Curriculum, foi uma oportunidade inefável e enriquecedora que me proporcionou aperfeiçoamento profissional, contatos e momentos surreais. Até hoje as pessoas associam minha imagem ao Projeto Piloto. Já tive até que dar autógrafo e posar para fotos, rsrs. No entanto, o motivo que me fez estar ali foi a oportunidade de trabalhar naquela emissora e eu estava focada nisso. Se algo mudou, eu diria que foram meus valores. O glamour que envolve o trabalho numa emissora de televisão de grande porte não tem valor maior para mim do que as coisas simples e menos ainda, do que o convívio com as pessoas que eu amo e que me amam de verdade.


RESENHANDO - Ser escolhida entre dez mil pessoas a torna especial. Em sua opinião, o que a diferencia da maioria?
BRUNA ANGRISANI - Nada.


RESENHANDO -  Durante o andamento do programa, era comum ler críticas de que os participantes do reallity show desperdiçaram a oportunidade. Você acha que o espaço dado realmente não foi aproveitado com programas inovadores? 
BRUNA ANGRISANI - Primeiramente a palavra “aproveitamento” é conceitual, ou seja, cada indivíduo tinha o direito de achar determinado programa mais ou menos proveitoso...Tanto eu, como o próprio Cazé, o diretor e os telespectadores, todos temos as nossas preferências. Agora na minha opinião, houve programas bem bobinhos e superficiais como também acho que fizeram programas bem criativos e críticos. Acho que o mais interessante disso tudo foi a diversidade de idéias.


RESENHANDO - Os competidores tinham a total liberdade de criar novos programas ou teve algum parâmetro, imposto pela emissora?
BRUNA ANGRISANI -  Todos tínhamos total liberdade desde que a idéia central passasse pela aprovação dos diretores. Não houve parâmetro, mas tudo tinha que ser realizado praticamente sem nenhuma verba, o que foi um desafio.


RESENHANDO -  "Projeto Piloto" serviu como escola, ou foi apenas mais um reallity show?
BRUNA ANGRISANI -  Como eu já disse anteriormente eu estava ali focada no emprego que eu poderia ganhar da MTV. Inclusive eu entrei meio por acaso porque fui chamada por meio de uma inscrição que eu fiz no site da emissora, cujo anúncio era: “Você quer trabalhar na MTV? Mande o seu Curriculum aqui”. Quando me ligaram para fazer a primeira entrevista, eu estava certa de que era para um emprego e só fui avisada quando o teste terminou. Hesitei um pouco por não gostar muito de reallity shows, mas não dei muita importância porque achei que não fossem me chamar para o segundo teste. Foi quando me chamaram novamente que eu percebi que deveria me posicionar. A partir daí decidi encarar o Projeto Piloto como uma seletiva de emprego. Eu estava desempregada e não tinha nada a perder.
Valeu a pena, não me arrependo. Aprendi coisas bem interessantes sobre bastidores, rotina televisiva e conheci pessoas ótimas na emissora.


RESENHANDO -  Em algum momento, você se sentiu perseguida no programa?
BRUNA ANGRISANI -  Não.


RESENHANDO -  Acha que a vencedora do programa, que havia sido eliminada pouco antes da final, mereceu ganhar a disputa? Para você, foi um critério justo a repescagem?
BRUNA ANGRISANI - Acho que não. A repescagem seria justa se a Carol Romano fosse a vencedora.


RESENHANDO - Como foi lidar com ego de alguns participantes? Em um reallity show, é necessário ter mais jogo de cintura do que na vida real?
BRUNA ANGRISANI - Hummm, isso foi complicado, rsrs. Foi interessante para analisar até onde as pessoas chegam em nome da fama. Era muito bizarro perceber como algumas pessoas eram sinceras e uma ou outra até mudava o tom de voz ou a postura diante da câmera para obter mais destaque. Com certeza tem que ter mais jogo de cintura porque ali você não sabe se está lidando com uma pessoa ou com um personagem. Era importante ter esta sensibilidade.


RESENHANDO -  Na época do programa, seu Orkut foi bombardeado de pessoas que a agrediam verbalmente, o que fez com que você se auto-deletasse. O que acha disto? E qual sua opinião sobre a superexposição que o Orkut traz para as pessoas atualmente?
BRUNA ANGRISANI - Eu não saí do Orkut apenas por isso, até porque assim como algumas pessoas entravam para ofender, muitas deixavam mensagens de carinho e apoio também. O que ocorreu foi que eu já estava um pouco em crise com o Orkut por toda esta vulnerabilidade que ele traz para as pessoas e porque naquele momento especial que eu estava vivendo eu queria compartilhar com os amigos e pessoas queridas. E naquele período, quem transitava no meu Orkut e pedia autorização para eu adicionar eram pessoas que eu não conhecia e que estavam ali em busca da Bruna do Projeto Piloto. Para mim perdeu todo o sentido e até pensei em não usá-lo mais. Só mudei de idéia porque senti falta de estar em contato com os amigos distantes e tive que admitir que ele tem lá suas utilidades, rsrs .


RESENHANDO -  Como é o bastidor da MTV, emissora em que nove entre dez adolescentes querem trabalhar? O que é idealização, e o que é verdade?
BRUNA ANGRISANI -  É bem bacana, pessoas interessantes, informalidade, embora seja muito bem organizada. Imagine uma emissora de televisão normal, só que com muito colorido, cabelos modernos, tênis e camiseta.


RESENHANDO - Como foi a experiência do intercâmbio que você fez na Europa? 
BRUNA ANGRISANI - Foi demais, muito enriquecedor...um choque de informações, cultura e emoções que provocou uma revolução dentro de mim. Identifiquei-me demais com as pessoas e fiz amigos para a vida inteira, principalmente os que não eram espanhóis, ou seja, alemães, italianos, franceses, tchecos, eslovacos e etc. Morei um ano e dois meses em Santiago de Compostela, uma cidade universitária e turística que recebe estudantes de intercâmbio todos os anos e tem muito entretenimento e diversão para este tipo de público. A Espanha, sobretudo é um país muito charmoso e um dos maiores centros culturais da Europa. É muita história para contar... foi incrível!


RESENHANDO -  Que descobertas pessoais você fez no Caminho de Santiago? Como foi o percurso, e o que pensava enquanto percorria o caminho?
BRUNA ANGRISANI - Eu resolvi fazer o caminho de Santiago duas semanas antes de voltar ao Brasil porque não queria ir embora sem fazê-lo. Só que como a universidade estava em período de férias, foi difícil encontrar companhia porque meus melhores amigos já haviam retornado a seus respectivos países. No dia 25 de setembro de 2004 eu partia da residência universitária com meu cajado na mão, mochila nas costas, minha câmera de fotos e um pouco de frio na barriga, rsrs. Fiz o caminho mais curto, com duração de três dias e meio, via Santiago – Finisterre, onde na antiguidade acreditou-se que era ali o fim do mundo (na época em que pensavam que a terra era quadrada). Vi coisas que nunca vi na vida por sempre ter vivido na urbanidade. Pés de amora, pêra, maçã, castanhas, uva, pêssego, além de umas senhoras muito típicas da Galícia cuidando do gado, espantalhos nas plantações de milho, flores e paisagens que me faziam crer que estava dentro de algum conto ou filme. Tive tempo de sobra para refletir a respeito daquele momento, dos frutos que colhi com a minha experiência na Espanha e sobre meu retorno ao Brasil. Na chegada a sensação era de liberdade, purificação e eternidade. Foi o fechamento de um ciclo importantíssimo.


RESENHANDO - Você foge do esteriótipo de que a maciça maioria das pessoas ainda imagina uma mulher homossexual: é feminina, delicada, sutil. No entanto, sem precisar, preferiu assumir sua homossexualidade. Por que esta decisão?
BRUNA ANGRISANI - Uau, obrigada pelos elogios...rsrs. Na verdade esta minha decisão partiu de dentro para fora. Eu tive que assumir primeiro para mim e aceitar a minha orientação sexual, para, depois de muito me informar, entender que isso é a coisa mais normal do mundo e que não passa de uma característica genética de cada pessoa como a cor da pele ou a estatura. Isso já é praticamente comprovado, é o que mostram pesquisas científicas bastante objetivas, quem tiver interesse pode pesquisar. Eu digo “orientação sexual” porque ninguém “opta” por ser gay, simplesmente porque a vida de um heterossexual é muito mais fácil, seria burrice. Sobretudo aqui no Brasil, que apesar da população gay ser bem elevada, o preconceito e o desrespeito contra os homossexuais é brutal. A partir desta primeira etapa eu não tive que tomar decisão nenhuma, só passei a viver normalmente, contar a verdade aos amigos e família porque cheguei tarde no final de semana, andar de mãos dadas na rua, entre outras coisas que a sociedade só permite aos heterossexuais.


RESENHANDO - Você já chegou a ficar com rapazes. Isto lhe incomodava, ou considera algo normal?
BRUNA ANGRISANI -  Foi um período de transição e auto-conhecimento. Não me incomodava, mas não era o que eu queria para mim. Na época eu não tinha isso muito claro.


RESENHANDO - Como descobriu-se homossexual? O que diria para quem está lendo e sofre com os mesmos questionamentos que teve de passar?
BRUNA ANGRISANI - A vida trata de descobrir isso por você, é só prestar atenção nos sinais. Tem gente que escolhe viver amargurado, com duas vidas, uma real e outra fictícia, aquela que se conta para a família e amigos, sabe? Outras pessoas optam por ser feliz e respeitar suas próprias vontades e decisões. A decisão de aceitar a orientação e de como lidar com ela é muito particular. A informação afaga e acolhe. Neste caso, ela é fundamental para desatar alguns nós e garantir a auto-estima e o bem-estar do indivíduo que ainda está se descobrindo.


RESENHANDO - Em relação a carreira de jornalista, você prefere TV ou veículos impressos? Por que? Quais os próximos passos?
BRUNA ANGRISANI - Em ordem de preferência, a TV, o online e a assessoria de imprensa, por pura identificação mesmo. Mas do jeito que a coisa anda hoje em dia não dá muito para escolher, né? No momento eu escrevo para o site da empresa Red Bull. Vamos ver o que vem por aí.


RESENHANDO -  Por que se tornou vegetariana? Em que comer carne pode nos prejudicar? 
BRUNA ANGRISANI - Quando criança eu fiz uma viagem com a minha mãe à um sítio em Peruíbe e, por acaso, acabei presenciando o sacrifício de um porco. Foi horrível, ele gritava...e aquela imagem ficou na minha cabeça. A partir daquele momento eu questionei o motivo de um animal ter que morrer para eu me alimentar e há muito tinha vontade de parar de comer carne, mas acreditava naquele mito de que vegetariano só come salada, tem anemia ou que é carente de proteína e etc. No entanto, sempre busquei me informar sobre o assunto, mas só consegui me tornar uma mesmo quando fui trabalhar nas gravações de um filme espanhol e conheci de perto o bandejão gorduroso que a equipe era obrigada a comer todos os dias. Um espanhol, amigo e colega de equipe, era vegetariano e cozinhava só para ele nas gravações. Conversávamos muito sobre o assunto e neste período ele acabou me convidando para comer com ele e me ensinou algumas receitas. Bom, rsrs....isso ocorreu há 1 ano e 6 meses e hoje eu nem consigo sentir o cheiro de nenhum tipo de carne. A questão da saúde para mim foi apenas um entre os vários motivos que me levaram a ser vegetariana. Evitar carne é um dos melhores e mais simples caminhos para evitar um ataque cardíaco ou desenvolver câncer. Existem os motivos morais e éticos também, para saber mais entrem neste link: http://www.vegetarianismo.com.br/
artigos/21motivos.html. Quer mais motivos? A comida é saborosíssima, tem um aroma delicioso e é extremamente saudável.


RESENHANDO - Você tem planos de criar uma ONG sobre o assunto. Pode nos adiantar detalhes?
BRUNA ANGRISANI - A ONG é um projeto futuro, idealizado por mim e pela minha namorada que é veterinária. Nós já temos uma empresa de alimentos vegetarianos que visa promover o vegetarianismo e consequentemente o bem estar animal http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=7888551 (grano no orkut). Mais tarde pretendemos participar mais ativamente desta causa, não somente por meio da alimentação, mas de outros serviços como castrações, palestras educativas e etc.
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