quarta-feira, 1 de dezembro de 2004

.: Entrevista com Regina Drummond, escritora

"O mundo dos livros é um mundo mágico" - Regina Drummond


Por: Mary Ellen Farias dos Santos

Em dezembro de 2004


Uma escritora de livros infantis: Regina Drummond conta que dedicou os seus vinte e poucos anos aos livros. Saiba mais sobre o trabalho literário realizado pela sobrinha do escritor Carlos Drummond de Andrade.



RESENHANDO - Para você, como escritora, qual a importância do incentivo à leitura para o público infantil?
REGINA DRUMMOND - É tão grande que eu preciso de muito espaço para explicar! Para mim, pessoalmente, significa, em primeiro lugar, que a minha mensagem vai chegar ao seu destino, que são as crianças. Mais crianças. Quanto mais, melhor. E ainda será pouco, não importa quantas forem, porque precisamos atingir todas. E não me refiro a nenhuma mensagem careta. Eu gosto de mensagens de amor, de alegria, de garra. Sou muito positiva e passo isso em todas as minhas histórias.


RESENHANDO - Dê exemplos.
REGINA DRUMMOND - Coisas do tipo: "Vá buscar o que é seu." ou "Lute pelos seus sonhos". Quer coisa melhor do que isso? Minha mensagem é de alegria e diversão - sim, livro é um lazer fantástico! É impossível ficar triste, se o livro que você está lendo lhe alegra e faz companhia. Logo, não existe solidão para quem gosta de ler. E muito menos problemas sem solução, que podem levar até à depressão: os livros apresentam mil soluções embutidas na maneira como os personagens resolvem seus problemas. Ler é mesmo mágico. e eu adoro mostrar o caminho da leitura às pessoas, porque eu amo ler!


RESENHANDO - Como essa relação acontece?
REGINA DRUMMOND - Todos os meus vinte e poucos anos, dediquei aos livros. E olha que já fiz vinte e poucos anos duas vezes! O estímulo à leitura sempre foi o meu trabalho e eu nunca trabalhei com outra coisa que não envolvesse livros em toda a minha vida. Dou cursos e palestras para professores, mães e pais, converso com alunos, viajo pelo Brasil todo e até pelo mundo afora (não posso dizer "inteiro", mas é bastante!)levando o meu recado "Leiam bastante, ler é maravilhoso" - imagine como me sinto quando resolvem me dar razão, valorizar o meu trabalho, dizer que é mesmo certo tudo o que faço?! É uma delícia! E tem mais: eu vivo disso. Não exatamente da venda dos meus livros - isso é para as grandes estrelas e eu ainda não vendo tanto livro assim. Mas eu vivo dos meus livros e das minhas palestras. Passo o dia todo escrevendo, estudando, preparando cursos e palestras, lendo. Mais leitores também significa mais dinheirinho para mim, né? Enfim, resumindo, é uma alegria, uma realização e mais portas que se abrem.


RESENHANDO - Como é viver 'no meio' de livros, principalmente para uma autora de livros infantis, contadora de histórias e tradutora?
REGINA DRUMMOND - O mundo dos livros é um mundo mágico. Como eu não faço outra coisa na minha vida, nem nunca fiz, além de ler, escrever, divulgar, publicar, vender, bolar projetos, e todos voltados para o livro e a leitura, digo que moro no meio dos livros. Tenho também um tendência a me relacionar com os meus personagens como se eles fossem gente. Tudo isso é tão bom, que é até perigoso: não posso deixar que essa alegria de fazer o que eu gosto ofusque certas realidades como a fome, a violência, as necessidades dos outros etc. Nem mesmo ficar trabalhando sem parar (às vezes, estou tão envolvida que junto a noite com o dia, não quero parar no final de semana etc...), porque eu fico estressada - claro, sou gente! Então, peço sempre ao meu marido: "Quando eu estiver exagerando, por favor, me traga de volta para a vida real."


RESENHANDO - Dentre as suas publicações, há alguma que tenha um carinho especial por ela? Qual?
REGINA DRUMMOND - Amo todos os meus livros como se fossem meus filhos, mas é claro que tenho lá as minhas preferências quanto aos personagens. Por exemplo, "O Passarinho Rafa" é um livro mais antigo, foi meu primeiro sucesso, vende bem até hoje, e me deu tantas alegrias que você nem imagina. Outra personagem que eu gosto demais é a Isabela, do livro "A Mulher do meu pai". Eu imaginei a filha do meu marido (do primeiro casamento dele) escrevendo um diário para falar mal de mim - e me diverti demais com as situações que criei! Porque é claro que eu sou uma santa, né? Depois, a Isabela acaba se entendendo com a madrasta, porque ela entende que a mulher do pai dela não lhe queria mal, apenas era diferente, porque veio de uma outra cultura; e que elas podiam ser boas amigas.


RESENHANDO - Conte como surgiu a idéia de falar sobre o passarinho Rafa que tanto agrada às crianças.
REGINA DRUMMOND - Todas as minhas histórias têm o pé na realidade e aconteceram de alguma forma ou poderiam ter acontecido, nem que seja só na minha cabeça... O Rafa eu escrevi quando meus filhos eram bem pequenos e foi inspirada num passarinho que o meu (primeiro) marido, pai deles, comprou para o Diego. Eu era supercontra passarinho na gaiola, então, para eu não brigar muito, eles compraram uma gaiola enorme. Só que gaiola grande, é para pássaro grande - e o passarinho, pequeno e delicado, fugiu pela grade mesmo...

Diego chorou muito, ficou triste, e ainda estava com os olhos cheios de lágrimas, quando eu vi o passarinho pousado no galho de uma árvore, no nosso quintal. Ele ficou por ali ainda alguns dias, o suficiente para ele entender que lugar de passarinho é solto no céu.


RESENHANDO - Na hora da leitura, qual o seu estilo preferido?
REGINA DRUMMOND - Depende do dia, da hora, do humor e do tempo que disponho. Gosto de tudo que seja bem feito e interessante. Atualmente, ando lendo muita literatura sul-americana e brasileira. Neste momento estou apaixonada pela Leticia Wierzchowski e leio "Um Farol no Pampa", mas estou sempre relendo os clássicos da literatura universal. Tenho paixão especial pela literatura francesa.



RESENHANDO - Como é ser uma escritora da Minas Gerais, de nomes importantes, como Fernando Sabino, Roberto Drummond, Carlos Drummond de Andrade, entre outros?
REGINA DRUMMOND - Vejo isso como um privilégio. Um presente dos anjos. Mas tem de ser só para curtir, sem colocar nada disso no ego. Porque eu não fiz nada para merecer o presente, apenas ganhei-o. E é assim que devo usá-lo e curti-lo: com amor, com gratidão, mas sem arrogância.


RESENHANDO - Quais são os seus projetos desenvolvidos para o incentivo à leitura?
REGINA DRUMMOND - Cursos, palestras, conversas e principalmente narração de histórias. Acho que contar histórias é a coisa mais gostosa na vida de uma criança. Quem ouve histórias quando pequeno vai gostar dos livros para sempre. Por isso, dou curso ensinando as professoras e interessados em geral a contar histórias. Fiz projetos inovadores para feiras e bienais, que hoje são largamente copiados no Brasil inteiro. Mas todo mundo sabe que eu fui a primeira. E estou sempre criando coisas novas para os eventos. Agora mesmo acabei de inventar uma coisa tão sensacional que não posso nem contar, mas adianto que vai ser para a Feira Infantil do Livro Infantil, Juvenil e de Quadrinhos de São Paulo, no ano que vem.


RESENHANDO - Fale um pouco sobre eles.
REGINA DRUMMOND - No início dos anos 80, eu morava em Porto Alegre. Lá acontece todo ano uma feira de livros na praça que é muito famosa, este ano fez 50 anos. Pois, naquela época, eu propus à Câmara Riograndense do Livro um projeto de fazer um palco e apresentar coisas ligadas aos livros para divertir as crianças: entrevistas com autores, narração de histórias, brincadeiras com as palavras e shows com personagens dos livros. Foi um sucesso e eu fiz isso durante alguns anos. Depois, mudei-me para SP e fiz a mesma coisa na Bienal do Livro - comecei em 90. A partir daí, todo mundo começou a copiar e tem sempre algo parecido em todas as feiras e bienais de
livro do Brasil inteiro. Os outros projetos são municipais, estaduais e federais, por exemplo, "Gosto de Ler", "O Escritor na Cidade", "O Contador de Histórias", "Todos os Cantos", "Ônibus-biblioteca", "O Escritor na biblioteca", "Proler"; alguns são patrocinados por empresas como Nestlé e Petrobrás. Sempre para falar de livro, literatura, leitura.


RESENHANDO - Como é coordenar o “Espaço Cultural Carlos Drummond de Andrade”?
REGINA DRUMMOND - Este projeto ainda está meio emperrado, mas um dia eu chego lá. Acontece que não tenho muito tempo... Foi uma idéia que umas amigas minhas, brasileiras que moram aqui em Munique, tiveram: elas queriam ter livros novos para ler, em português, e também queriam que seus filhos tivessem mais contato com a língua brasileira. Então, comecei a montar com elas um espaço cultural, mas ninguém tem tempo e eu acabei sozinha no projeto. Nosso maior problema era "onde" ficar, de modo a abranger todo mundo, quer dizer, boa localização, fácil acesso, etc. Eu também queria que o lugar fosse bacana e tivesse sempre alguém para receber as pessoas - coisa cara e complicada, nem preciso dizer! Mas acabei conseguindo envolver o cônsul no meu projeto e o Espaço Cultural mudou-se para dentro do Consulado Geral do Brasil! Não é o máximo? Fiquei muito contente...
Ainda não está como eu pretendo que fique, mas eu chego lá!


RESENHANDO - Qual o momento mais marcante na sua carreira de escritora?
REGINA DRUMMOND - São tantos, que não sei responder. Cada livro publicado é uma vitória, eu celebro cada contrato assinado... Neste momento, estou comemorando duas grandes alegrias: consegui um agente literário para me ajudar a colocar meus livros em outros países. E estou grávida do meu primeiro livro em alemão.
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