sábado, 7 de agosto de 2004

.: Artigo: Receita para fazer novela, por Eduardo Caetano

Por: Eduardo Caetano
Em agosto de 2004


Para quem não sabe, existem alguns ingredientes essenciais para se fazer uma boa novela. É verdade. Toda novela necessita basicamente de um casal apaixonado (a mocinha e o herói), um (a) grande vilão (ã) e um final feliz. Junte neste caldeirão meses a fio de aventuras e suspense que desencadeiam em emoções fortes a cada capítulo. É muito importante que a novela resgate ainda a importância da família. Novela que se preze precisa de uma grande família unida. Tempere todos os ingredientes com humor. Cassiano Gabus Mendes dizia que para garantir o sucesso era necessário misturar humor no folhetim.

Era assim, e somente assim, que se fazia novela quando o gênero começava a se desenvolver e conquistar os corações do povo brasileiro. Foram esses os elementos utilizados por Janeth Clair em Irmãos Coragem (1970) e é esta mesma simplicidade utilizada por João Emanuel Carneiro em Da Cor do Pecado, que está chegando a sua reta final mantendo os melhores índices de audiência nos últimos dez anos. Desde Quatro por Quatro (1994) que uma novela das sete não cai tão bem no paladar do público.


O diferencial de Da Cor do Pecado é que, além da protagonista negra, a trama do jovem autor não inventa um novo estilo como de autores experientes (Carlos Lombardi, Antonio Calmon, Sílvio de Abreu e tantos outros). Pelo contrário, utiliza uma receita velha para nos conquistar. Nada que tenha a cara do costumeiro corre-corre da novela das sete. A história nos humanizou com a relação avô e neto, nos diverte com a família Sardinha, mexe com nossos nervos quando com as maldades de Tony e Bárbara e nos faz torcer pelo final feliz de Paco e Preta. Da Cor do Pecado é o arroz com feijão bem feitinho que não conseguimos dispensar.

Mas, apesar de gostarmos de arroz com feijão, também não dispensamos pratos mais apurados com outros ingredientes. Comecemos pelo final. O final tem que ser feliz. Final triste só é aceito no cinema. Pegue clássicos como ...E o vento levou e Casa Blanca ou contemporâneos como Ghost, Forrest Gump ou Titanic. Sem contar os sensacionais e tristes finais do cinema nacional como em Orfeu e Central do Brasil.

Outro elemento presente nos folhetins é a saga das heroínas. As mulheres deixaram de ser frágeis para se tornarem guerreiras. A última transição do horário nobre da Globo trocou a saga de duas Marias: Clara Diniz (Celebridade) e do Carmo (Senhora do Destino), ambas perseguidas por terríveis vilãs louras: Laura e Nazaré.

Sem contar a migração feita pelos protagonistas. Eugênio Bucci, jornalista e crítico de TV, destaca que em tramas urbanas os heróis vêm do interior ou do sertão para enfrentar a insensibilidade da selva de pedra, como Preta em Da Cor do Pecado ou Maria do Carmo em Senhora.... Já em novelas rurais eles voltam da cidade para o campo com novos conceitos, visando mudar o falso moralismo conservador que domina e explora o lugarejo. Veja exemplos como Roque Santeiro (1985), Tieta (1989), Fera Ferida (1993) e A Indomada (1997).

Há exemplos ainda de histórias totalmente urbanas em que as heroínas vieram do subúrbio para a alta sociedade, como Maria Clara Diniz e Fernando que saíram do Andaraí, ou Maria do Carmo de Rainha da Sucata (1990), que saiu das latarias para a paulicéia quatrocentona e decadente. Mas toda regra tem exceção e Manoel Carlos é uma delas. Suas Helenas não migraram de lugar nenhum. Embora sejam batalhadoras e bem-sucedidas, elas parecem ter nascido e se criado no Leblon.

Há também o universo dos vilões (repleto de ricos ou alpinistas sociais), que disputam dinheiro e poder. Já o herói ou heroína não tem o dever de ser pobre ou rico. O importante é que tenha vencido com seu próprio trabalho e mantenha vínculos afetivos com o núcleo dos pobres bem-humorados e gente boa. Aliás, são com esses núcleos que grande parte do público se identifica. Lembram-se do Andaraí de Celebridade (2003), o Pari de Torre de Babel (1998), o sítio do Petruchio em O Cravo e a Rosa (2000), a Ilha do Governador em Quatro por Quatro (1994), a Vila Havana em As Filhas da Mãe (2001), a Mooca de A Próxima Vítima (1995), São Cristóvão em O Clone (2001), o Maranhão em Da Cor do Pecado e a Vila São Miguel em Senhora do Destino?


Ah, sem contar os segredos. São os mistérios que dão aquele sabor apimentado nos grandes folhetins. E os mistérios se apresentam nas mais diversas facetas, seja a identidade do (a) assassino (a), a paternidade ou maternidade de alguém, uma carta reveladora que provoca uma reviravolta na trama ou, até, quem são os próximos que serão assassinados. A Próxima Vítima parou o país porque mudou o foco do suspense. 

E, para finalizar, o (a) protagonista precisa ter um vínculo forte que justifique, facilite ou complique sua ação na trama. Em Celebridade o que prendia Fernando à Beatriz era o filho Inácio, o que justamente dificultava seu relacionamento com Maria Clara. E o que separou da Musa do Verão foi o fato dela ter negado que ele era o pai de Nina. No final da trama, os vínculos foram trocados. Fernando não tinha um filho com Beatriz, mas sim com Maria Clara, o que o enlaçou novamente à produtora musical. Na atual novela das oito essa questão do vínculo também será explorada, já que Lindalva/Isabel na verdade é filha da heroína Maria do Carmo e não da vilã Nazaré.

O mesmo acontece em Da Cor do Pecado. Afonso não era verdadeiramente avô de Otávio, mas sim de Raí. Dessa forma, o vínculo de Paco com Bárbara cai por terra. O verdadeiro é o dele com Preta, mãe de seu filho e verdadeiro amor de sua vida. É, além de tudo, a novela das sete vai nos permitir saborear um tradicional final feliz.

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